segunda-feira, 9 de novembro de 2020

DO DESCALABRO NOS LARES OU DO INTOLERÁVEL SILÊNCIO

No passado dia 4 de Novembro escrevi isto: "Olhando para a evolução da última semana (28out-3nov) na incidência da covid nos mais idosos, em comparação com a semana anterior (21out-27 out), é de esperar que nos próximos sete dias a mortalidade por covid se situe entre os 49 e os 64 óbitos, mas irá subir para valores entre os 82 e os 106 óbitos (estimativas feitas com base em intervalos de taxas de letalidade para os grupos maiores de 60 anos)."

Ontem morreram 63 pessoas (ou seja, próximo do limite superior do intervalo da minha previsão) e mantenho a minha previsão para a próxima semana de evolução negativa, o que indica que podemos aproximarmo-nos das 100 mortes. E isto por uma simples razão: descontrolo nos lares.

Com efeito, apesar da DGS continuar a esconder informação (ou nem sequer a ter dados minimamente válidos), não tenho dúvidas que são os lares que, em grande medida, estão a "alimentar" as mortes das últimas semanas.  

Continuo, aliás, a achar perfeitamente intolerável que a DGS e o Governo continuem a assobiar para o ar sobre o verdadeiro estado da pandemia nos lares, onde se encontra o grupo mais vulnerável, não apenas porque a média etária ronda os 84 anos como pelas comorbidades assoiadas. A taxa de mortalidade já é ali, por norma, bastante elevada (por factores compreensíveis), mas a pandemia estará a causar uma verdadeira razia.  

Segundo notícias da imprensa, terão morrido nos lares, até agora, 1.049 idosos. Se assumirmos, com pouca margem de erro, que todos tinha mais de 80 anos, significa então que 54% das vítimas desta faixa etária viviam em lares (até ontem tinham falecidos 1944 pessoas nesta faixa etária).

Isto pode não parecer assim tanto, mas na realidade é uma enormidade. Com efeito, segundo o INE, viviam no final do ano passado 675.863 pessoas com mais de 80 anos, estimando-se cerca de 100 mil viverão em lares.

Contas feitas, temos então 1.049 vítimas em lares num universo de 100.000 pessoas, enquanto fora dos lares temos as restantes 895 vítimas nesta faixa etária num universo de 575.863 pessoas.

Ou seja, enquanto nos lares temos, assim, 105 mortos por cada 10 mil idosos, nos idosos da mesma faixa etária que moram fora dos lares temos apenas cerca de 15 por cada 10 mil. Portanto, nos lares está a morrer-se por covid quase 7 vezes mais do que fora dos lares. 

Se, porventura, a taxa de mortalidade por covid nos lares fosse similar à registada fora dos lares para a mesma faixa etária seria expectável terem aí morrido, em vez dos tais 1.049 idosos, somente  155. Vejam bem a diferença! 



domingo, 8 de novembro de 2020

DO VERÃO DE SÃO MARTINHO NO ALGARVE

Prevejo que, aplicando-se o recolher obrigatório apenas nos 121 concelhos da “lista vermelha”, haja nos dois próximos fins-de-semana uma debandada em direcção ao Algarve, onde apenas um município terá restrições. Quem fala do Algarve, fala de muitos outros concelhos pelo centro e interior do país... Nada melhor do que uma medida destas para promover a disseminação das infecções pelas regiões que têm poucas... Será que suas sumidades do Governo e DGS, mais Froes & Ca., não as pensam?



DO RÁDIO TAXI PSP

Vou falar muito a sério: alguém convença o primeiro-ministro António Costa a tomar uns dias de descanso, mais o seu Governo. Estão a precisar. Isto não pode continuar assim. É insano demais. O recolher obrigatório nocturno, quando tudo está fechado, e a polícia poderia apenas circular para garantir ausência de ajuntamentos, já era uma péssima ideia. O recolher diurno, a partir das 13 horas de sábado e domingo, já não é um disparate; é uma insanidade completa. O Governo está pior que o Doutor Bacamarte da novela "O Alienista", de Machado de Assis. É tudo muito mau. Vai juntar-se tudo nas manhãs de sábado e domingo em compras, nos espaços públicos, amontoam-se. Depois, junta-se tudo em festarolas, nas casas uns dos outros, e ninguém (polícia) terá capacidade de controlar coisíssima nenhuma. O risco de infecção aumentará, as infecções também.

