sexta-feira, 31 de julho de 2020

DO RESUMO DE UMA LOUCURA

Foi para evitar a "mancha amarela" que páramos a Economia, e tivemos assim um retrocesso de 14,1% do PIB no segundo trimestre de 2020... acrescido da "mancha vermelha" (2,7 vezes maior do que a "mancha amarela"), porque também parámos os tratamentos e cuidados médicos em tudo o resto... Vamos bater palmas ao Governo e à DGS pelo bom trabalho? Ou basta comemorar com um "drink de fim-de-tarde"?


DO MORTICÍNIO DE VERÃO

O mês de Julho termina hoje. Será o primeiro mês do Verão do nosso descontentamento. A menos que haja um milagre (coisa rara de suceder, e mesmo assim, por regra, apenas em cima de azinheiras), este vai ser o primeiro mês de Julho desde que há registos (e presumo desde sempre em Portugal) sem um único dia - repito UM ÚNICO dia - com menos de 250 mortes. E o mês que conta, hélas, 27 dias (poderão ser 28, com hoje), vou repetir VINTE-E-SETE dias a ultrapassar os 300 óbitos. Nunca visto em Julho e em qualquer mês de Verão. Houve ainda três dias que chegaram às quatro centenas de óbitos.

O ano mais próximo desta desgraça foi o de 2013, com "apenas" 12 dias acima de 300 óbitos (uma onda de calor terrível de duas semanas), mas mesmo assim teve 8 dias com menos de 250 óbitos. Dos 12 anos em análise apenas estes dois, e mais 2010 (com 10), 2016 (com  8), 2012 e 2019 (ambos com 1), registaram dias com mais de 300 óbitos. 

O morticínio do Julho de 2020, com uma tenebrosa estabilidade em alta, pode ter um pequeno dedo do calor em alguns poucos dias, mas escancara sobretudo a terrível situação de fragilidade e abandono da população idosa, fruto dos continuados abandonos e suspensões dos cuidados de saúde essenciais  (73% da mortalidade em Julho foi de pessoas com mais de 75 anos).

Se esta situação se mantiver, acho que sim, que devemos usar, sim senhor, as mãos para reagir a esta "linda" actuação da DGS e do Governo (que comandam o SNS), mas não propriamente para lhes bater palmas. 


quarta-feira, 29 de julho de 2020

DA LOUCURA DA NOVA AVESTRUZ QUE EM VEZ DE ENFIAR A CABEÇA NA AREIA, A ENFIA NUMA MÁSCARA

Dizem que ontem morreram 3 pessoas por covid-19. Paz às suas almas. E também às outras 300 que se finaram de outras maleitas sem importância. 

Enquanto isto, o Governo Regional da Madeira vai obrigar o uso de máscara nas vias públicas, e temo que a "moda" venha para o Continente. Daqui a uns tempos obrigam-nos a usá-la em casa. E, enquanto isto, o mês de Julho, que termina dentro de dois dias e pouco, vai terminar ultrapassando, pela primeira vez (não vai haver milagres), a fasquia dos 10.000 mortes. A média (2009-2019) é de 8.125 óbitos. 

Não culpemos o SARS-CoV-2. A covid, neste mês, representará menos de 1,5% das mortes totais (vai agora em 146 óbitos), mas o Governo  e DGS querem-nos enfiar uma máscara, não apenas na cabeça, mas nos olhos. A impresa dá, solícita, uma ajudinha.

A mortalidade neste mês de Julho impressiona-me. É certo que houve uns dias de maior calor, mas nada que justifique termos, até agora, TODOS, repito TODOS, os santos e profanos dias do malfadado Jullho com excesso de mortalidade em relação à média, havendo nove dias em que esse excesso ultrapassou os 100 óbitos diários. Venderam-se caixões em Julho como nunca! Só o excesso não-covid na mortalidade em Julho (mês que costuma ser um dos menos letais em Portugal) será maior do que todas as mortes por covid desde Março. É assustador, e mais ainda porque nãos e ouve um pio do Governo, da DGS e da imprensa.

Vivemos, enfim, uma verdadeira loucura, Tudo para a covid, pouco ou nada para o resto. O resultado está à vista. Enquanto se está a morrer que nem tordos, o Governo quer-nos avestruzes, enfiando-nos máscaras pelos olhos dentro. Por mim, acho que nos fazem de patos. Ou de parvos.



segunda-feira, 27 de julho de 2020

DO BALANÇO DA PANDEMIA FEITA PANDEMÓNIO

Quando se fizer, verdadeiramente, sem “ideologites”, o balanço do impacte da covid e destes tempos distópicos, deve ter-se em consideração análises e reflexões como estas que se seguem:

1) A covid-19 matou, entre Março e finais de Junho, 1.579 pessoas, tendo o coronavírus sido detectado em 42.523 pessoas.

2) Em virtude das medidas de confinamento e distanciamento social, entre Março e finais de Junho de 2020, o SNS detectou menos 46% episódios de gripe e menos 66% de episódios de infecções respiratórias do que a média de 2017-2019 em período homólogo.

3) Entre Março e Junho dos anos de 2017 e de 2018 (anos com dados oficiais disponíveis), a taxa de letalidade por infecções respiratórias (mortes por estas causas por total de casos de gripes e infecções respiratórias) rondou os 1,64%.

4) Significa isso que este ano de 2020, entre Março e Junho, em virtude das medidas de confinamento e distanciamento, terão morrido cerca de 700 pessoas por infecções respiratórias "comuns" (715, na minha estimativa), ou seja, menos - repito, menos - cerca de 1.300 pessoas daquilo que seria expectável (e que ocorreriam, certamente, se não houvesse covid, porque não haveria assim confinamento nem distanciamento social).

5) Resulta assim que, em termos de balanço, por causa da covid terão morrido mais cerca de 300 pessoas do que seria expectável morrerem por infecções respiratórias entre Março e Junho de 2020. Ou seja, explicando em detalhe o raciocínio. Sem SARS-CoV-2, assume-se que teriam morrido, nestes meses, por infecções respiratórias, cerca de 2.000 pessoas (como nos outros anos). Ora, directamente pela covid morreram 1.579 pessoas , a que se tem de acrescentar mais 715 óbitos (estimativa) por outras infecções respiratórias para este ano, no período em análise, dando assim quase 2.300 óbitos. Deduzindo as tais 2.000 mortes "habituais" por infeccções respiratórias, temos então o impacte líquido da covid: 300 óbitos a mais. 

