quinta-feira, 6 de agosto de 2020

DOS BODES EXPIATÓRIOS (UMA ANÁLISE DETALHADA SOBRE O EFEITO DA ONDA DE CALOR DE JULHO)

Mão amiga enviou-me o relatório com 16 páginas do IPMA sobre a meteorologia em Julho, aconselhando-me a ver, pelo menos, as duas primeiras. Se seguisse o conselho, ficaria com a ideia de que afinal foi o tempo quente e seco (o mauzão) que causou uma mortandade no mês de Julho. Pois, mas por mim, ou leio os relatórios, e formo uma opinião, ou não leio e não formo.

Primeiro, quando olhamos para valores médios das temperaturas (mínima, média e máxima), efectivamente Julho foi bastante quente, sobretudo quando comparamos com as últimas três décadas do século XX, mas não tanto com as dos anos do presente século (hélas, o aquecimento global).Porém, como todos sabem, por certo, o nosso país tem um clima muitíssimo variado para país tão pequeno, além de ter uma concentração populacional nos distritos do litoral.

Ora, conforme se pode observar no relatório do IPMA, as ondas de calor em Julho fizeram-se sentir sobretudo nos distritos do interior, menos populosos. O único distrito mais populoso, com uma onda de calor de 10 dias (9-18 de Julho). Lisboa, por exemplo, não registou qualquer onda de calor. Os extremos da temperatura foram, por norma, atingidos no dia 17 de Julho, aliás, o único em que o Índice Ícaro (do INSA), sobre o qual escrevi ontem, indicava risco de excesso de mortalidade.

Lendo o relatório, e verificando ausência de onda de calor no distrito de Lisboa e presença de onda de calor entre 9 e 18 de Julho no distrito do Braga, fui ver como variou a mortalidade diária nestas duas regiões ao longo do mês. Podem observar os resultados nos dois gráficos, tendo aqui uma síntese:

Distrito de Lisboa (sem onda de calor)
Mortalidade média diária (2014-2019): 50,5 óbitos
Mortalidade média diária (Julho 2020): 66,6 óbitos
Dias sem onda de calor: 31
Dias com onda de calor: 0
Mortalidade média diária na onda de calor: (não aplicável)
Excesso de óbitos em Julho de 2020: 497 (+ 31,7%)

Distrito de Braga
Mortalidade média diária (2014-2019): 14,8 óbitos
Mortalidade média diária (Julho 2020): 21,2 óbitos
Dias sem onda de calor: 21
Dias com onda de calor: 10
Mortalidade média diária na onda de calor: 22,4 óbitos
Mortalidade média diária fora da onda de calor: 20,7 óbitos
Excesso de óbitos em Julho de 2020: 201 (+ 44,0%)
Excesso de óbitos nos 10 dias com onda de calor: 77 (+51,9%)
Excesso de óbitos nos 21 dias sem onda de calor: 124 (+40,1%)

Donde se conclui que no distrito de Lisboa, apesar da não existência de onda de calor, houve um excesso de quase 32% da mortalidade. No caso de Braga, sendo certo que nos 10 dias da onda de calor houve maior aumento da mortalidade em relação à média (51,9%), esse indicador foi também bastante elevado (40,1%) nos dias sem onda de calor, o que revela que apenas uma pequena parte do excesso de mortalidade terá tido essa onda de calor como causa.

Ou seja, continuo a defender que as temperaturas elevadas terão contribuído para o excesso de mortalidade, mas como factor de exacerbamento, o que se mostra bastante preocupante. De facto, se tivermos este Verão ondas de calor a atingir os distritos populosos, sobretudo do litoral, e em especial Lisboa e Portugal, a situação de Saúde Pública pode sim, neste caso, ser catastrófica. Portanto, não negando a existência de onda de calor durante o mês de Julho em parte substancial do território, tivemos mesmo assim a sorte de não atingir as zonas populosas. Porém, temo também que a onda de calor no interior sirva como argumento político para se encontrar um bode expiatório. Como mostrei em particular para os distritos de Lisboa e Braga, não é preciso onda de calor para haver um excesso de mortes. Era bom que o Governo debelasse o problema em vez de procurar bodes expiatórios que não fará ressuscitar ninguém.



quarta-feira, 5 de agosto de 2020

DA AREIA (OU DO SOL) PARA OS NOSSOS OLHOS

Para justificar a morticínio de Julho, já começam a surgir as explicações da DGS, do IPMA e de "especialistas" para confundir a malta, dizendo que, provavelmente, afinal a culpa foi toda do Sol, esse malvado. Acreditem já naquilo que quiserem. Eu acredito na Ciência. Ora, há uns anos, o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) criou um índice de previsão de excesso de mortes por causa do calor denominado Índice Ícaro.

