sábado, 15 de agosto de 2020

DO VERÃO DO NOSSO DESCONTENTAMENTO... OU DA NOVA VISÃO DE UM DESASTRE IGNORADO

Acreditem: sou o maior crítico das minhas análises, sobretudo quando fogem do "mainstream", e/ou quando surgem dúvidas exteriores sobre as minhas habilitações para abordar um tema (por mais que as tenhas, eu sei: nunca serão suficientes).

Pois bem, sobre a "anormalidade" do excesso de óbitos neste Verão, houve já quem tenha apontado o calor (que o houve em Julho, embora o INSA apenas para um dia tenha alertado para risco), outros que foi uma situação semelhante a outros anos (e.g., 2013 e 2018).

Enfim, regressei aos dados da mortalidade, para nova análise, noutra perspectiva. Eis aqui o que vi.

Desde que o Verão começou, em 20 de Junho, passaram 55 dias (até 13 de Agosto). Ora, comparando dia-a-dia, contabilizei 52 dias sucessivos com a mortalidade sempre acima da média de referência (2009-2019). Esta série começou no dia 22 de Junho e apenas terminou anteontem. É uma sequência e uima quantidade de dias acima da média que não encontra pararelo com anos anteriores, mesmo com aqueles que registaram fortes e mortíferas ondas de calor, como 2013 e 2018. Além disso, essa constância e persistência de dias com mortalidade acima da média não é típico de ondas de calor, que apresentam sempre picos bruscos de óbitos, mas rapidamente descem para valores abaixo da média, algo que nunca aconteceu em 2020 no período em análise (Verão)..

Tal como se observa no 1º gráfico, em 2013, marcado por a onda de calor que se intensificou em Julho, registaram-se "apenas" 19 dias sucessivos de mortalidade acima da média, sendo que no total do período se chegaram aos 30. Em 2018 (que registou no início de Agosto uma onda de calor particularmente mortífera) teve como sequência máxima acima da média 6 dias, terminando o período em análise com um total de 28. O ano de 2016 teve também um Verão de mortalidade acima da média, embora com uma sequência máxima de 10 dias acima da média e um total de 41 dias acima da média.

Porém, se neste indicador já se mostra que o Verão de 2020 é absolutamente atípico, perla persistência da mortalidade acuma da média, o segundo gráfico reforça e mostra que não se deveu à covid, e nem encontra justificação em pretensas ondas de calor (já abordei essa temática, particularizando para os distritos de Lisboa e Braga).

Com efeito, o excesso total de mortalidade no Verão de 2020 (até 13 de Agosto) atingiu os 2.918 óbitos, sendo que apenas 242 se deveram à covid. Antes, o pior Verão fora o de 2013, que registou uma fortíssima onda de calor de duas semanas, mas o excesso de óbitos, para o período em causa, acabou por ser de "apenas" 1.018 óbitos. Os outros anos com um número de óbitos acima da média (2010, 2016, 2018 e 2019) não chegaram ao milhar de mortes a mais.

Neste momento - enfim, eu sei que é cansativo estar a repetir -, a covid não é o maior problema de Saúde Pública em Portugal. Pode ser um problema importante, mas não é o principal. Dá-me raiva ver o completo alheamento político e público perante esta hecatombe. E já não falo só do Governo, do Ministério da Saúde e da DGS, mas também dos médicos, dos especialistas em epidemiologia, dos pneumologistas e dos especialistas em covid (da imprensa ou dos partidos da oposição nem falo). Gostava imenso que deixassem de olhar para o umbigo, que olhassem para o problema da mortandade que se está a passar neste Verão em frente aos seus narizes. E que só não grita a plenos pulmões porque às vítimas, mais de 2,500, já nada lhe sairá dos pulmões.



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