6 - Porém, temos o outro lado da “moeda”. Também pelo forte contributo das (erradas, na minha opinião) decisões políticas na luta “obsessiva” contra a covid (adiamento de cirurgias, exames, consultas, e da fuga por pânico e medo das urgências hospitalares), o excesso de mortalidade foi assustador entre Março e Junho (e piorou mais em Julho). Considerando a média de 2009-2019, o excesso de óbitos entre Março e Junho este ano é de 4.182, com um intervalo de confiança (a 95%) entre 2.311 e 6.053 óbitos), o que torna a situação particularmente trágica.

7) Em tom de conclusão: parece-me evidente que o pandemónio em redor da covid terá causado muitas mais mortes do que a própria pandemia. E o mês de Julho tem confirmado, e temo que a situação possa tornar-se mais dramática. E nem sequer estou a meter ao barulho a Economia.

Nota 1: Links de bases de dados oficiais usadas:
a) Mortalidade em Portugal (DGS) - https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiOGRhNjdjYzgtOGZmNy00NDZjLWI1YTctNWQyNzRiMDg3NzJiIiwidCI6IjQyOTc3ZjkwLWE1NjItNDk1OS04ZjJjLTE4NDE2NjI1Zjc2NiIsImMiOjh9&mnredir=1&lnc=6047AAAAAAAAAAAAAAAAAAAA

b) SICO (DGS) - https://evm.min-saude.pt/#shiny-tab-q_total

c) Monitorização da gripe e outras doenças infecciosas (DGS) - https://www.sns.gov.pt/monitorizacao-do-sns/servicos-de-urgencia/caracterizacao-urgencias/?fbclid=IwAR22DhJxh8R42-krtfppvYBVRJ9gtD57udtBOl2O8tLww2d18TME7rvoCNk

Nota 2: A mortalidade por infecções respiratórias para os anos de 2017 e 2018 são oficiais; para os anos de 2019 e 2020 são estimativas com base com base na taxa de letalidade média para os anos de 2017 e 2018 (1,64%). Foram calculados, para os anos de 2017 e 2018, as taxas de letalidade mensais (Março a Junho) que variam entre 1,49% e 1,84% em 2017, e entre 1,48% e 1,78% em 2018.



domingo, 26 de julho de 2020

DO DEVE E DO HAVER

Estive uns bons pares de horas a analisar o impacte das medidas de confinamento e distanciamento social na redução dos episódios de gripe e infecções respiratórias desde Março, comparando depois com anos anteriores, e fazendo estimativas das "vidas salvas" em função das taxas de letalidade das infecções respiratórias (que ronda os 1,6%, com base nas mortes por infecções respiratórias no período em análise em relação aos episódios de gripes e infecções respiratórias no período). Isto parece-me fundamental para colocar a pandemia numa outra perspectiva, e sobretudo tentar compreender o que se passa com o excesso de mortalidade que se anda a observar.

Bem sei que uma análise deste género deveria ser feita com mais dados actualzados dos óbitos deste ano (a DGS até os tem, mas enfim, só daqui a uns dois anos os divulgará), mas esta estimativa que fiz entretanto serve sobretudo para mostrar que se a covid, com todas as medidas profilácticas, talvez tenha matado apenas tantas pessoas como aquelas que morreriam por "inofensivas" gripes, pneumonias e bronquites bacterianas e virais sem quaisquer medidas profilácticas especiais (que é o que se geralmente sucede em anos anteriores)

Amanhã apresento os dados com mais detalhe, que agora se faz já tarde.

Apenas uma pista: as infecções respiratórias entre Março e Junho deste ano foram apenas 32% das que se contabilizaram, no mesmo período, em 2018.


sábado, 25 de julho de 2020

DA IGNORADA PANDEMIA CHAMADA VERÃO DE 2020, JÁ PIOR DO QUE A COVID

Os números são aquilo que são. O Verão começou a 20 de Junho e estão aí os resultados de meses de suspensão de cuidados médicos básicos, à conta de "tudo para a covid", de uns dias de maior calor. Contas feitas, e usando dados oficiais da DGS, o excesso de mortes no Verão de 2020 (em apenas 35 dias) já terá ultrapassado o número de mortes pelo SARS-CoV-2 em quarto meses (desde 16 de Março)! .

Não é uma opinião. É um facto. Considerando o período 20Jun-24Jul, o excesso de mortes (acima da média de 2009-2019) é já de 1.970 óbitos (já deduzidas as 188 mortes por covid nesse período). As mortes totais por covid, desde Março, é de 1716.

(no gráfico apresento o intervalo de confiança a 95%. Ou seja, esse excesso estará a variar entre 1.318 e 2.623 óbitos).

E ainda só agora terminámos o primeiro mês de Verão.

Sobre isto, a nossa imprensa de referência (tv, jornais e rádios, quase em geral), NANJA. Parabéns à DGS e ao Governo por terem conseguido amestrar quase generalidade da comunicação social sem sequer gastar lápis azuis. E de conseguirem uma população tão obsessivamente medrosa e acéfala de raciocínio. É obra!


DO TUDO VAI BEM NA REPÚBLICA SEM NÚMEROS

Já são 13 os dias consecutivos de mortalidade total em Portugal durante o período de Verão sempre acima de 300 óbitos. Não são 20 seguidos porque no dia 11 de Julho “só” morreram 297 pessoas, interrompendo assim uma série catastrófica. A média de óbitos em Julho no período 2009-2019 é de apenas 264. O pior ano a seguir ao actual é o de 2013 com 10 dias acima de 300 óbitos (houve então uma onda de calor de quase três semanas, com alguns dias acima de 40 graus mesmo no Centro e Norte). A covid, entretanto, tem estado a matar menos de seis pessoas por dia. Mas como somos um país pouco dado a matemáticas, só se fala de covid.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

DAS SUBTILEZAS DA NOSSA IMPRENSA PARA ALIMENTAR O MEDO

O Público continua em "grande" na sua campanha de agudização do pânico. Agora até se aproveita de artigos da Reuters e traduz o título para português dando-lhe tons alarmistas. Neste caso em concreto, o título é "Nos EUA, a covid-19 mata diabéticos a um ritmo alarmante".

Lê-se o texto, escrito por jornalistas da Reuter, e fica a saber-se, entre outras coisas, que «manter a diabetes sob controlo [nos Estados Unidos] — uma das melhores defesas contra a covid-19 — tornou-se difícil, já que a pandemia interrompeu os cuidados médicos, os exercícios e rotinas alimentares saudáveis.» (sic).