Cito a explicação: "Genericamente um Índice Alerta Ícaro é uma medida numérica do risco potencial que as temperaturas ambientais elevadas têm para a saúde da população. Compara os óbitos previstos pelo modelo estatístico subjacente ao sistema de vigilância ÍCARO, com os óbitos esperados sem o efeito das temperaturas extremas. O índice Alerta ÍCARO toma valores maiores ou iguais a zero, sendo esperados efeitos sobre a mortalidade quando este ultrapassar o valor um.»

Pergunta de «um milhão": quantos dias em Julho do ano da nossa desgraça de 2020 excederam o valor 1 do Índice de Ícaro?

A resposta está no gráfico: 1 dia. Repito: 1 dia. Somente 1 dia. Foi apenas no dia 17 de Julho. E vejam como foi o exceso nesse dias: 113 óbitos a mais. Foi muito? Claro que foi. Mas no dia 14 o índice foi de 0,17 e morreram a mais 149... E por aí fora. E, assim, tivemos uma excesso de óbitos no final de Julho de 2.292, sendo que só num dia (com 113 óbitos a mais) havia condições meteorológicas para esperar mortalidade acrescida.


DA EVIDÊNCIA ESTATÍSTICA, HÉLAS, DO COLAPSO DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE

O mês de Julho teve um excesso de mortes inaudito, e quando apenas 1,5% dos óbitos se deveu à covid, mas vieram já céleres as desculpas oficiais (via DGS e IPMA): foi "apenas" do tempo quente. O calor é sempre um bom bode expiatório. "Siga-se para bingo",até porque só mata velhos, não é?

Pois, mas este mês de Julho e o supsto calor não matou só velhos. Dei-me ao trabalho de analisar com detalhe a mortalidade neste mês, por grupo etário, e calcular os desvios (excesso ou défice) não apenas em relação à média (2014-2019, os dados disponíveis no SICO), mas tendo em conta os tão famigerados intervalos de confiança. Deste modo, apresento no gráfico, para cada grupo etário, o desvio face ao máximo expectável (verde); à média (amarelo) e ao mínimo expectável (vermelho).

E eis as evidências: mesmo usando o limite superior do intervalo de confiança (máximo expectável), todos os grupos acima dos 45 anos apresentam excesso de mortalidade. No caso dos maiores de 85 anos chega aos 34,5%, um absurdo! E uma surpresa desagradável (mesmo se em termos absolutos os óbitos não são muitos), houve excesso de mortalidade também
face ao máximo expectável para o grupo 15-24 anos.

Se se considerar o desvio em relação á média, apenas os menores de 5 anos e o grupo 5-14 não apresenta excesso de mortalidade em Julho.

Mas vejam por vós. E tirem as vossas conclusões sobre o estado do nosso Serviço Nacional de Saúde. Continuem a achar que não, que não há problema algum na nova moda das consultas por telefone, nos exames suspensos, nas cirurgias adiadas, na manutenção da contínuada falta de confiança para se ir a um hospital, etc., etc., etc... Está tudo bem, não é? Vai tudo ficar bem, não é?


DA LOUCURA EM TERRA DE LOUCOS

Um louco em Grândola deixou a mãe idosa morrer no meio de fezes, fome, urina e sede. Foi ontem levado ao juiz, convenientemente algemado e de máscara posta, tal como os agentes da PJ. Até aqui tudo bem. Mas também, diz o CM, e mostra a foto, “usou um fato especial por não haver resultado do teste à Covid-19”. Alguém me sabe explicar aquilo que exactamente aquele fato especial, ainda mais vestido assim, protege o homem e/ou aqueles que o rodeiam? Que patetice é esta?