E estava eu a pensar que nada mais podia ser pior e leio uma nova declaração de António Costa sobre o recolher obrigatório: "Esta medida prevê simplesmente que as forças da autoridade possam conduzir as pessoas ao domicílio". Portanto, quem precisar de um táxi, é só gritar na rua para chamar a atenção da PSP. Como a polícia não tem carros suficientes, com sorte algum agente leva o "meliante" às cavalitas... até ao respectivo e seguro "domicílio"... Se tudo isto não fosse extremamente grave, seria muito cómico.

P.S. O Governo também está a alimentar o lado pior do português: a bufaria. Estou a imaginar os/as vizinhos/as à janela, entretidos a espiolhar, e a chamar a polícia, se alguém puser pé fora de porta após o toque de recolher.



DA ESTUPIDEZ ABSOLUTA DE QUEM DEVIA TER JOGADO MAIS SIMCITY QUANDO ERA NOVO

Limitação da liberdade de circulação entre as 13 horas de sábado e as 5 da manhã de domingo? E entre as 13 horas de domingo e as 5 da manhã de segunda-feira? E depois ainda entre as 23 horas e as 5 da manhã durante a semana? 

Sinto-me que o Governo me (nos) anda a tratar como se fosse(mos) puto(s) de 5 anos.

Esta gente pensa que está a jogar SimCity? Os efeitos vão ser completamente contraproducentes.

P.S. Se tudo me correr como previsto, conto sair deste hospício chamado Portugal no próximo dia 13 e só regresso no dia 1 de Dezembro. Portanto, divirtam-se nos próximos fins-de-semana.



sábado, 7 de novembro de 2020

DA COVID, DOS ESTADOS UNIDOS E DE PORTUGAL, CLARO

Uma coisa é/foi o Trump, outra coisa são os Estados Unidos. A crise pandémica nos Estados Unidos não foi culpa do Trump, porque apesar da sua estupidez, na verdade o Governo Federal tem uma actuação limitada face à autonomia dos Estados. O impacte da covid nos Estados Unidos é sobretudo a consequência do seu anacrónico sistema de saúde e das grandes disparidades sociais, que é um problema mais estrutural e, portanto, crónico. Não é por acaso que, nos ranking internacionais, os Estados Unidos nunca surgem bem colocados em matérias de Saúde (Pública). E também não é por um acaso que, segundo o CDC, a taxa de internamento dos negros por covid é o triplo da dos brancos (vd. imagem).

Mas é exactamente o conhecimento e a exposição das suas fragilidades que tornam os Estados Unidos um país tão aliciante. Independentemente das suas falhas, perquenas ou grandes, subsiste sempre uma cultura de estudo, de investigação e de informação. Seria impensável em Portugal a divulgação de dados sobre a incidência da covid com o detalhe que existe nos Estados Unidos, onde se fica a saber tudo sobre o risco, a incidência e a mortalidade nos grupos étnicos, por nível de riqueza, por... não vou ser exaustivo... por tudo. Conhece-se tudo. 

Eu consigo saber, apenas com cliques, com imenso detalhe, aquilo que se passa, por exemplo, em termos epidemiológicos e de saúde pública tanto em Nova Iorque como n condado de Autauga, no Alabama. Tudo! Transparência máxima. 

Por aqui, neste nosso burgo, sabemos nada. E ainda temos uma directora-geral da Saúde que considera pouco patriótico criticar a informação por ela transmitida. Informação? Endoidei? Aquilo não é informação; é uma "coisa".  