'Pera aí! Então afinal, o que mata não é a covid! É ter covid e não ter tratamento adequado para a diabetes! Quer dizer: deduz-se que se houvesse tratamento adequado para a diabetes em tempos de pandemia, os diabéticos não morreriam tanto de covid se a tiverem. Certo? Ou seja, a culpa não é propriamente do SARS-CoV-2. É da diabetes e é de não se dar um tratamento e condições adequados aos diabéticos. Certo? Ent-ao, sendo assim, que raio de título é aquele?

Fui ainda pesquisar como estava titulada a mesma notícia em versões inglesas. Pois bem, está assim: "Why COVID-19 is killing U.S. diabetes patients at alarming rates". Pois, é uma coisa completamente diferente e que reflecte o conteúdo. Lá fora faz-se jornalismo sem se ser alarmista. Os jornalistas remetem-se ao seu papel de... jornalistas.

Enfim, o Público parece ser um case-study sobre como se aniquila a crediblidade de 30 anos com uma pandemia.



DO CALOR QUE DESGRAÇA AINDA MAIS UMA DESGRAÇA

Hoje tenho um gráfico um pouco mais complexo de análise (embora simplificado), mas que mostra bem a nossa triste realidade. Este pode vir a ser "o Verão do nosso descontentamento"

Como alguns talvez saibam, os nossos serviços de Meteorologia (IPMA) têm um modelo que calcula (como previsão) o Índice Ícaro, que permite saber se será expectável, nos dias seguintes, um excesso de óbitos por causa do calor.

Desde o dia 5 de Julho, este indicador (barras amarelas) tem estado positivo (e em alguns dias com valor algo elevado), o que fez disparar as mortes (parece que os avisos para a DGS servem de pouco). Porém, aquilo que uma análise mais detalhada mostra, conforme se visualiza no gráfico, é um persistente excesso de mortalidade desde início de Maio, e com variações ainda mais para cima, de forma exacerbada, quando o Índice Ícaro fica positivo mesmo em valores pequenos, como no final de Maio (área a rosa indica as variações diárias, sendo que valores acima de 0 significam excesso de óbitos em relação à média; a linha vermelha é a média móvel de 5 dias para o ano de 2020).

Mesmo quando se usam intervalos de confiança (não coloco aqui os gráficos, porque ficaria de difícil leitura; poderei colocar em comentário se assim desejarem), continua a ser bastante visível um grande excesso de mortalidade no período.

O EXCESSO de mortalidade total desde 1 de Maio até 23 de Julho é de 3.538 óbitos (com intervalo de confiança, a 95%, entre 2.219 e 4.857 óbitos). A covid é apenas responsável por 705 mortes neste período.

Analisando tudo o que se tem passado, e reflectindo sobre o que tenho escrito, considero que a grande fragilidade física e emocional, sobretudo dos mais idosos, e decorrente de um mau planeamento da assitência médica na obsessiva luta contra a covid, está a contribuir para um exacerbamento da mortalidade em tempo quente, O sol apenas é assim a última gota que faz transbordar o copo de muitos... até à tumba.


quinta-feira, 23 de julho de 2020

DO INSUSTENTÁVEL SILÊNCIO

Por agora, até ao dia 22, o acréscimo de óbitos totais em Julho de 2020 é de 28,4% (acima da média). Para os idosos com mais de 85 anos, as mortes estão 48,9% acima da média. Um lindo serviço!

Eis aqui os resultados que conseguimos com lockdowns, confinamentos, adiamentos de consultas e cirurgias, e ausência completa de investimento no SNS e de planeamento estratégico para preparar cuidados de saúde no Verão

Os contributos diários da covid-19 para a morte dos idosos em Julho são aquelas barrinhas azuis. As barras vermelhas são tudo o resto. As quantidades diárias acima da linha amarela (média) representam os idosos que não era suposto terem já morrido, mas morreram, e não de covid. São já uns bons centos. Na verdade, são 985 pessoas. Bom, que sejam: são estatísticas esquecidas para a DGS, porque nem sequer morreram de covid. Certo?


DA FÁBRICA DE FAZER MORTOS

Bem sei: aqui vai mais um sermão aos peixes. Mais um post que irritará uns quantos. Mais uma minha perplexidade nestes tempos distópicos. Mas segue.

Ora, tenho para mim, que os hospitais são locais para salvar vidas; não apenas para registar últimos suspiros. Tenho também para mim que nos hospitais existem várias funções: médicos, enfermeiros e outro pessoal fundamental para a gestão da saúde individual e pública. Os dois primeiros grupos devem (e sabem fazê-lo) salvar vidas. Não se lhes peça mais O outro vasto grupo deve fazer funcionar a «máquina», o que também salva vidas, ou as deixar morrer prematuramente se houver desleixo.

Tenho para mim, continuando, que neste último vasto grupo deveria haver pelo menos uma "alminha" que monitorizasse o que se anda a passar quotidiamente no conjunto dos hospitais. É tarefa que não é complicada, porque felizmente até existe moderna monitorização (e Portugal está na vanguarda). Porém, a tecnologia não é tudo. Tem de ser usada, olhada e depois tem de existir acção. Ou seja, eu gostava que houvesse uma "alminha" que olhasse para os números; ou então que um qualquer informático lhe pusesse uma buzina na orelha para o alertar em situações anómalas.

Tudo isto para dizer que não consigo, sinceramente, compreender como é possível que a DGS, o SNS ou alguém dos raio que nos parta não veja que desde a última semana de Junho esteja a ocorrer um incremento absurdamente elevado de mortes em unidades hospitalares, que atingiu, até agora o ponto mais alto em 20 de Julho, e nada se diz, nada se faz, nada. Tudo na paz do Senhor. Como se, na verdade, não estivessemos a viver uma siruação completamente anormal, e que não tem a ver com a covid. Uma situação de calamidade que, na verdade, está a ser pior do que a registada no pico da covid em Março-eAbril.

Não, não estou, infelizmente, a exagerar. Vejam o gráfico: em Julho, nas unidades de saúde devia estar a registar-se menos de 170 óbitos diários. Já ultrapassámos os 230, acima mesmo dos valores do pico da covid, e a cois começou a ser detectável ainda em Junho. Estamos hoje, em Julho, senhores!, com níveis de mortalidade em unidades de saúde que são típicas de Janeiro, o que é tudo menos normal.E não: não é por causa da covid.

Digam-me: o que anda a suceder nos hospitais? Colapsaram? Levam para lá agora apenas os moribundos, as pessoas que estão nas últimas? Os hospitais servem apenas agora para registar mortes? E ninguém acha isto estranho? Ninguém investiga? Todos acham a coisa "normal", não o sendo?


quarta-feira, 22 de julho de 2020

DA "ARTE" DE SE VENDER MAIS 71 CAIXÕES POR DIA EM JULHO SEM PEDIR "AJUDA" À COVID

Estamos a viver, neste mês de Julho, uma crise sanitária sem precedentes, enquanto Governo, DGS, imprensa e gente que se preocupa com a covid-19 se estão perfeitamente borrifando. Dá raiva, porque andámos a tentar salvar pessoas que, se foram salvas em Abril, estão agora a morrer em catadupa.