DA ESTUPIDEZ QUE TAMBÉM MATA

O Público já não têm já remissão. Começa a tomar o lugar do Correio da Manhã no sensacionalismo. Toca a alimentar o pânico: uma morte por covid-19 em cada 15 segundos! Ui! Fim do Mundo... Pêra aí! Mas este ano, ao fim de 217 dias já morreram 35 milhões de pessoas. Ora, isto dá 28 pessoas em cada 15 segundos. Donde se conclui que morreram 27 pessoas de causas que não dão notícia. A covid pode ser uma doença grave mas o histerismo parece-me mais.


terça-feira, 4 de agosto de 2020

DA FALTA DE EMOÇÃO PARA O EXCESSO DE MORTES

Ontem viu-se um quase choroso secretário de Estado da Saúde comover-se pelas zero mortes por covid-19. Pela primeira vez, a mortalidade diária acumulada devido à covid, não se mexeu. Festa no Governo! Vendida uma vitória, e arrancada com emoção.

E agora? Bom, já que Lacerda Sales se portou como um secretário de Estado da Covid, precisamos agora de um secretário de Estado da Não-Covid. E para quê? Ora, para que aquela mancha vermelha dos dois gráficos, ali em baixo, já bastante gorda, não engorde ainda mais.

Vejam bem a mancha vermelha do primeiro gráfico. Eu sei: são números, são estatísticas! Merda! São pessoas! Representam pessoas que foram morrendo fora de tempo, porque, enfim, só houve Ministério da Covid, e o Ministério da Saúde suspendeu funções por tempo indeterminado. São pessoas que, contas feitas (sempre as contas para chatear), terão sido provavelmente 4.831 desde 16 de Março até 31 de Julho. E isto para além de todas as outras, em número de 38.158, que, pelas leis da vida já se esperava se finarem neste período de tempo (e representadas pela linha verde do primeiro gráfico). A covid causou, neste período, 1.373 óbitos. É pouco? Não, é muito! É muito e é também 24% do excesso total de mortes no período. E é muito, mas também é 3,9% do total das mortes no período. Em Julho correspondeu apenas a 1,5%.

Independentemente da perigosidade da covid, o Governo portou-se como se a pandemia fosse a única causa que nos torna mortais. Não me venham dizer que não posso culpar o Governo. Posso sim: António Costa garantiu em Março que não ia faltar nada ao SNS. E falta, faltou e vai faltar muito. Mesmo muito. E com custos em vidas. Não me canso de repetir: a suspensão de consultas, de diagnósticos, de exames, de cirurgias e de outros actos médicos, o pânico alimentado que provocou fugas às urgências, e a incapacidade de simultaneamente garantir seguranças mas calor humanos aos idosos, tudo isto, causou, causa e causará mortes, sobretudo se temperado com temperaturas elevadas no Verão (e sem qualquer acção médica contingencial). E não são nem serão poucas. Por agora, são mais de 4.800, mas pela tendência de Jullho, o mês de Agosto "promete" não ser meigo: vejam, no segundo gráfico) como a mancha amarela quase não mexeu para cima (morreram apenas 157 pessoas por covid), enquanto a mancha vermelha (não-covid) engrossou e engrossou; a tal ponto que as mortes não-covid em Julho foram maiores do que todas as mortes por covid desde Março.

Enfim, e por fim, eu já dou de barato que o PIB se escaqueire 30% ou 40%, ou o que seja; que andemos de máscaras até em casa; que as tascas sirvam copos de leite às 7 da tarde e fechem sempre às 8; que não haja mais futebol com público (nesta fase, o Benfica merece!); que as praias tenham semáforos e zaragatoas; que nos façam gato-sapato. Espero, porém, que, no meio desta distopia, o Ministério da Saúde saiba ser Ministério da Saúde. E que o Governo saiba governar. Pela nossa já tristonha saúde. Física e anímica.



domingo, 2 de agosto de 2020

DO FALACIOSO SILOGISMO

Cada vez noto mais, mesmo em mui próximos verdadeiros amigos (e dos outros nem falo), o seguinte raciocínio dedutivo, mas lamentavelmente falacioso:

1 - As medidas rigoríssimas contra a covid (suspensão de aulas, máscaras em todo o lado, regras apertadas em espaços comerciais, etc., etc., etc.) eram, são e serão necessárias porque, caso contrário, ocorreria e ocorrerá um geral morticínio não quantificável mas sempre elevado;

2 - Nunca seria possível prever que a suspensão de consultas, exames e cirurgias pelo SNS viesse a causar um morticínio no Verão, não havendo, além disso, provas de esse excesso de óbitos se dever a tais situações

3 - Donde se deve concluir que, havendo certezas de que sempre haveria morticínio elevados, mesmo não quantificável, sem medidas anti-covid, e não havendo certezas de as suspensões de serviços do SNS resultam em mortes, devemos todos bater palmas ao Governo e continuar como estamos. A Bem da Nação.

E andamos nisto, morrendo gente em demasia, porque a segunda proposição é falsa.



DO PANDEMÓNIO EM LISBOA

Esta é coisa curta, mas ilustrativa do desnorte do Governo e da DGS: a variação da mortalidade no distrito de Lisboa mostra que o pico da gripe em Janeiro foi maior do que o da "pandemia da covid" em Março-Abril (que nem sequer registou um verdadeiro pico em Lisboa); e por sua vez o pico de Julho foi o maior de todos. Se se considerar os intervalos de confiança (vd. gráfico no primeiro comentário), então quase se pode dizer que a "pandemia da covid" não se fez sentir na região da capital. Já "pandemónio" de Julho, esse, é bem vísível e estatisticamente evidente. Mas ignorado pelo Governo e DGS.




DO JULHO, UM DESASTRE DE SAÚDE PÚBLICA (COM COMPROVATIVO ESTATÍSTICO)

Começa a ser algo irritante, mas com "remédio" eficaz, os "paraqueditas" que, de quando em vez, arremetem contra mim, quase sempre contra o meu currículo (com uma obsessão embirrenta no meu estatuto de doutorando, nem sei porquê).

Enfim, também especial atenção têm alguns dos meu queridos "atacadores" ao detalhe dos meus gráficos à cata de imprecisões. Se não apresento as linhas dos intervalos de confiança, gritam heresia!

Pois bem, se se quer intervalos de confiança (algo que sempre calculo mesmo quando não apresento por razões de maior simplificação gráfica), então aqui estão, e que a propósito mostram de uma forma ainda mais evidente como foi tenebroso o mês de Julho em termos de Saúde Pública, sem paralelo com os meses anteriores. E a culpa não foi da covid.

Passo a explicar o que fiz. Calculei a média (2009-2019) e os intervalos de confiança (a 95%) para cada mês, e comparei com o registo da mortalidade total do mês homólogio de 2020, e em seguida calculei três possíveis excessos: a) excesso de óbitos em relação ao limite inferior do intervalo de confiança (máximo expectável); b) o excesso de óbitos em relação à média; c) o excesso de óbitos em relação ao limite superior do intervalo de confiança (mínimo expectável). Por fim, deduzi as mortes por covid no respectivo mês, para assim ficar com o excesso de mortes não relacionadas directamente com a covid (no primeiro comentário, coloquei um gráfico sem as deduções da covid).

Eis então o triste retrato:

a) Março - terá ocorrido um excesso máximo de 1.046 óbitos, mas a mortalidade deduzida a covid está dentro do intervalo de confiança, pelo que pode não ter ocorrido qualquer excesso.

b) Abril - registou-se um excesso de óbitos não-covid de entre 445 e 1.377 pessoas, com um valor médio de 891 pessoas.

c) Maio - registou-se um excesso de óbitos não-covid de entre 287 e 1.162 pessoas, com um valor médio de 724 pessoas.

d) Junho - reforçando a tendência decrescente dos dois meses anteriores, registou-se um excesso de óbitos não-covid de entre apenas 14 e 930, com um valor médio de 472.

e) Julho - um desastre completo: o excesso de óbitos não-covid encontra-se entre um mínimo de 1.504 pessoas e um máximo de 2.705 pessoas. O valor médio deste excesso foi de 2.105. Em termos comparativos, entre 16 de Março e 31 de Julho morreram 1.737 pessoas por covid. O valor médio em excesso apenas no mês de Julho representa cerca de 68 caixões a mais todos os dias. O máximo diário de mortes por covid foi de 37 (dia 3 de Abril) e houve apenas 10 dias com mais de 30 mortes.

