domingo, 3 de maio de 2020

DO BALANÇO, DOS FACTOS E DO PÂNICO

Vou fazer aqui uma análise “fria” e objectiva sobre os efeitos da covid-19, enquadrados no período da Vigilância Epidemiológica que, segundo INSA, decorre desde início de Outubro até finais de Maio, mas que obviamente será encurtado para o dia 30 de Abril. Vou apresentar como se estivesse a analisar uma epidemia de há 100 anos, ou como se fosse um extra-terrestre perscrutando como os mortais terráqueos de um rectângulo de um continente chamado Europa são eliminados por surtos epidemiológicos entre meados de Outono e meados de Primavera. Esta análise, tenha essa esperança, também poderá servir de resposta às pessoas que me têm contactado (tirando as que por aqui e outros murais me têm insultado, as mais das vezes sem me lerem ou saberem ler).

A análise segue os gráficos que apresento, usando médias móveis de 5 dias (para atenuar variações bruscas diárias) da mortalidade TOTAL por grupo etário, de acordo com os dados do SICO (DGS). O período em análise é de 1 de Outubro no ano N até de Abril do ano N+1. Calculou-se a mortalidade por grupo etário para o período 2019-2020 (Outubro-Abril) e para a média dos cinco anos anteriores (2014-2015 a 2018-2019).

Tendo em consideração que calculei médias móveis, o primeiro valor a surgir é o dia 5 de Outubro; e o último é dia 30 de Abril (embora, devido à contagem, surja o 26 nos gráficos). Note-se um aspecto muito importante: os meus comentários têm em consideração que existe uma mortalidade basal (expecrável) e que as variações observadas neste período se devem fundamentalmente aos surtos gripais e, a partir de Março desde ano, ao surto da covid-19 (e efeitos adicionais).


POPULAÇÃO COM MAIS DE 85 ANOS
Identificam-se dois surtos epidemiológicos no período, sendo que o primeiro, bastante longo, é um surto gripal, iniciado em meados de Outubro, com um pico em meados de Janeiro, e que se estendeu ainda com níveis elevados até se iniciar o segundo surto. O surto gripal foi ligeiramente mais agressivo do que a média. Como sabido, o segundo surto, a codvi-19, provocou um incremento da mortalidade, com pico pronunciado no início de Abril, apresentando uma tendência decrescente a partir daí. No entanto, no final de Abril, a mortalidade neste grupo etário ainda estava acima da média. Embora seja ainda prematuro retirar conclusões, observa-se que, desde o repesctivo pico, o surto da covid-19 registou um decréscimo mais abrupto do que o ocorrido no surto gripal, em que a redução se verificou num período mais longo. Apesar de não ter atingido o mesmo nível do pico do surto gripal, para este grupo etário o surto da covid-19 terá causado uma mortalidade bastante superior, uma vez que ocorreu num período do ano em que os óbitos são já normalmente menores do que em Janeiro e Fevereiro.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): + 18,9% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): + 1,7% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: + 6,3% (em relação à média)

Conclusão: Surto gripal com “agressividade” ligeiramente acima da média. Efeito da covid evidente e muito forte.



POPULAÇÃO ENTRE 75 E 84 ANOS
Identificam, para este grupo, também dois surtos epidemiológicos, mas o primeiro (surto gripal) bastante menos agressivo do que habitualmente, causando uma mortalidade 8,7% inferior ao dos últimos cinco anos. O surto de covid atingiu o ponto mais alto em finais de Março, ligeiramente abaixo do pico do surto gripal de Janeiro, observando depois a formação de um “planalto” até meados de Abril, descendo a partir daí. Os óbitos em final de Abril ainda se encontravam ligeiramente acima da média.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): + 6,9% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): - 8,6% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: - 4,5% (em relação à média)

Conclusão: Surto gripal de baixa “agressividade”, causando mortalidade abaixo da média. Efeito da covid evidente, mas menos forte do que para a faixa etária dos maiores de 85 anos. Em termos globais, a mortalidade para este grupo etária no decurso da actual Vigilância Epidemiológica está abaixo da média.



POPULAÇÃO ENTRE 65 E 74 ANOS
O surto gripal para este grupo etário, em termos de mortalidade, foi menos evidente, embora com uma subida mais patente na segunda quinzena de Janeiro. No entanto, o surto gripal terá contribuído para um ligeiro aumento da mortalidade entre Outubro e Fevereiro relativamente à média. O surto da covid terá causado, directa e indirectamente, um novo acréscimo da mortalidade, que chegou a ser um pouco mais intenso do que para a faixa dos 75 aos 84 anos, o que pode indiciar ter existido outro tipo de afecções a contribuir para esse fenómeno.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): + 9,5% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): + 1,3% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: +3,4% (em relação à média)

Conclusão: surto gripal em linha com os anos médios. O surto de covid-19 causou um acréscimo relativo superior à da faixa etária de 65-74 anos, embora, obviamente, em menor número absoluto. Em todo o caso, a covid-19 não parece ter atingido especial virulência nesta faixa etária.




POPULAÇÃO ENTRE 55 E 64 ANOS
Não se mostra possível identificar que o surto gripal desta época tenha atingido particularmente este grupo etária, em linha com o que sucede em anos anteriores. A mortalidade entre Outubro e Fevereiro foi praticamente semelhante à média (-0,3%). O surto da covid é visível ao longo do mês de Abril, mas em termos absolutos causando, no máximo, oito óbitos amais num dia no pico. Os meses de Março e Abril registam, para este grupo etário, ligeiro aumento em relação à média (+3,8), mas nunca atingindo um número de óbitos anormalmente elevado.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): + 3,8% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): - 0,3% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: + 0,7% (em relação à média)

Conclusão: Ponderado o ligeiro decréscimo da mortalidade no surto gripal com um acréscimo de óbitos no decurso do surto de covid-19, o balanço para este grupo etário do período de Vigilância Epidemiológica está em linha com a média (apenas mais 0,7%).



POPULAÇÃO ENTRE 45 E 54 ANOS
O surto gripa, como habitualmente, não afecta com qualquer relevância este grupo etário, tendo-se mesmo assim registado entre Outubro e Fevereiro um decréscimo de 9,0% em relação à média. Nos meses de Março e Abril, em pleno surto da covid-19, a mortalidade neste grupo desceu também em relação à média (-4,9%). Em termos globais, para este grupo etário, o período temporal abrangido pela actual Vigilância Epidemiológica tem sido particularmente pouco mortífero.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): - 4,9% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): - 9,0% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: - 7,8% (em relação à média)

Conclusão: Surto gripal sem relevância. Surto de covid-9 sem relevância, o que tendo em consideração que houve uma redução significativa numa época do ano com menor mortalidade significa que o confinamento trouxe uma redução no número de óbitos para este grupo etário.



POPULAÇÃO COM MENOS DE 45 ANOS
Situação similar em tudo à análise para o grupo etário anterior, registando-se apenas maiores valores de redução da mortalidade para o período do surto gripal e da covid-19.

Variação da mortalidade no surto da covid-19 (Março-Abril): - 6,5% (em relação à média)
Variação da mortalidade no surto gripal (Outubro-Fevereiro): - 10,7% (em relação à média)
Variação da mortalidade do período da Vigilância Epidemiológica: - 9,6% (em relação à média)

Conclusão: Surto gripal sem relevância. Surto de covid-9 sem relevância.


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