Fiz um breve exercício, mais um, na já muito vã esperança de alertar consciências. Comparei os óbitos dos primeiros 20 dias de Abril (pico da pandemia; nesse período morrreram 598 pessoas de covid) com os primeitos 20 dias de Julho. Em princípio, comparar estes meses não teria muita lógica: em média por dia, em Abril morrem 295 pessoas (período 2009-2019) e em Julho apenas 263  (idem).

Este ano, porém, por causa da pandemia, acrescida do excesso de óbitos, entre 1 e 20 de Abril morreram 7.570 pessoas (363 por dia), havendo assim um excesso de 1.406 óbitos no período, dos quais 598 foram por covid-19, donde 808 terão sido por outras afecções.

Ora, e o que está a suceder em Julho? Uma hecatombe! Nos primeiros 20 dias, a mortalidade atingiu já 6.689 óbitos, uma quantidade absolutamente anormal, que apenas encontra algum paralelo com 2013 (que teve uma intensa onda de calor de duas semanas). Mesmo assim, 2020 está já bem acima desse ano. A média para Julho de 2020 está nos 334 óbitos por dia, quando a média (2009-2019) é de 263. Ou seja, mais 71 caixões por dia!

Tendo em conta isso, o excesso de mortalidade de Julho, em apenas 20 dias, é já de 1.501 óbitos (portanto, já superior a Abril, no pico da pandemia da covid). Como em Julho apenas morreram 118 pessoas por covid, então temos um excesso não-covid de 1.382 óbitos, o que compara com os 808 óbitos em Abril para o mesmo período de tempo (20 dias).

Não sei o que escrever mais para acordar consciências.


terça-feira, 21 de julho de 2020

DO MEU INFELIZ ACERTO

No dia 12 de Julho, portanto, há 9 dias, escrevi um post intitulado "Da crónica das (muitas) mortes anunciadas" (vd. imagem em baixo), em que me manifestava "verdadeiramente 'apavorado' com aquilo que se avizinha[va] nos próximos dias", face então padrão da mortalidade total dos maiores de 85 anos e aos dias de calor que se anunciavam. Previa uma "hecatombe nos idosos".

Bem sei que, no FB, se costuma mandar muitas "bocas", mas, por regra, quando faço análises sérias sobre a covid, não costumo brincar. Também sei que sou acusado, por muitos, de obscura agenda política, de estar contra o SNS (já devo ter perdido uma boa mão-cheia de amigos, alguns verdadeiros) e de andar "armado" em sapateiro a querer tocar rabecão, porque nenhuma formação tenho de epidemiologia ou medicina.

Que seja! Apenas vos acrescento então agora a situação real, referente até ao dia 20 de Julho (ontem). Comparem os dois gráficos: se no dia 10 a média móvel rondava os 140; agora ultrapassou os 170 óbitos. Para esta época do ano é expectável a morte de cerca de 100 pessoas com mais de 85 anos, A diferença entre as duas linhas (vermelha e amarela) em cada dia deve ser multiplicada pelos 10 dias que medeiam entre 10 e 20 de Julho. São o excesso de óbitos, aqueles que podiam ter sido evitados com medidas de assistência adequadas. Sãomuitas vidas, daquelas que se quis salvar com o "lockdown". Depois, tirem as vossas conclusões. Tudo o que aconteceu era previsível. O braço das políticas públicas da saúde, i.e., o SNS (Governo+DGS), entretanto, nada fez. E parece que ninguém leva a mal. Excepto os que morreram. Mas esses já não se queixam.



DA CURA QUE MATARÁ MAIS QUE A DOENÇA?

No Reino Unido, um estudo do Governo britânico, agora revelado, aponta para a possibilidade de ocorrer um acréscimo-extra de 200.000 mortes por efeito do "lockdown". Vai haver de tudo: aumento de mortes prematuras por cancro, ataques cardíacos, suicídios, violência doméstica, etc., etc.. Até agora, a covid matou no Reino Unido 45.312 pessoas. E eu acho que nós, aqui em Portugal, já estamos a sentir esse triste caminho.  A notícia completa, que saiu ontem, pode ser lida aqui: https://www.theweek.co.uk/107564/could-more-people-die-from-lockdown-than-from-coronavirus


segunda-feira, 20 de julho de 2020

DOS TIROS AO LADO (E NOS PÉS) DA NOSSA IMPRENSA

No dia 18 de Julho, anteontem, morreram 193 idosos com mais de 85 anos. Por covid-19 terão morrido quatro, no máximo (os dados da DGS indicam este número para os maiores de 80 anos).

Ora, nesta altura do ano seria expectável morrerem 100 idosos nesta faixa etária. Estão a morrer a este nível tenebroso perante a incapacidade do SNS de os atender e de suprir as carências num período de temperaturas elevadas mas que nem sequer atingem a onda de calor... Foram, meus senhores e minhas senhoras, mais cerca de 90 mortes a mais num SÓ dia!

E o que faz entretanto, por exemplo, o Público? Ora, uma "mui" oportuna reportagem intitulada: "Como ajudar agora os animais de Santo Tirso?"


DAS LARGAS COSTAS DA COVID

Contabilizando os primeiros 19 dias do mês de Julho, o ano de 2020 já é o mais mortífero, mesmo mais do que o de 2013 que incluiu uma das mais terríveis e duradouras ondas de calor (matou 1.700 pessoas). A covid foi apenas responsável por 112 das 6.254 óbitos registados neste período, ou seja, 1,8% do total.

Conforme mostra o gráfico, seria expectável, para este período, a ocorrência de apenas 5.006 mortes, com um intervalo de confiança (a 95%) entre 4.709 e 5.303 óbitos.

Se se comparar, por exemplo, com 2019, registaram-se este ano, apenas em 19 dias, mais 1.142 mortos. Descontando a covid, são mais de 1.000 mortes a mais. A covid, contudo, fica com os "louros" todos, segundo a DGS, o Governo e para quem acredita que a pandemia deve ser a única coisa a ser priorizada em termos de Saúde Pública.



domingo, 19 de julho de 2020

DO DRAMA DOS VELHINHOS QUE PODEM MORRER DESAMPARADOS DE TUDO MENOS DE COVID

A covid é e foi perigosa para os mais idosos. Mas, por amor dos vossos pais e avós, ou de vós mesmos: o SARS-CoV-2 não está, neste mês de Julho, a ser o principal perigo de vida para os mais idosos. 

