Nos Estados Unidos, independentemente de ser Trump ou Biden, a covid começa a ser enquadrada como uma infecção respiratória. Daí que os relatórios do CDC que avaliam o impacte da covid integram a nova doença num grupo denominado PIC (pneumonia+influenza+covid). Fazer esse exercício nunca interessou em Portugal, nem ao doutor Flipe Froes, pneumologista que antes se lamentava pelos cantos de não se ligar às pneumonias e que agora é todo covid&máscaras&covid&máscaras.
Como ninguém parece interessado em avaliar o real impacte da covid e do excesso absoluto da mortalidade não-covid (a começar pelo Governo e a acabar nas pessoas que me acusam de negacionistas e andam a destilar ódio sobre o que analiso e escrevo), tomei a iniciativa de fazer algumas estimativas, mesmo perante a ausência de alguns dados fundamentais. Vamos a isso.
Comecemos com algumas premissas:
a) a mortalidade média anual por infecções respiratórias (segundo a Plataforma da Mortalidade do SNS) foi de 6.613 no período 2014-2018, com um desvio padrão de apenas 265, significando que é um valoer estável. Desse modo, seria expectável, sem covid, que este ano se registasse um valor próximo dos 6.600 óbitos por pneumonias e afins.
b) Nos anos de 2017 e 2018 registou-se um total acumulado de cerca de 797 mil infecções respiratórias, ás quais corresponderam um total de quase 13 mil óbitos por pneumonias e afins. Deste modo, pode-se estabelecer uma taxa de letalidade de 1,6%. (em 2017 foi de 1,76% e em 2018 foi de 1,52%).
c) No ano de 2020, quase a terminar, o SNS apenas registou 210 mil infecções respiratórias (um valor sensivelmente de metade do expectável em ano pré-covid), o que significa que, aplicando a taxa de letalidade atrás referida, se estima que as pneumonias e afins terão causado a morte de cerca de 3.430 pessoas (que contrasta com um valor expectável de cerca de 6.600 pessoas, como atrás referido em relação á média de 2014-2018).
d) A mortalidade por covid, segundo os registos oficiais (independentemente das discussões sobre critérios de classificação), deverá aproximar-se dos 7.000 até ao final do ano.
Assim, desse modo, temos que as mortes por PIC (pneumonias, influenza e covid) totalizarão em 2020 cerca de 10.430, o que contrasta com cerca de 6.600, que seria um valor expectável de PIC no período anterior á pandemia (ou seja, quando tínhamos apenas PI, sem o C).
Daqui resulta que, feitas as contas, a covid representou um acréscimo líquido na mortalidade não de 7.000 mas sim de cerca de 3.830 óbitos.
Daqui se deduz, e sem contabilizar a questão do envelhecimento populacional, com implicações na taxa de mortalidade, o acréscimo absoluto de mortes este ano tem apenas um contributo minoritário da covid.
Com efeito, terminando 2020 (faltando apenas dois dias até ao final do ano), terão morrido, por todas as causas, cerca de 123,540 pessoas, que contrasta com uma média de 111.200 óbitos no período 2015-2019. Ou seja, um acréscimo absoluto de 12.340 mortes.
Ora, retirando deste valor o impacte líquido da covid (3.830 óbitos, acima calculado), temos então um registo pavoroso de 8.510 mortes a mais do que seria expectável devido a causas anómalas.
Entendem agora porque andei, quixotescamente (é certo), a zurzir no estado comatoso do SNS? A dizer que a estratégia covid para estancar uma pandemia acabou por criar uma outra pior do que a causada pelo SARS-CoV-2?
A covid ajudou a matar mais 3.830 pessoas; o estado do SNS "ajudou" a morrer outras 8.510 pessoas. Eis o belo resultado que temos.
Fonte: DGS (boletins da covid); DGS (SICO-eVM); SNS (Plataforma da Mortalidade); SNS (Monitorização da Gripe e Outras Infecções Respiratórias