Espero com isto que se fique com plena consciência da enorme gravidade da situação de Saúde Pública durante o mês de Julho, sem um 'ai' nem um 'ui' do Governo e da DGS. Se há um mês de "pandemia" não foi nem Março nem Abril; foi Julho. E temo que Agosto não seja diferente.



sábado, 1 de agosto de 2020

DO RETRATO DE DUAS PANDEMIAS: A COVID E A NÃO-COVID

Eis que vos presenteio, com este gráfico, o seguinte, com dados numéricos bem explícitos:

a) a mortalidade média (2009-2019) - barra castanha;

b) a mortalidade por covid - barra roxa (obviamente a zero em Janeiro e Fevereiro)

c) o excesso ou a redução (apenas em Fevereiro) de óbitos em relação à média deduzida a mortalidade por covid (obviamente a zero em Janeiro e Fevereiro) - barra vermelha

d) a mortalidade total por mês - ponto amarelo (sendo que este valor iguala o somatório da média, da variação positiva ou negativa em relação à média e da moprtalidade por covid).

Está tudo aqui: o acaso, o impacte da covid, o impacte das políticas de saúde que se borrifaram em quase tudo o que não era covid, e ainda a situaçºao perfeitamente tenebrosa do mês de Julho.

Os bons entendedores entenderão estão gráfico; os outros continuarão a não...


DAS POLÍTICAS QUE (NOS) MATAM

Em Julho, segundo dados da DGS, morreram 150 pessoas por covid, o valor mensal mais baixo desde Março. Porém, paradoxalmente (ou não), Julho de 2020 é, entre os meses da «pandemia da covid» (Março em diante), aquele que apresenta um maior desvio da mortalidade total em relação à média (2009-2019): um acréscimo de 27,8%. Em Março último o acréscimo fora de 7,1%, em Abril de 19,6%, em Maio de 13,5% e em Junho de 7,9%.

Este acréscimo é um absurdo e um caso de Saúde Pública, mas o Governo prefere os "drinks de fim-de-tarde" da ministra da Cultura ou as bolas de berlim da praia da Lagoa do primeiro-ministro. Nem um ai se ouve do Governo, nem um ui da DGS. O "povo", esse, continua amedrontado pela covid-19, enquanto segue para o "matadouro" das outras doenças não tratadas. A imprensa nanja, enquanto manja. 

A mortalidade em Julho trucida quaisquer paninhos quentes, ou desculpas. Ultrapassa em 2.260 óbitos o valor médio do período 2009-2019; excede em mais de 1.100 óbitos (i.e., cerca de 35 caixões a mais por dia) o pior ano anterior (2013); suplanta em mais de 1.500 óbitos o máximo expectável; quase chegou a registar mais 3.000 óbitos do que os do ano mais calmo (2009).

Tudo isto (e muito mais, que referirei posteriormente) se passou em Julho de 2020. Não me venham dizer que a culpa é da covid, ou do azar, ou que o "mensageiro" manipula ou tem razões ideológicas e coisas que tais, e que blá blá blá... Areia para os olhos, ou melhor dizendo: punhais que matam. 

Suspender consultas, diagnósticos e cirurgias tinha um custo, e nem era preciso ser-se epidemiologista ou simples médico para antever consequências. Mas pior ainda, está agora a manter-se esta situação por meses a fio, alimentada ainda pelo contínuodiscurso de medo e de obsessão pela covid. E nem vidas nem Economia se salvaram. E a nossa imprensa ajudou nisto, o que me entristece e envergonha (tendo eu sido, em tempos, um jornalista). E com tudo isto se tem matado mais pessoas do que o SARS-CoV-2. Sinceramente, cada vez mais julgo que as actuais políticas de Saúde Pública são, verdadeiramente, a nossa principal pandemia. 


sexta-feira, 31 de julho de 2020

DO RESUMO DE UMA LOUCURA

Foi para evitar a "mancha amarela" que páramos a Economia, e tivemos assim um retrocesso de 14,1% do PIB no segundo trimestre de 2020... acrescido da "mancha vermelha" (2,7 vezes maior do que a "mancha amarela"), porque também parámos os tratamentos e cuidados médicos em tudo o resto... Vamos bater palmas ao Governo e à DGS pelo bom trabalho? Ou basta comemorar com um "drink de fim-de-tarde"?


