Há quem alegue que o impacte da covid-19 não se pode comparar com a gripe, e eu concordo. Efectivamente, jamais se pode fazer uma discussão contrafactual, na medida que o SARS-CoV-2 nunca teve a "liberdade" dos vírus da gripe.
Mas se não se pode saber jamais o que teria sucedido sem confinamento, sabe-se, porém, o que faz o vírus influenza e seus "comparsas", que matam a eito, forte e feio, sem que as autoridades de saúde percam tempo a fazer viseiras com o nome do ministro na testa.
Numa muito breve análise, fui ver como evoluiu a mortalidade no surto gripal de 2016-2017 - que decorreu de Outubro de 2016 (S1) até Abril de 2017 (S20) - registada nas cidades de Lisboa e e do Porto, que como se sabe tem uma população muito envelhecida. O período em análise corresponde ao período de vigilância do INSA, que faz uns relatórios semanais, bons tecnicamente, mas que poucos entendem e ninguém consulta. Os dados da mortalidade são os da DGS, com detalhe semanal por concelho (não existe para este ano desde Fevereiro, não sei porquê).
Pois bem, ou mal, em Lisboa, no período em análise, até finais de Novembro, a mortalidade semanal não ultrapassou os 140 óbitos; depois em Dezembro disparou, atigindo quase 200 óbitos na última semana do ano de 2016. Só retoma abaixo dos 140 óbitos na semana 7, ou seja, já em Fevereiro.
Se considerarmos os 120 óbitos por semana a mortalidade basal na capital (ou seja, mortes que ocorreriam sem gripe, ou seja, a ordem de grandeza em Outubro e Maio), contabilizam-se 502 mortes pela simples gripe apenas - repito, apenas - em Lisboa entre a semana 50 (início de Dezembro de 2016) e a semana 6 (meados de Fevereiro de 2017).
No Porto tivemos situação semelhante: na última semana de Novembro registaram-se 47 óbitos, tendo-se atingido um pico de 97 óbitos na primeira semana de 2017.
Se considerar, nos mesmos pressupostos de Lisboa, que a mortalidade basal no Porto é de 50 óbitos por semana, então tivemos em 9 semanas (entre a semana 50 de 2016 e a semana 6 de 2017) uma mortalidade de 230 óbitos causados pela gripe.
Obviamente que esta é uma análise superficial - e que necessitaria de ter em consideração outros factores -, mas tem-se aqui uma ordem de grandeza para reflexão. Como digo, se porventura olhassemos para as gripes com um olhar mais cuidadoso, porventura não teríamos entrado em pânico com a covid-19, desencadeando medidas que se ignora se foram as adequadas do ponto de vista de saúde pública, mas que se sabe terão repercusões graves em termos socio-económicos.
Podia aqui indicar outros casos, em municípios mais pequenos, onde as variações relativas são ainda maiores entre Outubro e Dezembro-Janeiro (pico da gripe), mas fico-me por estes casos.
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