Pode-se continuar a meter a cabeça na areia, mas o gráfico que vos ofereço agora, desta vez incidindo na faixa etária dos mais idosos, mostra duas coisas:

a) a covid nunca explicou todo o excesso de mortalidade registada mesmo em Março e Abril neste grupo etário;

b) em meados de Junho a situação da covid-19, como causa de morte neste grupo etário, esteve praticamente controlada. Porém, descontrolou-se com os novos casos em lares (e.g. Reguengos de Monsaraz e Loures). No entanto, a subida da mortalidade foi bastante pequena (quatro óbitos diários para o grupo dos 80 anos).

c) quando as temperaturas aumentam bastante, como foi em finais de Maio e agora especialmente em Julho, a mortalidade dispara neste grupo etário de forma abrupta e tenebrosa. Parece-me ser isto um sinal de grande fragilidade e vulnerabilidade da população idosa depois de tantos "confinamentos" e suspensões de assistência médica desde Março.

Conclusão: amanhã, prevejo, será mais um infeliz e trágico dia de "matadouro". E vai durar, para já, pelo menos até 4ªfeira.


Nota: Os dados da mortalidade por covid referem-se aos maiores de 80 anos (a DGS não indica para os maiores de 85 anos), pelo que o peso da covid neste grupo etário até surge inflacionado. Usaram-se as fontes oficiais indicadas no meu post desta tarde para os grupos etários a partir de 2014 (dados mais antigos).


DO RAIO-X À NOSSA DESGRAÇA EM UMA ÚNICA IMAGEM

Costuma-se dzer que uma imagem vale por mil palavras. 

O gráfico que vos apresento é essa "imagem", neste caso aquela que melhor consegui até agora (julgo) para transmitir estes tempos distópicos que vivemos sob a batuta da covid. 

O gráfico que vos apresento é essa "imagem", neste caso aquela que melhor consegui até agora (julgo) para transmitir estes tempos distópicos que vivemos sob a batuta da covid. O SARS-CoV-2 é, efectivamente, perigoso e letal (sobretudo para os mais idosos), mas a gestão política (e técnica) da pandemia tem sido mais mortífera. Infelizmente, na minha opinião, alicerçada por factos, as opções de política de saúde (health policy, não confundir, portanto, com questões político-ideológicas), incluindo decisões, inacções e omissões, estão a ajudar a levar à tumba mais pessoas do que a covid-19.

Ora, mas que mostra o gráfico? Mostra, ao longo dos meses de 2020 e até ontem, a evolução do excesso de óbitos (e em dois pequenos períodos, em Janeiro e Fevereiro, uma redução favorável, devido a rápido desaparecimento do habitual surto gripal deste ano) em relação à média (mortalidade expectável), calculada para o período 2009-2019.

Parece-me ser de fácil interpretação, mas dou-vos a minha:

a) estamos em Julho, agora mesmo, no presente, a viver a crise de mortalidade de mortalidade mais grave deste ano, pavorosa mesmo, que é bem superior ao pico da pandemia em Abril. O excesso de mortalidade chegou ontem aos 105 óbitos (em Abril, o pico rondou os 80, sendo que cerca de 30 óbitos eram de covid; agora a média de óbitos por covid é de apenas 4!), "ajudado" pelo tempo quente (que eu já avisara há dias poder vir a provocar mortalidade elevada, devido sobretudo à maior fragilidade da população vulnerável e à pouca relevância que o SNS sempre botou a estes eventos meteorológicos; notem porém que nem sequer estamos ainda em fase de onda de calor do ponto de vista meteorológico, estando as temperaturas da última semana muito aquém da situação vivida em Julho de 2013 e Agosto de 2018).

b) a subida recente do excesso de mortalidade tem uma inclinação pavorosa, fruto de sete dias contínuos de mortalidade bem acima dos 300 óbitos. A média móvel de cinco dias tem sido largamente superior a 300 óbitos há 11 dias consecutivos (a média no período 2009-2019 varia entre os 260 e 270 óbitos por dia). Ontem, dia 18, fixou-se nos 364 óbitos. 

c) O impacte directo do SARS-CoV-2 (através da mortalidade por covid-19) foi importante na segunda quinzena e relevante em Abril), mas nunca conseguiu "explicar "o excesso de mortalidade que se "instarou" em Portugal desde Março. Têm sido colocadas hipóteses (a evidente fuga das urgências, com efeitos adversos na ocorrência de doenças súbitas fatais), mas parece-me existirem já factores “estruturais”: em finais de Maio (vejam o pico de excesso, que atingiu cerca de 60 óbitos) já tinha havido uma pequena onda de calor, denunciando uma grande vulnerabilidade na população mais idosa (sempre a mais vulnerável). Escrevi sobre isso na altura. Agora, essa vulnerabilidade espraia-se em todo o seu horror. E o pior ainda pode suceder.

d) por fim, o Governo e o SNS andam supostamente preocupados com um novo surto de covid-19 no Inverno. Podem e devem pensar nisso, mas temo que, se tivermos temperaturas acima de 35 graus durante muitos dias seguidos neste Verão, vamos assistir, muito antes disso, a uma hecatombe jamais vista em Portugal. Tudo por causa do medo, da ânsia, do desacompanhamento físico e emocional dos mais idosos e vulneráveis, do adiamento de consultas, diagnósticos, exames e cirurgias, do tempo quente, e sobretudo por causa de um SNS e de um Governo incapazes de ver a política sanitária sem as deturpadas “lentes da covid”. No fim, culparão eles, o SARS-CoV-2, que pode ser microscópico mas tem as costas largas. Podem sair ilibados; mas as mortes, essas, as desnecessárias, as excessivas, essas ninguém as vai “lavar”.

