domingo, 31 de maio de 2020

DO ENTENDIMENTO (COMPLETO) DA PANDEMIA EM PORTUGAL

Hoje faço uma longa análise (preferia que fosse a DGS a fazer, pois eu não sou, nem me pagam para ser, autoridade de saúde) para uma melhor compreensão da evolução da pandemia da covid-19 em Portugal. Para mim foi bastante útil; espero que vos seja também, pois não vi, até agora, esta análise feita em mais lado algum (mesmo sendo simples).

Explico a metodologia, que explica os três elucidativos gráficos em baixo, para apurar a evolução desde Março. Pegando nos boletins diários da DGS, defini seis períodos temporais: primeira quinzena de Março (1QMar), segunda quinzena de Março (2QMar), primeira quinzena de Abril (1QAbr), segunda quinzena de Abril (2QAbr), primeira quinzena de Maio (1QMai) e segunda quinzena de Maio (2QMai). Para cada período, apurei o número de casos positivos e o número de óbitos, em função dos nove grupos etários determinados pela DGS, padronizando para uma média diária, visto que a segunda quinzena de Março teve 16 dias e a segunda quinzena de Maio só contabilizou 14 dias (últimos dados do dia 29). Reparem que a análise é feita período a período, e não acumulado, de sorte que, desta forma, se tem o retrato de cada quinzena, e da evolução sequencial das quinzenas. Deste modo, os resultados que se obtêm são extremamente interessantes e elucidativos. Comecemos pelo primeiro.

Através do número médio diário de casos positivos (apesar de ser apenas a ponta do icebergue) percebe-se de imediato que o grande problema esteve, até ao final da primeira quinzena de Abril, na elevada contaminação dos maiores de 80 anos, o que indiciará que o controlo das transmissões nos lares foi complicada e somente se conteve somente na segunda quinzena de Abril. Com efeito, na segunda quinzena de Março, que já contou com o confinamento de duas semanas (iniciado no dia 18), o grupo dos maiores de 80 anos estava apenas na 4ª posição em casos positivos (58 por dia), atrás dos grupos dos 40-49 anos (91 casos por dia), dos 50-59 anos (89 casos por dia) e dos 60-69 anos (69 casos por dia).


No final da primeira quinzena de Abril, com o confinamento a completar quase um mês, o grupo dos maiores de 80 anos passou a ser o mais contaminado, passando a registar, neste período, 127 casos positivos por dia, um crescimento de 120% comparativamente à quinzena anterior, ficando ligeiramente à frente dos grupos dos 50-59 anos (120 casos diários) e dos 40-49 anos (116 casos diários). Note-se que todos os grupos etários, em maior ou menor grau, registaram aumentos de contaminações diárias entre a segunda quinzena de Março e a primeira quinzena de Abril. Tendo em conta o período de incubação médio (e até o máximo) seria expectável que a primeira quinzena (já bem dentro do período de confinamento) tivesse menos casos do que a segunda quinzena de Março (que apanhou casos de transmissão anteriores ao confinamento). Nessa medida, o confinamento parece não ter sido completamente eficaz.

A segunda quinzena de Abril já evidenciou uma ligeira melhoria nos maiores de 80 anos (os mais vulneráveis), que neste período contabilizou 73 casos diários, mas mesmo assim continuou a ser o maior registo em comparação com os outros grupos, que também desceram consideravelmente.

Maio, felizmente, mostrou uma evolução muito mais favorável. Na primeira quinzena de Maio, os maiores de 80 anos tiveram apenas 27 casos positivos por dia, que contrasta com valores mais elevados, na casa dos 40 por dias, nos grupos etários que englobam os adultos entre os 20 e os 59 anos. A segunda quinzena ainda apresentou melhor resultados: os maiores de 80 anos apenas tiveram 14 casos positivos por dia, sensivelmente tanto como o grupo dos 70-79 anos.

Um outro dado curioso, apesar dos alertas dos últimos dias relativamente aos focos na Grande Lisboa: Maio – que engloba o desconfinamento no início desse mês e também a maior abertura à actividade económica e à movimentação das pessoas – apresenta menos casos positivos do que o mês de Abril (confinamento total). E a segunda quinzena de Maio (242 casos positivos por dia) até apresenta níveis de contaminação inferiores à primeira quinzena de Maio (255 casos). Por outro lado, curiosamente, os grupos mais jovens (crianças e jovens em idade escolar) registaram em Maio níveis de contaminação mais baixos do que em Abril, mesmo se naquele mês eram bastante baixos.

Em conclusão, o desconfinamento não evidencia a ocorrência de um agravamento nas contaminações; pelo contrário.

Quanto ao segundo gráfico, mostra o óbitos diários em cada quinzena por grupo etário. Neste caso, embora haja uma relação directa entre o número de casos positivos, convém alertar que não deve ser feita uma comparação directa entre os casos positivos e os óbitos no período, uma vez que uma parte substancial dos óbitos em determinado período são devidos a contaminação no(s) período(s) anterior(es). Em todo o caso, uma notória evidência, que já se sabia, mas que no gráfico se torna muitíssimo mais visível: em qualquer dos períodos, o grupo dos maiores de 80 anos é, com grande distância de todos os outros, com mais vítimas, tendo atingido o pico na primeira quinzena de Abril (quase 20 óbitos por dia), descendo para 18 por dia na segunda quinzena de Abril, e registando depois uma forte descida em Maio para os 8-9 óbitos diários. Face ao diferimento entre a data das contaminações e os desfechos fatais será expectável que o número de óbitos nesta faixa etária se mantenha ainda por mais cerca de um mês, mesmo se as novas contaminações estiverem aos níveis da segunda quinzena de Maio.


Outra evidência a partir deste segundo gráfico é a menor gravidade, em termos de desfechos fatais, para o grupo dos 70-79 anos, que tiveram o pico de óbitos também na primeira quinzena de Abril, mas muito mais baixo (cerca de 6 óbitos diários), rondando em Maio cerca de dois óbitos por dia.

Note-se que a menor gravidade da covid no grupo dos 70-79 anos face ao grupo dos maiores de 80 ainda é reforçada por serem um grupo mais abundante. Com efeito, de acordo com as estimativas do INE existem cerca de 965 mil pessoas com idades entre os 70 e 79 anos, enquanto os maiores de 80 anos são cerca de 661 mil. Para os restantes grupos etários, apenas para os adultos entre os 60 e 69 anos a covid teve algum grau de letalidade minimamente relevante, mas apenas com um pico de cerca de três óbitos diários na primeira quinzena de Abril, baixando para valores médios inferiores a um óbito nas quinzenas seguintes. Os outros grupos, como já se tem evidenciado, a probabilidade de morte por covid é extremamente baixa, muito menor do que morrer de acidente automóvel.

Por fim, o terceiro gráfico, mostra, para cada período (quinzena), a taxa de letalidade (óbitos por casos positivos), mas neste caso tendo em consideração os casos e os óbitos de todos os períodos anteriores. Deste modo, observa-se como tem este indicador evoluído, fazendo-se notar que o seu crescimento não advém de um aumento da perigosidade, mas sim, entre outros factores relacionados com a maior incidência de testes (e detecção de casos positivos), com o diferimento de muitos óbitos para a(s) quinzena(s) posterior(es) às contaminações. Com o tempo, a curva da letalidade tende a estabilizar-se, o que já começa a se evidenciar em alguns grupos etários. Este gráfico reforça assim a perigosidade da covid no grupo dos maiores de 80 anos (perto dos 20%) e da irrelevância da pandemia para os menores de 60 anos (excepção para casos muito pontuais).


