Hoje vamos ter duas análises. Esta parece-me bem elucidativa sobre uma pandemia pior que a covid que afectou Portugal desde Março e sobre a qual a DGS e o Ministério da Saúde disseram até agira "nada".
Pois bem, essa segunda pandemia chamar-lhe-ei Síndrome do Pânico e do Descontrolo (SINPADE), forma de expressar o excesso de mortalidade decorrente do medo da covid (que fez com que as pessoas fugissem dos hospitais em caso de doença súbita) e do descontrolo no SNS,incapaz de continuar a dar resposta adequado aos casos do quotidiano.
Para apurar os valores da SINPADE calculei, para cada quinzena deste ano, os valores médios dos óbitos diários, e confrontei com a média respectiva dos períodos homólogos de 2010-2019. Fiz a diferença para calcular o excesso de mortalidade. Para determinar a quota do excesso que se devia à covid e à SINPADE, procedi da seguinte forma: deduzi ao excesso médio diário os óbitos diários médios por covid (12 por dia na 2ª quinzena de Março; 29 na 1ª quinzena de Abril; 25 na 2ª quinzena de Abril; 13 na 1ª quinzena de Maio). O remanescente ficou por conta da SINPADE, isto é, representando o excesso de mortes que não foram causadas nem por covid nem pelas habituais afecções que sempre se verificariam (a chamada mortalidade basal).
Ora, o que vemos então? Vemos que, com excepção da 2ª quinzena de Abril, a SINPADE matou muito mais que a covid: só neste período, com 42 óbitos diários acima da média, as mortes diárias por covid (25) suplantaram as da SINPADE (17 por dia). De resto, em todas as outras quinzenas, a SINPADE contribuiu muito mais do que a covid para o excesso de óbitos diários: 36 vs. 12 na 2ª quinzena de Março; 42 vs.29 na 1ª quinzena de Abril; e 16 vs.13 na 1ª quinzena de Março.
Em termos globais, considerando o período do pandemia (2ª quinzena de Março até 1ª quinzena de Maio) tivemos um excesso de mortalidade de 2.919, sendo que 1.203 se devem à covid e, estimativas minhas, e denominação minha, 1.716 mortes se devem à SINPADE.
Muito se poderia especular (no bom sentido do termo) sobre estes valores, mas parece-me evidente que se o SNS soube dar uma resposta adequada à covid, houve falhas evidentes e graves ao longo do processo. Primeiro, na comunicação junto da população para lhe dar confiança em termos de segurança aos serviços de urgência (patentes nos números elevados na 2ª quinzena de Março e 1ª quinzena de Abril); e provavelmente também na capacidade de resposta funcional do SNS aos problemas de saúde do quotidiano. Em qualquer dos casos, mostra-se evidente que a SINPADE foi, e espero que deixe de ser, uma doença pior do que a covid.
Nota 1: As barras amarelas nas quinzenas anteriores ao surgimento da covid mostram a situação em 2020 relativamente à média e que é uma função sobretudo do maior ou menor agressividade dos surtos gripais. O surto gripal deste ano (2019-2020) estava a ser menos agressivo do que em outros anos.
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