sábado, 11 de abril de 2020

DOS EFEITOS COLATERAIS

Desde a terceira semana de Março tenho vindo a alertar para o excesso de mortalidade em Portugal desde que a covid-19 começou a atacar. E nos últimos dias confirma-se uma terrível tendência: se os números oficiais sobre as mortes da covid-19 estão correctos, então o vírus é mesmo "inteligente", pois: 1) consegue matar pela própria doença que causa; 2) consegue matar indirectamente pelo pânico que lançou, que fez com que as pessoas recusem uma ida às urgências em caso de doença súbita; 3) consegue matar pela descoordenação dos hospitais, que não conseguem organizar-se para acudir ao excepcional e ao normal; e 4) consegue matar pela obsessão dos políticos que acham que apenas interessa evitar mortes por covid-19, pouco lhes importando se as pessoas morrem de outras doenças.
Felizmente, têm surgido diversos alertas, mesmo de médicos, sobre esta situação, e espero que não tenhamos que lamentar, no futuro, mais mortes por não-covid (evitáveis) do que por covid. Nesse aspecto, até agora olho com bastante preocupação para este problema, razão pela qual observo mais a mortalidade total do que a causada por covid-19.
Conforme podem observar no gráfico de hoje (e tenho procurado sempre fazer análises distintas), apresento a evolução da mortalidade desde Março até ao dia 9 de Abril. Como tenho referido, Março deste ano iniciou-se com uma mortalidade muito mais baixa do que a média dos últimos 10 anos, mas a partir da segunda semana encetou uma subida que indicia que a covid-19 começou a matar alguns dias antes da primeira morte oficial (15 de Março, divulgada no dia anterior).
Assumindo que a a base expectável de mortalidade a partir de Março deste ano exclui a covid-19 e é aquela que foi registada, se inferior à média dos últimos 10 anos, ou igual à média dos últimos 10 anos, se superior, o gráfico destaca assim sobretudo o acréscimo em cada dia que se tem vindo a observar, separando a covid-19.
Torna-se, portanto, particularmente notório que o excedente de mortalidade tem sido bastante elevado desde a terceira semana de Março, totalizando já 972 óbitos acima da média no período entre 24 de Março e 9 de Abril, i.e., um acréscimo médio de 57 óbitos por dia. Deste acréscimo, e no período em causa, a covid-19 "explica" apenas 41% das mortes. Ou seja, os efeitos colaterais representam já 59% do acréscimo de mortes, o que para o período em causa representa 549 óbitos. Atente-se que este valor deverá ser ainda superior, tendo em conta que estava a ser expectável que, sem covid-19, a mortalidade em Março e Abril seria mais baixa do que a média.
Em conclusão: o país, e o seu Serviço Nacional de Saúde, não tem apenas uma "guerra" a ganhar: a covid-19. Temos outra "frente de batalha", que são as outras doenças. E nessa outra "frente", claramente o SNS está a perder. E não tem desculpa.
Fonte dos dados: SICO - VIgilância da Mortalidade (DGS)

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