Nota 1: Para a elaboração dos gráficos usaram-se os dados do SICO da DGS (https://evm.min-saude.pt/#shiny-tab-a_total), os dados dos boletins diários da DGS (desde Março até hoje, vd. aqui: https://covid19.min-saude.pt/relatorio-de-situacao/). Para atenuar variações bruscas diárias utilizou-se a média móvel de cinco dias tanto para a mortalidade total diária de 2020 como para a média (2009-2019) e também para a mortalidade por covid-19. O excesso (ou redução favorável) foi calculado diariamente, subtraindo o valor de 2020 à média do período 2009-2019. Note-se que este exercício deve ser visto sobretudo como indicador de variação na evolução da mortalidade ao longo de 2020. Sendo certo que não se usaram intervalos de confiança (que poderiam atenuar ou agravar a evolução, dependendo de se olhar para o limite superior ou inferior do intervalo), também não se considerou (por não ter acesso aos dados) a redução da mortalidade por outras doenças infecciosas do foro respiratório (observou-se sim uma forte redução de episódios deste tipo de doenças, como pneumonias e bronquites, desde Março, em virtude do distanciamento social, o que terá causado uma redução da mortalidade por esta via).


sexta-feira, 17 de julho de 2020

DO SOL VS. SARS-COV-2: HISTÓRIA DE UMA TRISTE ABADA

Vamos a contas: em três dias (14, 15 e 16 de Julho), o imprevisível e desconhecido SARS-CoV-2 matou 14 pessoas; o conhecido e previsível Sol terá matado 304 pessoas (com um intervalo de confiança, a 95%, entre 275 óbitos e 333 óbitos).

Significa assim que a covid-19 terá sido responsável por 1,3% das mortes nestes três dias; as afecções associadas ao tempo quente (ainda nem é uma onda de calor) contribuíram com 28,3% dos óbitos, e as restantes causas com 70,4%. Resumo: o tempo quente, para quem a DGS aconselha água e fresco, matou, em apenas três dias, 21 vezes mais pessoas do que a covid no mesmo período. Eu avisei há dias que a "coisa" (tempo quente) não seria meiga.

Não consta que a DGS tenha feito nenhum balanço sobre esta matéria nem dito o que fez para atenuar os efeitos.


DO ESTADO DE SÍTIO

Hoje, tópicos telegráficos e uma pergunta final:

a) na primeira quinzena de Julho de 2020, morreram 2.034 idosos com mais de 85 anos.

b) durante este período, morrreram 65 idosos com mais de 80 anos por covid-19

c) mesmo assumindo que todos tinham mais de 85 anos, significa que a covid foi a causa, neste período,de 3,2% do total

c) a média de óbitos deste grupo etário no período 2014-2019 foi de 1.481 óbitos.

d) o total de óbitos deste grupo etário em 2020, excluindo a covid, foi de 33,0% em relação à média, e de

d) o número mínimo de óbitos neste período foi de 1969.

e) excluindo a covid, o acréscimo de óbitos totais em 2020, neste período, foi de 20,3% em relação ao segundo ano mais mortífero no período em análise (2019).

Pergunta: a covid-19 está a ser, neste momento, o maior problema de saúde (de vida e de morte) para os mais idosos?


quinta-feira, 16 de julho de 2020

O AÇOUGUE DE VELHOS, DE SEU NOME PORTUGAL

Desculpem-me o título; não é desrespeito, é irritação. Diziam-nos que ia tudo e iam todos ficar bem. Que o sacrifício valia a pena. Pois sim. Muitos dos idosos que acreditaram que as suas vidas eram importantes, já se finaram. Não de covid, mas de outras "coisas" que deixaram de ter importância para o SNS.

Isto agora acho que só vai com "bonecos", mesmo se fruto de análises.O gráfico mostra a mortalidade diária dos maiores de 85 anos deste mês de Julho,separando as mortes por "coisas" que já não interessam das mortes por covid. Notem que as mortes diárias por covid até estarão exageradas, porque a DGS faz o favor de usar grupos etários diferentes no SICO e nos boletins da covid (para confundir). Observem o " peso" da covid, mas sobretudo comparem as barras (com as duas cores) e a linha (que marca a média para cada dia no período 2009-2019). Era expectável morrerem cerca de 100 idosos por dia; vejam onde a coisa anda. O excesso de mortes é de quê? Não se sabe. É de "coisas" que agora não interessam, dirá a DGS e o Governo, e muitos que parecem ver a covid como a única doença que nos torna mortais.

Portanto, continuemos, candidamente, a tratar da covid, e a deixar tudo o resto destroçar-se: o SNS, a Saúde Pública, a Economia, as nossas vidas. E não culpem o SARS-CoV-2, que esse está a borrifar-se.


DAS PRIORIDADES

No dia 14 de Julho morreram 8 pessoas por covid-19. E morreram também 386 pessoas por outras doenças... Muito bem, digníssimos especialistas, suas sumidades da DGS e excelentíssimos membros do Governo, continuem a discutir a colocação de máscaras em crianças de seis anos. Está tudo bem com o resto.. Ah, e está também um calor de ananases, não é? Pois, se calhar vai matar mais do que um mês de covid. É pena, não é?


quarta-feira, 15 de julho de 2020

DA COVID QUE NOS CONSOME

Este gráfico deveria servir de reflexão, embora não tenha grandes esperanças de que tal suceda. Recorri ao dados da Mortalidade em Portugal (vd. link em baixo), considerando os óbitos por doenças infecciosas do foro respiratório (de acordo com os códigos do International Classification Diseases) para os meses de Março a Junho dos anos de 2014-2018 (não estão disponíveis os dados de 2019 e deste ano, infelizmente), e confrontei com os óbitos da covid-19. E não, não pretendo ser negacionista da gravidade da covid para os mais idodos. Mas este simples exercício, que deveria ser feito com maior rigor por investigadores da área da medicina, e com dados deste ano, deveria fazer-nos pensar em três coisas:

a) comparando com as habituais doenças infecto-contagiosas (gripes, pneumonias e bronquites de origem viral ou bacteriana), a covid-19 nunca atingiu em Portugal um cenário catastrófico. Mostra mesmo uma clara tendência descrescente, de sorte que se mostra menos mortífera do que as outras doenças infecciosas do foro respiratório em período homólogo (a única excepção foi Abril).

b) como aqui já referi hoje, com competente (e oficial) gráfico, a quantidade de infecções do foro respiratório tiveram uma descida abrupta desde Março, à boleia do confinamento e do distanciamento social por causa da covid-19. Significa isto que, provavelmente, os óbitos por essas doenças (gripes, pneumonias e bronquites), que atingiam números muito relevantes mesmo em Maio e Junho( terão tido uma descida também muito significativa neste ano de 2020 (a DGS tem dados para saber isso; convinha divulgá-los).

c) Porém, apesar dessa "poupança" de vidas, e do número já não muito relevante de mortes por covid-19, a mortalidade total está muito, muito acima da média. Ou seja, estamos a pagar bem caro a pandemia: não por causa da doença em si mas como como o Governo e DGS andam a gerir o nosso Sistema Nacional de Saúde. O desastre em termos de Saúde Pública, acreditem, já não está no SARS-CoV-2.