DO MORTICÍNIO DE VERÃO

O mês de Julho termina hoje. Será o primeiro mês do Verão do nosso descontentamento. A menos que haja um milagre (coisa rara de suceder, e mesmo assim, por regra, apenas em cima de azinheiras), este vai ser o primeiro mês de Julho desde que há registos (e presumo desde sempre em Portugal) sem um único dia - repito UM ÚNICO dia - com menos de 250 mortes. E o mês que conta, hélas, 27 dias (poderão ser 28, com hoje), vou repetir VINTE-E-SETE dias a ultrapassar os 300 óbitos. Nunca visto em Julho e em qualquer mês de Verão. Houve ainda três dias que chegaram às quatro centenas de óbitos.

O ano mais próximo desta desgraça foi o de 2013, com "apenas" 12 dias acima de 300 óbitos (uma onda de calor terrível de duas semanas), mas mesmo assim teve 8 dias com menos de 250 óbitos. Dos 12 anos em análise apenas estes dois, e mais 2010 (com 10), 2016 (com  8), 2012 e 2019 (ambos com 1), registaram dias com mais de 300 óbitos. 

O morticínio do Julho de 2020, com uma tenebrosa estabilidade em alta, pode ter um pequeno dedo do calor em alguns poucos dias, mas escancara sobretudo a terrível situação de fragilidade e abandono da população idosa, fruto dos continuados abandonos e suspensões dos cuidados de saúde essenciais  (73% da mortalidade em Julho foi de pessoas com mais de 75 anos).

Se esta situação se mantiver, acho que sim, que devemos usar, sim senhor, as mãos para reagir a esta "linda" actuação da DGS e do Governo (que comandam o SNS), mas não propriamente para lhes bater palmas. 


quarta-feira, 29 de julho de 2020

DA LOUCURA DA NOVA AVESTRUZ QUE EM VEZ DE ENFIAR A CABEÇA NA AREIA, A ENFIA NUMA MÁSCARA

Dizem que ontem morreram 3 pessoas por covid-19. Paz às suas almas. E também às outras 300 que se finaram de outras maleitas sem importância. 

Enquanto isto, o Governo Regional da Madeira vai obrigar o uso de máscara nas vias públicas, e temo que a "moda" venha para o Continente. Daqui a uns tempos obrigam-nos a usá-la em casa. E, enquanto isto, o mês de Julho, que termina dentro de dois dias e pouco, vai terminar ultrapassando, pela primeira vez (não vai haver milagres), a fasquia dos 10.000 mortes. A média (2009-2019) é de 8.125 óbitos. 

Não culpemos o SARS-CoV-2. A covid, neste mês, representará menos de 1,5% das mortes totais (vai agora em 146 óbitos), mas o Governo  e DGS querem-nos enfiar uma máscara, não apenas na cabeça, mas nos olhos. A impresa dá, solícita, uma ajudinha.

A mortalidade neste mês de Julho impressiona-me. É certo que houve uns dias de maior calor, mas nada que justifique termos, até agora, TODOS, repito TODOS, os santos e profanos dias do malfadado Jullho com excesso de mortalidade em relação à média, havendo nove dias em que esse excesso ultrapassou os 100 óbitos diários. Venderam-se caixões em Julho como nunca! Só o excesso não-covid na mortalidade em Julho (mês que costuma ser um dos menos letais em Portugal) será maior do que todas as mortes por covid desde Março. É assustador, e mais ainda porque nãos e ouve um pio do Governo, da DGS e da imprensa.

Vivemos, enfim, uma verdadeira loucura, Tudo para a covid, pouco ou nada para o resto. O resultado está à vista. Enquanto se está a morrer que nem tordos, o Governo quer-nos avestruzes, enfiando-nos máscaras pelos olhos dentro. Por mim, acho que nos fazem de patos. Ou de parvos.



segunda-feira, 27 de julho de 2020

DO BALANÇO DA PANDEMIA FEITA PANDEMÓNIO

Quando se fizer, verdadeiramente, sem “ideologites”, o balanço do impacte da covid e destes tempos distópicos, deve ter-se em consideração análises e reflexões como estas que se seguem:

1) A covid-19 matou, entre Março e finais de Junho, 1.579 pessoas, tendo o coronavírus sido detectado em 42.523 pessoas.