Note-se, porém, que a taxa de letalidade deve ser interpretada com muita prudência, tendo em consideração que se refere ao número de óbitos por casos positivos, e não por contaminados. Por exemplo, na Espanha, os resultados de testes serológicos indicaram que 5% dos maiores de 80 anos tinham anticorpos da covid. Mesmo que em Portugal o SARS-CoV-2 tivesse contaminado apenas metade dessa percentagem (2,5%), significaria então que cerca de 165 mil idosos portugueses com mais de 80 anos tinham sido contaminados (0,025*165 mil), donde a taxa de mortalidade efectiva seria de 5,7% (face aos 936 óbitos até agora registados). Se consideramos uma taxa de contaminação de 2,5% para toda a população, então a taxa de mortalidade da covid baixaria para cerca de 0,5%.

Haveria mais conclusões a retirar, mas fico por aqui.

Bom dia. E boa sorte.

sábado, 30 de maio de 2020

DO NEGÓCIO DO PÂNICO

Isto chegou ao nível do abjecto... A Ética nunca foi tão flagelada! Portanto, está garantida a alimentação do pânico por mais uns tempos. O Correio da Manhã (e haverá outros nos próximos tempos) abriu um negócio de venda de máscaras. Não perca nos próximos dias mais notícias alarmantes do “seu” CM nas bancas. Ao lado das máscaras CM.


DA ANESTESIA

Vá, emprenhem pelos ouvidos a doce cantilena da Direcção-Geral da Saúde (DGS); vá, embalem-se com as notícias da nossa comunicação social, que até parece não ter ninguém que faça mais do que pegar num microfone, como seja o saber fazer mais do que uma "regra de três simples", ou mais do que contar pelos dedos; vá, continuem a achar que só se morre de covid-19, sendo essa uma morte gloriosa (ao contrário das outras), equivalente à dos "mártires da jihad", com direito a prebendas no paraíso... Enfim, seja como queiram...
Em todo o caso, a realidade é esta, a dos números, e aqui vai, a realidade, para quem quiser.
Vejam o primeiro gráfico. Na última quinzena, a mortalidade dos maiores de 85 anos "disparou", e não foi pouco e não foi à conta da covid-19. Nos últimos dias deve terá sido pelo calor (a DGS não recomenda ligar-se ares condicionados por causa da covid-19). A média móvel de 5 dias aponta, à data de ontem, para 36 mortos acima da média. O excesso de mortalidade desde o dia 15 até ao dia 29 de Maio é de 361 óbitos em relação ao valor expectável para esta época do ano (média dos últimos seis anos). Destes, apenas cerca de uma centena morreram de covid-19.
Vejam agora o segundo gráfico. Com a covid-19 supostamente controlada e nunca com cuidados intensivos sobrelotados, o mês de Maio de 2020 tem sido uma razia para os mais idosos, e a culpa não é, pelos dadis da DGS, da covid. Até ao dia 29 de Maio já morreram 3.820 pessoas deste grupo etário; quase 700 óbitos a mais do que a média. E a covid-19 matou muito menos de 150 pessoas deste grupo (na verdade, registaram-se 147 óbitos embora no grupo dos maiores de 80... a DGS não faz, julgo que propositadamente, coincidir as faixas etárias para dificultar análises).
E era só. Tenham um bom dia. E boa sorte.



sexta-feira, 29 de maio de 2020

DA INSUSTENTÁVEL OPACIDADE DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE

O presidente Marcelo Rebelo de Sousa garantiu-nos que ninguém iria mentir. Não prometeu, é certo, que ninguém iria esconder informação. Nem a omissão é, para os puristas, uma mentira.

Isto a pretexto do obscurantismo da Direcção-Geral da Saúde (DGS) em redor dos dados da covid-19. O Decreto nº 2-B/2020 referia, no seu artigo 39º, que seria disponibilizada "à comunidade científica e tecnológica portuguesa" os microdados anonimizados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica.

Mesmo sendo uma base de dados, que por lei constitui documentos administrativos não-nominativos, acessível a qualquer cidadão, como sou doutorando no ISCTE (e, aliás, já fiz um relatório académico sobre a covid-19), assumi modestamente integrar a "comunidade científica e tecnológica
 portuguesa". Portanto, pedi as credenciais de acesso à base de dados da DGS.

Pois bem, exigiram-me um documento do ISCTE sobre o estudo que iria fazer e ainda um parecer da Comissão de Ética da universidade. Não há nada no Decreto nº 2-B/2020 que exija tal, nem a lei geral e de acesso aos documento administrativos exige tal. E desconfio que a DGS se arrogue o direito de aceitar ou não os requerimentos. Por uma questão de princípio, não aceito que a Administração Pública (que é feita de pessoas que devem cumprir a lei) exijam aquilo que não consta na lei.

Solicitei à DGS, portanto, que o meu pedido fosse aceite ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos. Mais de duas semanas depois, não tenho resposta. Seguiu hoje queixa para a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Devo ter um parecer daqui a uns meses, como habitualmente, mesmo se favorável... A Administração Pública, ainda mais em matérias sensíveis, continua igual, independentemente do Governo. Está na massa do sangue da Administração Pública a opacidade, a procrastinação, o medo de ver os cidadãos a olharem e pensarem com seus olhos e seus cérebros a realidade.

Nota: Transcrevo o art. 39º do Decreto nº 2-B/2020 de 2 de Abril:

Acesso a dados anonimizados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica para investigação científica

A Direção-Geral da Saúde disponibiliza à comunidade científica e tecnológica portuguesa o acesso a microdados de saúde pública relativos a doentes infetados pelo novo coronavírus SARS-CoV-2 e a pessoas com suspeita de COVID-19, devidamente anonimizados e sem possibilidade de identificação do respetivo titular, que se encontrem na posse da Direção-Geral da Saúde ou sob a sua responsabilidade

Nota: Transcrevo o art. 39º do Decreto nº 2-B/2020 de 2 de Abril:

Acesso a dados anonimizados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica para investigação científica
A Direção-Geral da Saúde disponibiliza à comunidade científica e tecnológica portuguesa o acesso a microdados de saúde pública relativos a doentes infetados pelo novo coronavírus SARS-CoV-2 e a pessoas com suspeita de COVID-19, devidamente anonimizados e sem possibilidade de identificação do respetivo titular, que se encontrem na posse da Direção-Geral da Saúde ou sob a sua responsabilidade.