DO ENIGMA DO AUMENTO DAS MORTES EM BONS ARES

Desde que há registos automáticos (a partir de 2016), nunca houve tão poucas doenças respiratórias na Primavera e Verão, fruto do distanciamento social imposto pelo SARS-CoV.

Analisando os dados da Monitorização da Gripe e de Outras Infecções Respiratórias da DGS, desde Março deste ano registou-se uma queda acentuadíssima deste tipo de afecções, o que levou, obviamente, a menor quantidade de internamentos e, claro, de mortes. Vejam o primeiro gráfico que apresenta a variação ao longo dos meses, tanto nas gripes como em outras infecções respiratórias. Não é, aliás, surpresa para ninguém que o Inverno tem os valores máximos (tanto para a gripe como para as outras afecções), mas na Primavera e no Verão essas doenças não desaparecem nunca de todo (mesmo a gripe).

Porém, o mais surpeendente é que, apesar de tudo isto, está a morrer-se muito mais. Apenas a título de exemplo, no dia 14 de Julho de 2019 (ou seja, fez ontem um ano) registaram-se 39 episódios de gripe, 977 episódios de outras infecções respiratórias e, globalmente, morreram 254 pessoas.

Ontem, ano da desgraça de 2020, apesar de se registarem apenas 10 episódios gripais (-75% em relação a 2019) e somente 235 episódios de outras infecções respiratórias (-76% em relação a 2019), conforme podem ver no segundo gráfico, acabaram por morrer 378 pessoas (valores provisórios).

Significa isto que, mesmo com a covid-19, estão a ocorrer muito menos infecções respiratórias (que é uma das principais causas de morte), mas anda-se a morrer muito mais. Muito mais mesmo. Especulo assim, e permitam-se a ironia negra, para esconder a irritação: como o SNS não anda a dar conta do recado para as outras doenças, consolemo-nos pelo menos com o facto de o último fólego de muitas das vítimas deste abandono, que morrem de mil e outras coisas, algumas evitáveis, ser feito a plenos pulmões, bem sadios.



terça-feira, 14 de julho de 2020

DO MERCANTILISMO DO MEDO ou DO MEU ESTADO DE IRRITAÇÃO PERANTE O ESTADO DO VALE TUDO PARA MANTER O PÂNICO

A sério: algum do jornalismo do Público (e falo do Público, porque sou leitor e assinante) começa a irritar-me solenemente. Um denominado "Depoimento Coronavírus", que relata longamente o «calvário» de um homem de 36 anos (jovem, lá está!), que esteve 20 dias nos cuidados intensivos por causa do covid-19, é um must do "novíssimo pânico-jornalismo"...

Eis o jornalismo que toma uma andorinha por uma revoada; um jovem por toda a população jovem. Generaliza-se assim o medo da morte para que não se possa viver sem pensar na morte. Faz-me lembrar a Igreja até finais do século XVIII: os padres falavam insistentemente na morte para incutir o medo; e assim fazer com que os crentes pagassem (missas e outras oferendas) pela salvação após a morte. Era (e agora é) o mercantilismo do medo.

Vamos lá a ser sérios: um jornal como o Público, que tem e teve tão bons jornalistas de investigação ao longo dos seus 30 anos, tem obrigação de dar aos leitores muito mais. Eu já me contentava, no caso em apreço, que o Público me dissesse (como leitor) qual a percentagem de casos positivos de pessoas com menos de 40 anos que chega aos cuidados intensivos... Só assim se pode aquilatar se estamos perante um caso sério... E digo-vos, o Público tem meios para conseguir saber isso e muito mais, mas infelizmente parece uma caixa de ressonância da informação oficial. Lamento dizer isto, mas é aquilo que sinto. Não há na informação do Público sobre a covid-19, nos últimops meses, um desvio sequer à informação oficial. Não há uma análise para além do que é facultado pela DGS. Népia. Nanja.

Para já, a única coisa que podemos saber, e não é pelo Público (sou eu que pego nos relatórios da DGS e ponho-me a fazer cálculos), é que a taxa de letalidade para os menores de 40 anos é de apenas 0,027% (cinco óbitos em 18.308 casos positivos). Se considerarmos as pessoas dessa faixa etária que morreram desde Março, a covid-19 é culpada por apenas 0,5% do total. Ah, já agora, cinco mortes de pessoas com menos de 40 anos significa 0,000117% da população portuguesa nesta faixa etária. Não me parece coisa de pandemia. Acho que suicídios de pessoas com menos de 40 anos terão sido mais do que isso. De acidentes rodoviários, idem.

Ah, e não me posso esquecer de um pormenor do «Depoimento Coronavírus». O depoente diz o seguinte, a muitas páginas tantas: «Perdi 15 quilogramas. Mudei um pouco a minha alimentação, porque ainda tenho de perder peso.». Se calhar, o pior perigo para a sua vida não foi o SARS-CoV-2; foi o excesso de peso.


DA TEMPESTADE PERFEITA PARA O DESASTRE

Temos hoje, por mil e uma razões, uma população martirizada, sobretudo a mais idosa, pela ânsia e pela carência de assistência de cuidados médicos, por via do adiamento de consultas, diagnósticos e cirurgias do nosso SNS (por opção política). A gestão da covid-19, temo, pode estar, neste Verão, a criar a tempestade perfeita para uma calamidade pública.

Fiz um mero exercício, que mostro no gráfico em baixo, que reflecte a evolução da mortalidade na onda de calor de 2013, entre 23 de Junho e 14 de Julho (barras vermelhas), que causou uma subida inusitada nos óbitos, sobretudo entre os dia 6 e 11 de Julho, quando as temperaturas superaram os 40 graus em grande parte do território. O pico ocorreu em 8 de Julho, com 498 óbitos, sensivelmente o dobro das mortes do que é expectável num dia normal de Verão (linha amarela). Meses mais tarde, a DGS estimaria que esta onda de calor causou um excesso de 1684 óbitos, afectando sobretudo os maiores de 75 anos.

Olhando agora para a evolução recente da mortalidade de 2020 (linha a negro), estamos numa situação singular, bastante perigosa. A mortalidade está bem acima da média, e temos uma população idosa muito debilitada depois deste meses de omnipresente covid. Com uma onda de calor agreste nas actuais circunstâncias, vamos ter indubitavelmente a mortalidade a disparar, E não será "só até aos 498 óbitos num dia, nem vai ficar por um excesso de mortalidade da ordem dos 1.500. Temo que venha a ser muito mais.