2) Em virtude das medidas de confinamento e distanciamento social, entre Março e finais de Junho de 2020, o SNS detectou menos 46% episódios de gripe e menos 66% de episódios de infecções respiratórias do que a média de 2017-2019 em período homólogo.

3) Entre Março e Junho dos anos de 2017 e de 2018 (anos com dados oficiais disponíveis), a taxa de letalidade por infecções respiratórias (mortes por estas causas por total de casos de gripes e infecções respiratórias) rondou os 1,64%.

4) Significa isso que este ano de 2020, entre Março e Junho, em virtude das medidas de confinamento e distanciamento, terão morrido cerca de 700 pessoas por infecções respiratórias "comuns" (715, na minha estimativa), ou seja, menos - repito, menos - cerca de 1.300 pessoas daquilo que seria expectável (e que ocorreriam, certamente, se não houvesse covid, porque não haveria assim confinamento nem distanciamento social).

5) Resulta assim que, em termos de balanço, por causa da covid terão morrido mais cerca de 300 pessoas do que seria expectável morrerem por infecções respiratórias entre Março e Junho de 2020. Ou seja, explicando em detalhe o raciocínio. Sem SARS-CoV-2, assume-se que teriam morrido, nestes meses, por infecções respiratórias, cerca de 2.000 pessoas (como nos outros anos). Ora, directamente pela covid morreram 1.579 pessoas , a que se tem de acrescentar mais 715 óbitos (estimativa) por outras infecções respiratórias para este ano, no período em análise, dando assim quase 2.300 óbitos. Deduzindo as tais 2.000 mortes "habituais" por infeccções respiratórias, temos então o impacte líquido da covid: 300 óbitos a mais. 

6 - Porém, temos o outro lado da “moeda”. Também pelo forte contributo das (erradas, na minha opinião) decisões políticas na luta “obsessiva” contra a covid (adiamento de cirurgias, exames, consultas, e da fuga por pânico e medo das urgências hospitalares), o excesso de mortalidade foi assustador entre Março e Junho (e piorou mais em Julho). Considerando a média de 2009-2019, o excesso de óbitos entre Março e Junho este ano é de 4.182, com um intervalo de confiança (a 95%) entre 2.311 e 6.053 óbitos), o que torna a situação particularmente trágica.

7) Em tom de conclusão: parece-me evidente que o pandemónio em redor da covid terá causado muitas mais mortes do que a própria pandemia. E o mês de Julho tem confirmado, e temo que a situação possa tornar-se mais dramática. E nem sequer estou a meter ao barulho a Economia.

Nota 1: Links de bases de dados oficiais usadas:
a) Mortalidade em Portugal (DGS) - https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiOGRhNjdjYzgtOGZmNy00NDZjLWI1YTctNWQyNzRiMDg3NzJiIiwidCI6IjQyOTc3ZjkwLWE1NjItNDk1OS04ZjJjLTE4NDE2NjI1Zjc2NiIsImMiOjh9&mnredir=1&lnc=6047AAAAAAAAAAAAAAAAAAAA

b) SICO (DGS) - https://evm.min-saude.pt/#shiny-tab-q_total

c) Monitorização da gripe e outras doenças infecciosas (DGS) - https://www.sns.gov.pt/monitorizacao-do-sns/servicos-de-urgencia/caracterizacao-urgencias/?fbclid=IwAR22DhJxh8R42-krtfppvYBVRJ9gtD57udtBOl2O8tLww2d18TME7rvoCNk

Nota 2: A mortalidade por infecções respiratórias para os anos de 2017 e 2018 são oficiais; para os anos de 2019 e 2020 são estimativas com base com base na taxa de letalidade média para os anos de 2017 e 2018 (1,64%). Foram calculados, para os anos de 2017 e 2018, as taxas de letalidade mensais (Março a Junho) que variam entre 1,49% e 1,84% em 2017, e entre 1,48% e 1,78% em 2018.