DA COVID, O MENOR DOS MALES DOS MAIS IDOSOS


Continua a ser difícil fazer análises cruzadas com os dados da DGS, por as suas bases de dados usarem grupos etários distintos, mas vamos lá, mesmo com uma aproximação...
Todos sabemos já que a covid-19 é especialmente precupante para os mais idosos, sobretudo a partir dos 75 anos e, em especial, nos maiores de 85 anos. Segundo a DGS, já terão morrido, até ontem, 929 pessoas por covid com mais de 80 anos, representando 67% do total, i.e., duas em cada três vítimas da covid-19 são idosos com mais de 80 anos. Seria mais conveniente ter esse valor para os maiores de 85 anos,mas vamos admitir que todos estes tenham mais de 85 anos. Significa que a covid-19 vitima muito mais este grupo etário, tendo em conta que, segundo o INE, 40% das mortes por ano são de maiores de 85 anos.
No entanto, tenho também chamado aqui a atenção que se está a assistir a um excedente de mortes não-covid - i.e., óbitos acima do expectável, devido a patologias não-covid mas associadas em certa medida às lacunas da assistência médica no decurso da pandemia (e que tem sido abordado por estudos de investigadores na área da medicina). Ora, esse excedente de mortes está, obviamente, a incidir sobretudo sobre essa faixa dos mais idosos - e os meus apelos têm vindo a ser dirigidos nesse sentido. Ou seja, a covid-19 é importante, mas não é tudo. Não se pode investir tudo, com custos sociais enormes, para salvar idosos da covid para depois os deixar morrer por outras patologias nas semanas ou meses seguintes.
Para ilustrar qual tem sido o peso da covid-19 na mortalidade dos mais idosos deixo-vos o gráfico em baixo que constitui uma aproximação da realidade: mostra a contribuição da covid-19, em termos de percentagem, na totalidade das causas de morte, usando as média móveis de 5 dias.
Note-se que a análise peca por excesso, porque é a razão entre a mortalidade por covid-19 dos maiores de 80 anos em relação à mortalidade total dos maiores de 85 anos. Ou seja, o peso da covid-19 será ligeiramente menor do que o representado. Em todo o caso, a covid-19 nunca terá sido responsável por mais de 15% das mortes totais durante o mês de Abril, e actualmente representa menos de 6%. Ou seja, comecemos a olhar agora também para as outras patologias que nos "levam" 94 idosos em cada 100, mesmo se os outros 6 sejam perdas que nos devam preocupar.




DO CAOS BRASILEIRO E DO MILAGRE LUSITANO

Ninguém de bom juízo pode aprovar o destrambelhamento do Brasil sob a batuta do inenarrável Jair Bolsonaro. O caos já há muito ali se instalou, e nem a culpa é do SARS-CoV-2. Nos últimos dias têm morrido por covid ao ritmo de mil pessoas por dia. A tal ponto a situação é grave que o Brasil está quase a ultrapassar Portugal no número de mortes por milhão de habitantes: 126 contra 136... Ainda estão, portanto, atrás do “milagre lusitano”.


quinta-feira, 28 de maio de 2020

DAS NOTÍCIAS QUE NÃO INTERESSA DAR

Não costumo embandeirar na onda daqueles que criticam a comunicação social (até por ter sido jornalista), mas sinto que, cada vez mais, no tratamento da pandemia, a tentação é continuar a dar notícias que alimentem o pânico e justifiquem a "nova normalidade" imposta pelo Governo, que dá sempre um "bom" fluxo noticioso. Porém, há limites!

Reparei hoje que o Instituto Nacional de Estatística (INE), atenção, repito: o Instituto Nacional de Estatística, que é só a entidade oficial mais independente em relação a dados oficiais, fez uma análise divulgada no passado dia 22 de Maio. Só hoje a vi, e não me recordo que qualquer órgão de comunicação social tenha sequer abordado ao de leve algumas das suas conclusões a partir dessa análise.

E o que mais ressalta nessa análise do INE (e que eu chamaria para primeira página)? Isto: o efeito da pandemia foi nulo nos menores de 65 anos. Atenção, não é o Pedro Almeida Vieira  dizer, ou outro qualquer, ou um estudo da DGS ou do INSA. Ou do Gato das Botas. É SÒ o INE! Vejam o gráfico, com base nos dados do INE, onde surge a comparação da mortalidade acumulada entre 1 de Março e 10 de Maio para os anosde 2020,2019 e 2018 para a população com menos de 65 anos... Para aquela faixa etária, da população activa, a covid não existe. Existirá para o grupo dos mais idosos, mas a incidência das medidas de protecção devem ser feitas para esse grupo, não para a generalidade da população.

Tudo o que se está a fazer em termos de desconfinamento não poderia ignorar esta análise do INE. Tudo isto que se anda a fazer é um absurdo. Aquilo que deveria estar a ser feito era reforçar as medidas profilácticas nos lares e junto dos mais idosos, que, aliás,estarão a sofrer agora mais com as temperaturas elevadas do que com a coivid. E não parece estar a ver-se qualquer medida da DGS. E pergunta-se: o que anda a comunicação social portuguesa a fazer no meio disto tudo? Depois queixem-se de as pessoas deixarem de confiar nela...


DO SALVA AGORA PARA DEIXAR MORRER MAIS TARDE

A comunicação social anda por aí a divulgar uma estimativa da Escola Nacional de Saúde Pública que aponta, no período de 1 a 15 de Abril, para o «salvamento» de 146 pessoas por se ter feito confinamento.
Pois muito bem! Pena é agora verem-se os mais idosos a morrer, que «nem tordos", por outras causas,.Nos últimos 15 dias (13-27 Maio), contas feitas, há um excesso de 312 mortes  (em relação ao número expectável para este período) para os maiores de 85 anos. E nem um terço terá sido por covid... Ou melhor, não se vê: a comunicação social não fala disso!
Nota: Talvez para não se fazerem comparações, a DGS continua a divulgar os óbitos por covid usando grupos etários diferentes daqueles que são usados pela base de dados e-VM, também por ela gerida. No boletiim da covid, entre 13 de 27 e Maio, morreram 127 pessoas por covid com mais de 80 anos. Ignora-se, portanto, quantas destas tinham mais de 85 anos. Enfim...

quarta-feira, 27 de maio de 2020

DA CEIFEIRA PÓS-COVID

Enquanto o Governo nos "entretém" com regras e regrinhas em creches, escolas secundárias, museus, casas de espectáculo, praias, Festas do Avante, restaurantes, prostíbulos (espera!, aqui ainda não chegou...), os mais idosos, esses, continuam a "morrer que nem tordos"... Desculpem a expressão, mas é de raiva!

Já não é de covid-19; será de outras patologias. A morte ceifa à mesma, mas dessa ninguém liga. Em Maio, a mortalidade no grupo dos maiores de 85 anos já deveria estar, nesta altura, abaixo ou a rondar os 100 óbitos. Ora, no domingo passado morreram 143 e anteontem foram mais 136. Nesse período de dois dias, morreram 11 pessoas com covid com mais de 80 anos. As contas são fáceis de fazer, a conclusão uma: para os idosos que não morreram de covid, o risco de "irem" agora por outras patologias aumentou bastante... Pouco importa já, não é? O importante era o "sucesso" na luta contra a covid...


domingo, 24 de maio de 2020

DAS TRÊS CASTAS DE MORTOS EM TEMPOS DE PANDEMIA

Sobre as tão elogiadas "elegias" às vítimas da covid-19 na imprensa internacional, e só a essas, cada vez mais julgo que se estão a viver tempos distópicos. Agora criam-se "castas" de mortos, sendo a mais homenageada a que foi morta pelo SARS-CoV-2... E vejo tudo isto a ser defendido implicitamente até por amigos inteligentes e lúcidos... Deixo-vos aqui o caso português desta divisão em "casta" mortuária, com o devido enquadramento, hélas, estatístico.