Não querendo ser alarmista, e pelas previsões meteorológicas dos próximos dias, julgo que estamos no momento em lançar um alerta lancinante. O Governo e a DGS vão ter de fazer muito mais do que sugerir que os idosos se ponham as fresco a beber água. Isso só não resulta. Precisamos de um plano de contingência. O sol é, neste momento, acreditem, muito mais perigoso que o SARS-CoV-2. E eu não quero vir, daqui a uma semana, dizer "olhem! vejam o que escrevi na semana passada".

Nota 1:
Link para o relatório da DGS sobre a onda de calor de 2003
https://www.dgs.pt/documentos-e-publicacoes/relatorio-da-onda-de-calor-de-2306-a-1407-de-2013-em-portugal-continental-pdf.aspx

Nota 2: Todos os dados que se utilizaram provêm do e-VM da DGS (https://evm.min-saude.pt/#shiny-tab-a_total). A média (linha amarela) é referente ao período 2009-2019, excluindo o ano de 2013, para retirar o efeito da onda de calor desse ano. A mortalidade diária de 2020 refere-se à média diária de 5 dias.


segunda-feira, 13 de julho de 2020

DA BALDA, DO DESCALABRO NOS LARES DE IDOSOS E DA IGNORÂNCIA POLÍTICA EM FAZER CONTAS

Parece que o Ministério da Saúde está «satisfeito» porque «só» há 153 lares de idosos, num total de 2.526, com casos positivos de covid-19. Ora, na verdade, isto é assustador! Por duas razões: 1) o valor é elevado; 2) a DGS nem parece aperceber-se que é elevado.

Se se fizer contas, isto significa que em Julho temos 6,06% dos lares com casos de contaminação. Extrapolando para os domicílios habituais (existem,segundo o INE, 5.954.548 alojamentos familiares), se houvesse também essa taxa de contami
nação de 6,06% no «exterior»,significaria a existência de 360.845 casos positivos na população geral, e isto assumindo apenas um caso por alojamento.

Ora, como felizmente, isso não sucede (desde Março temos 43 mil casos positivos), apenas se pode concluir uma coisa: os lares, onde estão as pessoas mais vulneráveis (os muito idosos, já com muitas morbilidades), continuam sem estar devidamente protegidos. E o Ministério da Saúde parece nem sequer ter consciência da gravidade da situação. Como tenho vindo a repetir, controle-se as contaminações nos lares e as mortes vão descer para valores próximos do zero.


domingo, 12 de julho de 2020

DA CRÓNICA DAS (MUITAS) MORTES ANUNCIADAS

Estou verdadeiramente "apavorado" com aquilo que se avizinha nos próximos dias, porquanto, como se sabe, as previsões meteorológicas indicam temperaturas muito elevadas...

Estive agora a rever a evolução da mortalidade total em 2020 nos mais idosos (acima dos 85 anos) e estou estupefacto com a tendência da última semana. Em 10 de Julho (último dia da análise), a mortalidade total neste grupo etário (média de 5 dias) era de 145 óbitos, quando a média (2014-2019) é de 99. Mas o mais impressionante é a subida "agreste" que se observa nos últimos dias, e que é mesmo mais "íngreme" do que durante o surto gripal e o pico da covid em Abril.

Se se confirmar mesmo a onda de calor, prevejo, e estou a medir as palavras, uma hecatombe nos idosos! Sobretudo se a DGS e o Governo continuarem entretidos com o alcóol gel dos estaleiros.


DA OUTRA PANDEMIA QUE NUNCA ACABA

Por favor, arranjem-nos um adulto para a sala: não podemos continuar neste fenesi de covid para aqui e covid para ali, e sempre a omnipresente covid, e continuar a assistir ao completo alheamento do Governo e da DGS ao resto daquilo que é o Serviço Nacional de Saúde, que caminha para o descalabro. 2020 ameaça ser um annus horribilis, mas não por causa da covid-19 mas pela gestão (política e técnica) da pandemia.

O excesso de mortalidade continua em alta, sem parar, e não é por causa do SARS-CoV-2. Continuamos bem acima da mortalidade média em Julho (e que conta com uma onda de calor em 2013 que fez duplicar os óbitos em alguns dias), e não, não é por causa da covid. Por exemplo, no dia 10, segundo os meus cálculos, o excesso de mortalidade (média móvel de 5 dias) estava nos 46 óbitos. E nesse dia morreram 8 pessoas por covid.

Desde o início da pandemia (16 de Março, e até 10 de Julho) morreram 37.372 pessoas, das quais 1.654 por covid (4,4% do total). A média (2009-2019) é de 32.806 óbitos. Se colocar aqui intervalos de confiança (a 95%) seria expectável, neste período, que os óbitos se situassem entre os 30.949 e os 34.663.

E enquanto isto, e enquanto diagnósticos, consultas, exames, cirurgias são adiadas, e enquanto os lares estão num descontrolo (a pedir intervenção do Ministério Público), a DGS anda preocupada com o alcóol gel nos estaleiros da construção civil... Deve ser para os pedreiros desinfectarem as luvas... Deve ser aí que está a solução para o excesso de mortalidade que "vivemos".


quinta-feira, 2 de julho de 2020

DO BRUTAL EFEITO DO DESNORTE, DA HISTERIA E DO MEDO

Na última semana e meia regressou a histeria, o medo e o desnorte por causa dos casos positivos na Grande Lisboa, apesar da maior preocupação, na minha opinião, ser do recrudescimento de contaminações em lares. Os meus próprios pais, que vivem no distrito de Aveiro (fustigado pela pandemia em Março e Abril) estão agora mais preocupados, algo incompreensível porque a situação actual muitíssimo menos grave.

Porém, se a covid-19 está matar menos, o desnorte, a histeria e o medo estão a substituí-la. Com efeito, Junho estava a ser um mês de regresso à normalidade em termos de mortalidade, como há dias até escrevi. Mas neste país sem política de Saúde Pública (que inclui gestão psicológica), tudo pode mudar repentinamente por via dos desnortes políticos. 

De facto, como pode observar no gráfico que apresento, em redor do dia 22 de Junho (quando a mortalidade em 2020 estava finalmente ao nível da média), começou a histeria na Grande Lisboa. Muito provavelmente por isso (não houve outro evento justificável, como ondas de calor), a mortalidade total disparou, como podem observar no gráfico em anexo. Só entre o dia 22 e 30 de Junho (média móvel de 5 dias), o excesso de óbitos em relação à média foi de 245 mortes, sendo que a covid-19 apenas justificou 39 mortes neste período. 

Tenho a certeza que um dia se farão estudos científicos sobre os efeitos do desnorte, do medo e da histeria em redor da pandemia, e provavelmente se concluirá que mataram mais do que o SARS-CoV-2. Mas isso não ressuscitará esses mortos.