P.S. Já agora, a situação dos Estados Unidos, em termos de mortalidade, é actualmente, e em termos proprcional, menos grave do que a portuguesa, Convinha a nossa imprensa lembrar-se que eles têm 32 vezes mais população.

Nota: O site do CDC norte-americano pode ser acedido por aqui.


DA TRANSMISSÃO DESDE MARTE... DIGO, ÉVORA

Sensacionalismo? Nah! E aquilo que mais me irrita nem é o jornalista ter proposto uma entrevista neste preparos; é um médico dar-se a este tipo de palhaçada que contribui apenas para uma coisa: alimentar o pânico.



DOS PONTOS NOS ÍS

Não sou ingénuo. Sei bem que, por via das análises e críticas que tenho feito à gestão da pandemia e ao estado comatoso do SNS, tenho atraído as simpatias de muita e muita gente... Desenganem-se, porém, uma boa parte deles. Continuo o mesmo há muitos e muitos anos, com os mesmos princípios éticos, morais e ideológicos... Isto a propósito de reacções que vejo face à minha pública satisfação pela derrota do Trump, mas poderia ser também sobre a minha posição desfavorável ao Bolsonaro, à direita em geral e à radical e populista (incluindo a portuguesa) em particular, etc., etc.. Obviamente que este aviso serve também para o lado oposto: para aqueles amigos, alguns de carne e osso, que se foram afastando ou mesmo criticando-me por assumir críticas a um Governo português de esquerda... Para esses digo-lhes que a ideologia não me cega a verdade que busco.

DO PARAÍSO DA IGNORÂNCIA ATÉ À TENEBROSA COVID, PASSANDO SEMPRE PELO DOUTOR FILIPE FROES

Em 2017, que, contas bem feitas, foi há três anos, o Observatório Nacional das Doenças Respiratórias fazia um relatório e um comunicado de imprensa lancinantes: aumento de óbitos de 24% provocados por doenças respiratórias desde 2006, e um total de 22.767 mortes apenas em 2015, Alguém ligou? Nada! 

Aliás, parece que também ninguém ligava a um tal Filipe Froes, um pneumologista que bem clamava (não estoua  ser irónico) sobre os perigosos de uma "doença benigna", chamada gripe, que afinal, palavras dele (vd. texto em baixo), atingia 100 milhões de pessoas por ano só no Hemifério Norte, e que matava 500 mil também por ano. Mas isto era noutro Planeta, não era? Ou passámos apenas do 8 para o 80?

Nota: O comunicadop de imprensa pode ser acedido aqui. O relatório, com a parte do Dr. Filipe Froes, pode ser acedido aqui (pg. 42).





DO TOUREAR O POVO

A ministra Marta Temido diz estar "preocupada" com a letalidade da covid "que tem subido nos últimos dias”. Devia estar sim preocupada com as infecções que, tudo indica, estão descontroladas nos lares de idosos, e são eles que estão a morrer. Em vez de estar preocupada com aumentos de letalidade deveria sim revelar o verdadeiro estado dos lares e dizer o que está a ser feito para controlar esse desvario.

Entretanto, surge no Público, um professor e investigador do Departamento de Matemática do Instituto Superior Técnico (IST), de seu nome Henrique Oliveira, garantindo que "se as medidas deste ‘estado de emergência suave’ tiverem pouco efeito, podemos chegar às 100 mortes por dia". Balelas! Chegar-se às 100 mortes é patamar que se chegará com a actual incidência de casos positivos dos idosos, e não vai depender por isso de quaisquer resultados de estados de emergência, de muito duvidosa eficácia. Eu, que não tenho nenhum doutoramento em Matemática, já aqui apontei num post do dia 4 de Novembro, que, graças ao falhanço na protecção dos idosos (e tudo indica que seja nos lares, como já expliquei), será expectável atingirmos uma mortalidade entre os 82 e os 106 óbitos nas próxima semana ou daqui a duas (estimativas feitas com base em intervalos de taxas de letalidade para os grupos maiores de 60 anos). O problema, insisto, estará sobretudo nos lares, e seria bom que a DGS revelasse a verdadeira dimensão dos casos actuais. Escrupolosamente. Mas isso não acontecerá, porque politicamente não interessa, e arranjam-se assim manobras de diversão, e actores que queiram fazer favores ao Governo.