DOS MÁRTIRES E DOS OUTROS

Sucedem-se as homenagens às vítimas da covid. Hoje é a vez do New York Times, que pespega nomes e apelidos desses mortos, e titula: “uma perda incalculável”. À primeira vista é um gesto bonito, mas deixa uma sensação de “tempos normais”, embora de sabor estranho... Nos “tempos normais”, um “morto ocidental” é mais sentido do que um morto africano” ou um morto asiático”: é a proximidade, dizem. Agora, parecem dizer-nos, com estas homenagens, que um “morto ocidental por covid” é um mártir, não é um número. E assim deve ser...

Porém, coisa estranha: e os outros, sim, os outros, que por acaso em número até são mais de 10 vezes mais (em Portugal 94% de todos os mortos desde 15 de Março são de outras patologias)? Esses outros já não são mártires, já não merecem homenagem? Nem aqueles que soçobraram exactamente porque à conta da covid a assistência hospitalar os colocou em segundo plano?



sexta-feira, 22 de maio de 2020

DAS CORES

Andamos há dois meses condicionados e alarmados pelo ROXO (covid); a DGS e o Ministério da Saúde estão a borrifar-se para o VERMELHO (não-covid), que é maior do que o ROXO; e ninguém alguma vez se interessa com a quantidade de AMARELO (mortalidade base de uma infinidade de doenças e outras causas)... É só isto!

DO 'FICA EM CASA'... PARA MORRER

A evolução dos óbitos registados no domicílio entre a segunda quinzena de Março e o final da segunda quinzena de Abril indicia que a pandemia trouxe níveis de medo que terão implicado, em alguns períodos, o surgimento de doenças súbitas, e um afastamento das urgências mesmo perante sintomas graves, que resultaram num inusitado acréscimo de óbitos evitáveis.
Com efeito, nas semanas anteriores à pandemia, e depois do abrandamento do surto gripal, os óbitos diários no domicílio do falecido rondavam os 80. Na primeira quinzena de Março, a média diária foi de cerca de 83. Em 16 de Março, dia da declaração da primeira morte por covid-19 em Portugal, os óbitos no domicílio subiram para 110 e, dois dias depois, sendo anunciado o primeiro Estado de Emergência, atingiram os 126, representando 38% do total, um recorde do ano. A média móvel manter-se-ia acima da centena de óbitos diários até 17 de Abril, descendo apenas para os níveis anteriores à pandemia na última semana de Abril.
Sendo certo que, sobretudo durante o mês de Abril se foram intensificando os alerta de médicos, bem como análises que apontavam para uma redução diária de 191 mil visitas às urgências hospitalares durante o primeiro mês e meio da pandemia (Nogueira et al., 2020), esta situação perdurou por demasiado tempo, contribuindo muito para o acréscimo de mortes por patologias não relacionadas com a covid-19. Se confrontarmos as mortes no domicílio na segunda quinzena de Março e primeira quinzena de Abril com a média da primeira quinzena de Março, estima-se então um excesso de 658 mortes potencialmente evitáveis apenas por esta via. Efacto, se o período 16mar-15abr registasse a mesma média diária da primeira quinzena de Março (83,47 óbitos) seria expectável a ocorrência de 2.671 mortes, mas na realidade observaram-se 3.329.
No entanto, o excesso de mortes não se registou apenas no domicílio. Estimativas recentes indicam excesso de mortalidade que ronda, pelo menos, as duas mil mortes, sendo que apenas metade se deveram à covid-19.

quinta-feira, 21 de maio de 2020

DO DEBATE NECESSÁRIO

Além da questão de saúde pública, o debate sobre os efeitos da covid-19 deveria focalizar-se na forma como devemos gerir uma sociedade que, como nunca antes, convive com quatro gerações: bisavós, avós, pais e filhos. A esperança média de vida duplicou em um século (de 40 para 80 anos na maioria dos países desenvolvidos). Em consequência, a população idosa, e mais vulnerável em termos de saúde, disparou: por exemplo, nos países da União Europeia, os maiores de 65 anos passaram de um total de 9,5% da população em 1960 para 20,2% em 2018. Os maiores de 85 rondam já cerca de 5% da população. Que fazer numa situação em que devemos tentar proteger os idosos, prolongando-lhes a vida finita por mais alguns anos, sem condicionar o direito ao usufruto pleno da vida pelas populações mais jovens? No caso particular da covid, tal como já sucedia com a gripe, os idosos são particularmente afectados, ao contrário dos mais jovens (menos de 45 anos, por exemplo), para os quais estas doenças não causam qualquer problema (a mortalidade por este tipo de doenças é muitíssimo diminuta). Devemos assim centrar os nossos esforços em soluções que conciliem uma protecção efectiva dos idosos nos períodos mais críticos (Inverno, por exemplo), deixando os mais jovens viver livremente? Ou devemoos antes, como até agora, fazer lockdowns e impor regras restritivas gerais e cegas, de sorte que parecemos estar a viver num mundo distópico? Tenho reflectido sobre isso, mas não tenho soluções. Tenho é notado que não se tem discutido estes aspectos fulcrais; pelo contrário, insiste-se na alimentação do medo, e do "confinamento" da racionalidade.


quarta-feira, 20 de maio de 2020

DOS FACTOS


Sem mais comentários, eis o "milagre lusitano", confrontando a variação do PIB do primeiro trimestre de 2020 (em comparação com período homólogo de 2019) com os óbitos por milhão de habitantes: de entre os 20 países da UE que já divulgarem as contas dos primeiros três meses do ano, Portugal foi o 13º com «melhor» desempenho económico e é o 14º melhor em termos de desempenho na luta contra o SARS-CoV-2.


terça-feira, 19 de maio de 2020

DO MEU STATEMENT PARA MEMÓRIA FUTURA


Para esclarecimento, e para remeter àqueles que têm andado ingloriamente a tentar "infernizar-me" a vida - ignorando que me dou bem como o diabo (para quem conhece os meus romances...) -, em baixo segue uma síntese das minhas opiniões, consolidadas pelas leituras, análises e reflexões que tenho feito ao longo de mais de dois meses:

1 - A covid-19 é uma doença perigosa sobretudo para os idosos, e especialmente para os maiores de 85 anos. 2 - A covid-19 não representa qualquer perigo relevante para a população com idade inferior a 55 anos, exceptuando-se, porém, os casos individuais de pessoas com alguma vunerabilidade. Contudo, essas pessoas são vulneráveis a outras mais doenças. 3 - Portugal teve uma resposta bastante satifastória ao nível do controlo da pandemia na fase inicial, embora com falhas evidentes na forma como não conseguiu conter algums surtos no região do Porto, Braga e Aveiro. No caso específico de Ovar, a cerca sanitária não teve qualquer efeito na contenção, porque existiam focos muitos activos no exterior. 4 - A gestão do medo, desde Março, foi catastrófica. A comunicação do Governo/SNS, ao nível do Estado de Emergência, não conseguiu sossegar a população, de sorte que se verificou uma fuga às urgências e concomitantemente um acréscimo da mortalidade (como fica patente nas análises da mortalidade no SICO). O SNS tinha mecanismos e instrumentos para identificar esses casos em tempo útil (o SICO é uma ferramenta excepcionalmente boa, pioneira no Mundo, e que deveria ser mais usada em vigilância activa). 5 - Observa-se claramente um excessso de mortalidade desde o início de Março, e que continua ainda ao longo deste mês de Maio, mesmo registando-se um decréscimo da actividade do coronavírus. Atinge, mais uma vez, os mais idosos, e a tal ponto que a mortalidade por causas não explicadas pelas covid é superior à causada pela covid. Ou seja, em vez de uma, temos duas pandemias, sendo que uma delas (a não-covid) está a ser menosprezada pelo Governo/SNS. Temo que venha a ter consequências dramáticas ao longo dos próximos meses. 6 - O desconfinamento deveria ter sido diferenciado em função das regiões, uma vez que Portugal sempre apresentou níveis de incidência da doença bastante distintos, com o Norte e o Centro a apresentarem situações mais graves. Mais uma vez o SICO poderia ser um instrumento para auxiliar a definição desse desconfinamento regional. 7 - As novas regras de funcionamento para as creches são aberrantes, lesivas para as crianças e sem qualquer vantagem profiláctica, tendo em consideração que elas são um grupo de risco nulo. Se se receia que sejam transmissoras para idosos, seria mais humano que se evitasse o contacto entre os idosos e as crianças, e não impor regras que elas não entendem e as podem traumatizar. 8 - As novas regras de funcionamento para as praias são uma anedota de mau gosto. 9 - A comunicação social tem, em termos globais, contribuído muito para alimentar o medo. A quantidade de notícias com títulos alarmistas (com o recurso ao verbo PODER) atinge níveis de insanidade. Por norma, quase todos os órgãos de comunicação social têm seguido a "linha informativa" do Governo, não questionando, por exemplo, o grave problema do excesso de mortes por outras causas. 10 - Defendo há muito que sejam feitos testes serológicos, como outros países já fizeram, de modo a estimar, com alguma aproximação à realidade, o grau de contaminação no país, e determinar com rigor os riscos para o futuro. Portugal continua a gerir a pandemia às cegas. A conclusão dos anunciados testes serológicos apenas para Julho não é compreensível nem satisfatório.

DO NEW YORK TIMES, QUE ESTRAGA A PERFOMANCE DE PORTUGAL

Leiam a citação e vejam os quadros: os números não fogem nada dos cálculos que eu tenho vindo a apresentar. Portugal surge com um excesso de mortalidade de 16% entre 16 de Março e 26 de Abril, cerca de 1.000 óbitos a mais não explicados pela covid (ou seja, por falta de tratamento para outras afecções). Ou seja, confirma que há uma pandemia no nosso SNS pior do que a covid (que até àquela data tinha matado 903 pessoas), como tenho vindo a dizer... Para horror dos que zurziram em mim pelas comparações com os "frios" suecos, o excesso de mortalidade na Suécia é de 28%, mas os óbitos por falta de tratamento cifram-se em apenas 400. E isto, como tenho vindo a repetir, não é uma corrida curta. A mortalidade na primeira quinzena de Maio continuou, em Portugal, muito acima da média, sobretudo na população com mais de 85 anos..

«Over the last two months, far more people have died in most of these countries than in previous years, The New York Times found. The totals include deaths from Covid-19 as well as those from other causes, likely including people who could not be treated as hospitals became overwhelmed.»

segunda-feira, 18 de maio de 2020

DO MAU RESULTADO SEM SER CATÁSTROFE (dos efeitos sobre os idosos com mais de 85 anos)

Não é já novidade para ninguém duas coisas:

a) a covid-19 é particularmente grave para os maiores de 85 anos;

b) a faixa etária mais «susceptível» a deixar o mundo dos vivos, independentemente da covid-19, é a dos maiores de 85 anos.

Ora, se juntarmos, na equação, covid + medo + isolamento + descontrolo do SNS, temos um resultado muito pouco satisfatório, mas que, numa análise mais detalhada, não se mostra catastrófico.

Nesta madrugada estive a calcular, com o detalhe possível, a evolução da mortalidade por faixa etária do período compreendido entre 1 de  Outubro de 2019 e 15 de Maio de 2020 (1out-15mai2020), que corresponde, grosso modo, ao período de vigilância gripal, seguindo o modelo do Instituto Nacional de Saúde.

Vou-me debruçar, por agora, na faixa dos maiores de 85 anos, que constitui o problema mais sensível, onde se detectam situações preocupantes, por um lado,.mas também não demasiado catastróficas, numa perspectiva de saúde pública.

No primeiro gráfico encontra-se espelhada a variação da mortalidade neste período, onde se destaca, a partir da segunda quinzena de Março:

a) a mortalidade "explicada", que até 15 de Março representa a mortalidade efectivamente verificada, e a partir de 16 de Março a mortalidade média expectável (mortalidade basal), considerando a média dos últimos cinco anos para esse período) - mancha verde 

b) os óbitos por covid dos maiores de 80 anos (a DGS não faz coincidir as faixas etárias entre os boletins da covid e o SICO, não sei porquê, pelo que assim se pressupôs que todos os óbitos de maiores de 80 anos eram efectivamente só de pessoas com mais de 85 anos) - mancha vermelha

c) SINPADE (Síndrome de Pânico e de Descontrolo do SNS (como há dias referi), e que representa o acréscimo de mortalidade, em relação à não explicada pela covid - mancha amarela

Significa isto que a soma destas três componentes constituem a mortalidade total, por dia, para este grupo etário. Obviamente, antes de 15 de Março, como não se registaram oficialmente óbitos por covid (embora se registe já um incremento na primeira quinzena desse mês, o que denuncia que a covid já estaria então a causar vítimas), o total de óbitos é apenas a da mancha verde (mortalidade "explicada").

Ora, uma breve análise visual mostra que a área da mancha vermelha (covid) é ligeiramente inferior à da mancha amarela (SINPADE), sendo que a soma das duas representa o excesso de mortalidade no período, Em termos numéricos, entre 16 de Março e 15 de Maio morreram este ano 9.136 pessoas deste grupo etário contra uma média em período homólogo de 7.337, o que significa um acréscimo de 1.799 óbitos. Destes, 807 foram por covid (um valor que pecará por excesso, devido a se ter contabilizado todos os óbitos dos maiores de 80 anos como se fossem da faixa dos maiores de 85), enquanto 992 óbitos terão sido devidos ao SINPADE. Ou seja, a covid explicará, nesta perspectiva estatisticamente simplificada, menos de metade do acréscimo de mortalidade. Aliás, para o período da pandemia em análise (16mar-15mai), a covid terá sido responsável, no máximo, por 8,8% das mortes nesta faixa etária (807/9.136).

Um exemplo evidente de não ter sido a covid a explicar a totalidade do acréscimo de mortalidade observa-se no dia 4 de Abril, quando morreram 199 pessoas com mais de 85 anos, mas a DGS indicou apenas 20 óbitos de pessoas com mais de 80 anos (repete-se que se pressupôs que este grupo integrava totalmente a faixa de maiores de 85 anos). Para esse dia seria expectávela ocorrência de 131 óbito neste grupo etário. Ou seja, para este dia estimou-se 48 óbitos para o SINPADE.

Para mostrar, noutra perspectiva, que a pandemia, nas suas duas vertentes (covid e SINPADE), foi particularmente agreste para este grupo etário, saliente-se que, em média, para este período (16mar-15mai), os óbitos de maiores de 85 anos representam 40,5% do total, mas este subiram para 44,1% .

Para o período em análise mais longo (1out2019-15mai2020), que inclui portanto o surto gripal desta época e a pandemia da covid (e seus efeitos colaterais), contabilizam-se 32.621 óbitos no grupo dos maiores de 85 anos, um acréscimo de 2.172 óbitos em relação à média dos últimos cinco anos. Significa isto que o acréscimo de óbitos pelo surto gripal desta época (com pico em meados de Janeiro, mas com incidência a partir de Outubro) foi apenas ligeiramente acima da média.

Saliente-se, contudo, que, apesar da pandemia da covid (e seus efeitos colaterais), a época 1out2019-15mai2020 (com 32.621 óbitos para o grupo dos maiores de 85 anos) foi pouco mais mortífera do que a época 1out2017-15mai2018 (com 32.474 óbitos), que teve um período gripal bastante longo. O Instituto Nacional de Saúde viria mesmo a estimar, para essa época de gripe 2017/2018 um excesso de mortalidade por todas as causas, entre as semanas 52/2017 e 9/2018, de 3.714 óbitos (15% superior em relação ao esperado). 

Em todo o caso, diga-se, a mortalidade no período 1out2019-15mai2020, apesar de elevada, ainda está dentro do intervalo de confiança de 95% (25.956-34.943), ou seja, do ponto de vista estatístico, não constitui uma situação anormal. 

Conclusão: apesar da covid, apesar do medo das pessoas em se dirigirem às urgências, do pânico quase geral, e também de um certo descontrolo do SNS (que baptizei de SINPADE), e pese embora o drama que sempre representará a perdade de entes queridos, até agora a pandemia causada pelo SARS-CoV-2 não se mostra catastrófica mesmo para o grupo mais sensível (maiores de 85 anos). Na minha humilde opinião, os resultados poderiam ter sido melhores se, porventura, o SNS tivesse conseguido dar maiores garantias de segurança para as idas às urgências e se não tivesse descurado as rotinas nos tratamentos aos mais vulneráveis, onde se encontram os idosos. Aliás, a situação continua a ser algo preocupante na faixa dos maiores de 85 anos, porquanto, apesar do surto da covid estão regredir, a mortalidade neste grupo continuava ainda bem acima da média no final da primeira quinzena de Maio, conforme aliás se pode observar no segundo gráfico.

Nota 1: Para uma comparação mais adequada considerou-se o período de 1 de Outubro do ano N até 16 de Maio do ano N+1 sempre que o ano N+1 não era bissexto, ou seja, sempre que o ano em causa tivesse apenas 28 dias no mês de Fevereiro.




domingo, 17 de maio de 2020

DO JORNALISMO DO PODE SER (OU NÃO)

Atenção: Cardumes de SARS-CoV-2 estarão, com toda a certeza, a infectar, com as suas espículas, os cérebros dos nossos jornalistas. Eu, que fui um deles, jamais, que me recorde, usei num título o verbo PODER. Usar o verbo PODER num título DEVE ser uma excepcionalíssima excepção. Porém, vejam esta "pequena lista" de 50 títulos encontrados numa breve pesquisa online, quase todos deste mês. PODE ser que, entretanto, este vírus seja eliminado. Ou não!
1 - Melhor tratamento para a covid-19 PODE ser um cocktail de medicamentos (DN, 15/5/2020)
2 - Covid-19 “PODE nunca vir a desaparecer" (RTP, 14/5/2020)
3 - Médicos alertam: diarreia ou urticária PODEM ser sintomas menos comuns da Covid-19 (Renascença, 22/5/2020)
4 - Animal acusado de ser responsável pela covid-19 PODE ser a solução para tratá-la (ZAP, 14/5/2020)
5 - Covid-19. Pressa de conseguir um medicamento PODE viciar a investigação (RTP 5/5/2020)
6 - Covid-19 PODE causar AVC em adultos jovens (TVI24, 22/4/2020)
7 - Cães PODEM detetar pessoas com COVID-19 (TV Europa, 16/5/2020)
8 - Doentes assintomáticos e infeções mortais. A diferença PODE estar nos genes (DN, 16/5/2020)
9 - Movimento antivacina covid-19 PODE comprometer esforços para acabar com pandemia, alerta estudo (Expresso, 14/5/2020)
10 - Covid-19: Ajuda do FMI PODE ir parar aos credores privados da dívida africana (Expresso, 15/5/2020)
11 - Covid-19: Pandemia PODE convergir com crise climática (RTP, 20/4/2020)
12 - Covid-19: Europa PODE enfrentar "segunda vaga mortal" no inverno, alerta OMS (Sábado, 15/5/2020)
13 - O antidepressivo (vendido em Portugal) que PODE proteger contra Covid-19 (Notícias ao Minuto, 13/5/2020)
14 - O Inverno no Hemisfério Sul PODE Piorar o Alcance da COVID-19 (National Geographic, 30/4/2020)
15 - Nicotina PODE ter efeito protetor contra covid-19, dizem investigadores em França (Negócios, 22/4/2020)
16 - Covid-19 PODE regressar todos os anos, doentes sem sintomas vão ajudar na propagação. O alerta é de cientistas chineses (Observador, 28/4/2020)
17 - Este smartwatch PODE salvar a vida de quem tiver Covid-19 (TSF, 22/4/2020)
18 - Covid-19. Futebolistas PODEM sentir estranheza no regresso à competição (RTP, 12/5/2020)
19 - Covid-19. Economia britânica PODE encolher 14% (Expresso, 7/5/2020)
20 - Vacina contra covid-19 PODE ficar pronta em setembro, dizem Pfizer e NYU (Exame, 14/5/2020)
21 - Medicamento anakinra para artrite PODE melhorar pacientes graves de COVID-19 (TV Europa, 15/5/2020)
22 - Investigação portuguesa PODE contribuir para vacina contra a Covid-19 (Renascença, 8/5/2020)
23 - Covid-19: serviço social em teletrabalho PODE potenciar situações de risco (TVI24, 12/5/2020)
24 - 'Super imunidade' PODE explicar como morcegos não adoecem com a Covid-19 (12/5/2010)
25 - Covid-19: OMS afirma que vírus também PODE afectar sistema vascular e cérebro (Público, 8/5/2020)
26 - Cientistas holandeses criam anticorpo que PODE travar a covid-19 (Expresso, 5/5/2020)
27 - Covid-19: África PODE chegar aos 250 milhões de infetados e 190 mil mortos (Lusa, 14/5/2020)
28 - Covid-19: regresso às aulas PODE criar desigualdade no acesso aos exames (Lusa, 15/5/2020)
29 - Covid-19: número de mortes em África PODE chegar aos 3,3 milhões (Lusa, 12/5/2020)
30 - Número oficial de mortes por covid-19 em Nova Iorque PODE ser pior, alerta agência (Expresso, 11/5/2020)
31 - Pandemia PODE matar indiretamente seis mil crianças por dia (RTP, 13/5/2020)
32 - Covid-19. Crise PODE levar fome a mais 6,9 milhões no Médio Oriente e África (Expresso, 12/5/2020)
33 - Covid-19. Novo vírus PODE estar a adaptar-se aos humanos, facilitando a sua propagação (Expresso, 11/5/2020)
34 - Homens morrem mais de Covid-19 e a culpa PODE ser do sangue (Notícias ao Minuto, 12/5/2020)
35 - OMS avisa que a Europa PODE enfrentar uma segunda vaga letal de covid-19 a partir do Outono (Público, 15/5/2020)
36 - Bolsa PODE “salvar” empresas no pós-covid (Negócios, 13/5/2020)
37 - Medicamento experimental contra o cancro PODE 'matar' o coronavírus (CM, 27/4/2020)
38 - Dor de cabeça pode ser sintoma de coronavírus (CM, 29/4/2020)
39 - Estudo indica que coronavírus PODE permanecer em sémen de homens recuperados (7/5/2020)
40 - Falar gera milhares de gotículas que PODE permanecer no ar até 14 minutos (TVI24, 15/5/2020)
41 - Sequelas da covid-19 PODEM durar anos após a recuperação (JN, 16/5/2020)
42 - A Covid-19 em crianças PODE não começar com tosse (Sábado, 15/5/2020)
43 - Covid-19 PODE gerar “baby boom” de mais sete milhões de gravidezes indesejadas (Expresso, 28/4/2020)
44 - Especialistas avisam: Covid-19 "PODE ser o início" de vaga de pandemias (Notícias ao Minuto, 27/4/2020)

Variante – PODE NÃO (o que é sempre para pior)
45 - Recuperar da Covid-19 PODE NÃO ser um alívio. Médicos temem efeitos a longo prazo (Visão, 27/4/2020)
46 - A Covid-19 em crianças PODE NÃO começar com tosse (15/5/2020)
47 - OMS afirma que Covid-19 “PODE NÃO desaparecer” e alerta para problemas mentais (Jornal Económico, 14/5/2020)
48 - Bioquímico alerta que PODE NÃO haver vacina para a Covid-19 apesar dos esforços (SIC, 8/5/2020)
49 - Covid-19. A máscara é obrigatória, mas a compra PODE NÃO ser fácil (Expresso, 4/5/2020)
50 - PODE NÃO haver vacina nem tratamento para a Covid-19 nos próximos meses (New in Town, 12/5/2020)

sábado, 16 de maio de 2020

DAS DUAS PANDEMIAS QUE PORTUGAL SOFREU: A MÁ COVID E A PÉSSIMA SINPADE

Hoje vamos ter duas análises. Esta parece-me bem elucidativa sobre uma pandemia pior que a covid que afectou Portugal desde Março e sobre a qual a DGS e o Ministério da Saúde disseram até agira "nada". Pois bem, essa segunda pandemia chamar-lhe-ei Síndrome do Pânico e do Descontrolo (SINPADE), forma de expressar o excesso de mortalidade decorrente do medo da covid (que fez com que as pessoas fugissem dos hospitais em caso de doença súbita) e do descontrolo no SNS,incapaz de continuar a dar resposta adequado aos casos do quotidiano. Para apurar os valores da SINPADE calculei, para cada quinzena deste ano, os valores médios dos óbitos diários, e confrontei com a média respectiva dos períodos homólogos de 2010-2019. Fiz a diferença para calcular o excesso de mortalidade. Para determinar a quota do excesso que se devia à covid e à SINPADE, procedi da seguinte forma: deduzi ao excesso médio diário os óbitos diários médios por covid (12 por dia na 2ª quinzena de Março; 29 na 1ª quinzena de Abril; 25 na 2ª quinzena de Abril; 13 na 1ª quinzena de Maio). O remanescente ficou por conta da SINPADE, isto é, representando o excesso de mortes que não foram causadas nem por covid nem pelas habituais afecções que sempre se verificariam (a chamada mortalidade basal). Ora, o que vemos então? Vemos que, com excepção da 2ª quinzena de Abril, a SINPADE matou muito mais que a covid: só neste período, com 42 óbitos diários acima da média, as mortes diárias por covid (25) suplantaram as da SINPADE (17 por dia). De resto, em todas as outras quinzenas, a SINPADE contribuiu muito mais do que a covid para o excesso de óbitos diários: 36 vs. 12 na 2ª quinzena de Março; 42 vs.29 na 1ª quinzena de Abril; e 16 vs.13 na 1ª quinzena de Março. Em termos globais, considerando o período do pandemia (2ª quinzena de Março até 1ª quinzena de Maio) tivemos um excesso de mortalidade de 2.919, sendo que 1.203 se devem à covid e, estimativas minhas, e denominação minha, 1.716 mortes se devem à SINPADE. Muito se poderia especular (no bom sentido do termo) sobre estes valores, mas parece-me evidente que se o SNS soube dar uma resposta adequada à covid, houve falhas evidentes e graves ao longo do processo. Primeiro, na comunicação junto da população para lhe dar confiança em termos de segurança aos serviços de urgência (patentes nos números elevados na 2ª quinzena de Março e 1ª quinzena de Abril); e provavelmente também na capacidade de resposta funcional do SNS aos problemas de saúde do quotidiano. Em qualquer dos casos, mostra-se evidente que a SINPADE foi, e espero que deixe de ser, uma doença pior do que a covid. Nota 1: As barras amarelas nas quinzenas anteriores ao surgimento da covid mostram a situação em 2020 relativamente à média e que é uma função sobretudo do maior ou menor agressividade dos surtos gripais. O surto gripal deste ano (2019-2020) estava a ser menos agressivo do que em outros anos.



DA ESTRATÉGIA: SUÉCIA vs. PORTUGAL

Vamos lá a contas para olharmos o "milagre português" face aos "frios suecos" que optaram por não fazer confinamentos nem restrições à maluca. 

Parafraseando a ministra sueca dos Negócios Estrangeiros de que isto não é um sprint, mas sim uma maratona, consegui encontrar dados credíveis comparar o verdadeiro "efeito" da covid-19 nos dois países em função dos óbitos pela doença e dos óbitos totais para os dois países desde o início do ano. Os dados constam no quadro em anexo, bem como as fontes.

Primeiro, a boa notíci para Portugal: a Suécia registou quase três vezes mais óbitos que Portugal devido à covid (3.220 vs. 1.126 até 8 de Maio). Significa isto que, tendo em conta a população de cada país, Portugal registou uma taxa de mortalidade de  apenas 0,11 por 1.000 habitantes contra 0,32 na Suécia.

Segundo,a péssima notícia para Portugal: contabilizando a covid e o surto gripal de 2020, a mortalidade total da Suécia é apenas de cerca de 85% dos óbitos totais de Portugal (38.409 vs. 45.353), significando assim uma taxa de mortalidade na Suécia se cifrou, até 8 de Maio, em 3,81 óbitos por 1.000 habitantes, enquanto em Portugal foi de 4,45 óbitos por 1.000 habitantes..

Conclusão evidente e irrefutável: a morte na Suécia tem ceifado muito menos do que em Portugal. O menor número de morte por covid-19 é, assim, uma vitória de Pirro para Portugal. A taxa de mortalidade por não-covid é, aliás, superior em 24% no nosso país em comparação com a Suécia (4,34 óbitos por 1.000 habitantes em Portugal vs. 3,49 na Suécia).


DO CRAVO E DA FERRADURA

António Costa apela que se saía à rua para dinamizar o comércio e depois sai-lhe isto: “As pessoas sabem que o vírus anda por aí, que não há vacina, que não há cura, mas se todos nos respeitarmos uns aos outros, podemos retomar em segurança”... Que não há cura, portanto! Ou seja, mais de 99% de contaminados pelo SARS-CoV-2, se atendermos aos testes serológicos, não morreram por milagre. Fónix!

sexta-feira, 15 de maio de 2020

DAS MORTES EM LISBOA E DAS COSTAS LARGAS DA COVID


Tem sido evidente que a mortalidade por covid-19 tem vindo a descer significativamente, conforme mostram os boletins da DGS. Contudo, como também tenho aqui mostrado, causa-me estranheza observar que a variação dos óbitos na faixa dos mais idosos continua pouco favorável. Encontrar onde anda o probllema é, perante a ausência de dados muito detalhados, uim trabalho detectivesco, uma vez que a DGS (a quem caberia identificar situações anormais) anda entretida a criar regras esdrúxulas que, por certo, irão ao pormenor de determinar a distância mínima entre castelos de areia nas praias.

Assim, comecei a observar as variações da mortalidade por distrito ao longo deste ano (comparar com a média daria imenso trabalho). Todos apresentam variações favoráveis (decréscimos significativos) a partir do início de Abril, embora com alguns sinais não tão evidentes em zonas menos afectadas pela covid, como Coimbra e Lisboa. No entanto, mesmo o distrito de Lisboa indicava-me que, em termos absolutos, a situação não era assim demasiado chocante, Mas havia ali sinais de desconfiança. Aprofundei a investigação. Fui ver ao nível de concelho.

Como sabem, o concelho de Lisboa (apesar de pouco afectado pela covid) é um dos mais envelhecidos do país. Fui olhar então para as variações semanais dos óbitos (entre a semana 1 e a 19) e, hélas, a mortalidade está ainda bem acima dos valores expectáveis para a época desde a segunda semana de Março (sema 13 do ano). Não há propriamente um pico de mortalidade, característico de um surto epidémico, mas antes uma subida e uma manutenção. Ou seja, desconfio que o excesso de mortes tenha outras causas que não a covid. O excesso de mortalidade que calculei desde a segunda semana de Março até agora são de quase 100 óbitos a mais, o que não é coisa de somenos, mas sobretudo denota que algo anda a falhar.

Para ter um termo de comparação regional, observei o concelho de Sintra, mais jovem, onde se observa um pico de óbitos em redor da segunda semana de Março, embora não demasiado anormal. mas a seguir uma descida significativa, estando a mortalidade actualmente dentro dos níveis expectáveis. Claramente observa-se comportamentos similares em Lisboa e Sintra entre as semanas 12 a 15, mas a seguir Sintra desce na mortalidade, e Lisboa mantém ou até sobe, divergindo ainda mais da média expectável. Isto é um sinal de alarme.

Faço esta análse apenas como alerta, mais uma vez, para a necessidade de se analisar não apenas o que se anda a passar com a covid, mas com todo as funcionalidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Convinha que fossemos rapidamente para uma "nova normalidade", que deveria ser, no caso do SNS, no sentido de repor a confiança nos cuidados de saúde básicos e na confiança das pessoas para uma assistência médica segura. De contrário, continuo a temer que o SARS-CoV-2 venha a matar mais por via indirecta do que pela covid que provoca. E não épor causa dos convíveios nas praias, nos restaurantes e nas creches.


Nota: O gráfico mostra as variações semanais dos óbitos por concelho. Está indicado o mês (Jan, Fev, Mar, Abr, Mai) na semana em que tanto o dia de início como o dia do fim dessa semana se encontram no mês referido.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

DA VIDA, DA MORTE E DO VÉU QUE SE DESTAPA DA COVID


Os recentes testes serológicos em Espanha, um dos países mais afectados pela covid, começam a revelar a dimensão da pandemia. Em vez de taxas de letalidade verdadeiramente aterradoras (10%) se se considerasse o número de óbitos (27.321) em função do número de casos positivos (272.646), afinal temos taxas de letalidade de 1,1%, tendo em considerção que o número de contaminados (a esmagadora maioria assintomático) é muito superior. Em regiões muito afectadas, como a Comunidade de Madrid, uma das piores regiões, os testes serológicos estimam que cerca de 11% dos residentes foram contaminados pelo SARS-.CoV-2, pelo que a taxa de letalidade ronda os 1,2%.

Não exisetem indicadores por faixas etárias, mas tudo indica, até por testes serológicos em outros países (e.g., EUA), que a covid-19 sendo uma pandemia preocupante, particularmente para a população mais idosa (com mais de 85 anos), não é uma peste negra nem a gripe espanhola de 1918. Tem, aliás, a particularidade (feliz dentro da infelicidade) de não estar a afectar a população jovem e em idade adulta. Além disso, quer queiramos quer não, a situação está a ser mais dramática em resultado de um sucesso civilizacional e geracional: o aumento "estonteante" da esperança média de vida (para quem não sabe, no início do século XX era de apenas cerca de 40 anos na Europa), fruto da melhoria dos cuidados médicos e particularmente da redução fortíssima da mortalidade infantil.

Que devemos fazer perante estes valores? Perante isto? Ser racionais. Reconhecer que viver é um risco, tomar precauções mas sem demasiados fundamentalismos, sobretudo numa altura (a actual) em que tudo indica que a covid regrediu (não significando que possa não regressar, mas essa probabilidade não nos pode tolher os movimentos). Não podemos ter a posição definitiva de não sair à rua porque nos pode sempre cair um vasos em cima (existe sempre uma probabilidade, mesmo remota de suceder tudo), Essa opção pode até dar-nos mais anos de vida, mas não é uma forma de vida. Não é para uma criança numa creche que não pode agora brincar com os seus amiguinhos; não é para um jovem estudante que não pode beber os seus copos com os amigos (e estudar também); não é para famílias que deixam de confraternizar e ter férias; não é sequer para os vellhos para quem esta tal sorte (a distopia em que vivemos) ameaça ser pior do que a morte.

Viver de forma realizada é saber arriscar, embora com prudência. Viver de forma realizada não é certamente aceitar que nem se pode sequer colocar uma toalha numa praia deserta só porque há uma norma "cega", construída por um burocrata, que decreta que agora só é permitido "andar" por lá em passeios curtos. Viver de forma realizada seria, por exemplo, poder abraçar a minha mãe que faz 80 anos daqui a uma semana, mas que, por todo o espectro do medo que se instalou, faz com que, provavelmente, não o venha a fazer. Para quem, como eu, está imune ao medo e pânico que se foi instalando, não se se livrou, porém, do ferrete do receio. Estar constantemente sob uma espada de Dâmocles não é certamente a melhor forma de se viver.

Há decisões que temos de tomar; e as melhores não devem ser tomadas em exclusivo apenas pelos políticos, sobretudo quando, entre eles, germina essa semente do gosto pela "ordenzinha" imposta e pelo controlo das nossas vontades. Drones, torniquetes e cédulas de "pureza", por amor da Santa!, são coisas aterradoras, bem piores do que o SARS-CoV-2. Sejamos sensatos e racionais. Sigamos, por exemplo, a Suécia, onde a sensatez e a racionalidade imperaram.

Logotipo do reality Big Brother e retrato do escritor George Orwell