Em suma, a fasquia simbólica dos 100 mortos vai ser ultrapassada por causa dos lares. E o "estado de emergência" acaba introduzido sobretudo para mostrar que, se alguma coisa falhar (e vai falhar ainda mais), a culpa jamais será do Governo (que continua a falhar no controlo das regras a aplicar aos lares e no apoio aos idosos que lá vivem) mas sim do povo em geral.

Aliás, constata-se uma tónica comum em grande parte da Europa, que passa basicamente por os Governos tomarem medidas, e mais medidas, muitas delas inócuas, outras até contraproducentes, para controlar casos positivos, independentemente das mortes que houver. Querem mostrar sobretudo serviço com um objectivo claro. Se por um acaso as coisas correrem bem, os Governos sempre poderão dizer que foi em virtude das suas sábias medidas; se correr mal, os Governos podem sempre dizer que, apesar das suas sábias medidas, a degraça sobreveio por culpas do povo.

E vamos andar nisto. Até para o ano. E a nossa Propaganda Mediática, acriticamente, vai dar uma boa ajudinha. E garanto-vos, isto não é nenhuma teoria da conspiração. São evidências.



sexta-feira, 6 de novembro de 2020

DA PNEUMONIA E OUTRAS MALEITAS SEM IMPORTÂNCIA

O que eu dava para ver o Rodrigo Guedes de Carvalho ler na SIC os 13 pontos das conclusões do último relatório do Observatório Nacional das Doenças Respiratórias...

Já o José Rodrigues dos Santos, sem piscar o olho, podia ler a seguinte parte da página 6:

"Por dia, morreram 37 pessoas por doença respiratória. A idade média foi de 82,5 anos, mais elevada nas mulheres 84,4 anos, do que nos homens 80,8 anos. Se a este número acrescentarmos os óbitos por cancros da traqueia, brônquios e pulmão, 4074, poderemos dizer que por dia morreram 48 pessoas por doenças respiratórias. Dos 13474 óbitos por doenças respiratórias, em 6006 a causa de morte foi Pneumonia (44,6%). Este número é particularmente relevante, visto ser uma patologia potencialmente curável. Dos óbitos por Pneumonia, 94,3% tinham 65 ou mais anos e 87% tinham 75 ou mais anos."

Nota: O relatório pode ser consultado aqui (vd. pp. 20-21). 





DA (IN)EFICÁCIA DAS MEDIDAS

Obrigatoriedade de uso de máscaras nas ruas de Itália desde 7 de Outubro, quando os casos positivos eram 3.677. Ontem atingiu-se um máximo de 34.505. Quase 10 vezes mais em menos de um mês.

Um resultadão do caraças... 

P.S. Claro que haverá quem defenda que sem as máscaras teríamos 20 vezes mais, 100 vezes mais, 1.000 vezes mais. Talvez infinito mais. Teríamos os italianos já todos infectados. E talvez mortos. Se foi o chumbo que fez ruir o Império Romano, agora será esta pandemia.



quinta-feira, 5 de novembro de 2020

DO PERFIL DA COVID NA EUROPA, OU DAQUILO QUE SE VIU NA PRIMAVERA E DO QUE SE VÊ (POR) AGORA

Se o vírus fosse um ser pensante maquiavélico, por certo estaria a rir-se a bandeiras despregadas, porque muitos humanos, feitos baratas tontas, andavam como mil e uma supostas artimanhas para o combater (leia-se lockdowns,, recolheres obrigatórios, máscaras nas ruas, estados de sítios e trinta por uma linha).

Fiz dois gráficos com os países da UE-27, confrontando a mortalidade por covid registada no dia 3 de Novembro (média móvel de 7 dias, pelo que considera a mortalidade entre 28 de Outubro e 3 de Novembro) com o pico de mortalidade (média de 7 dias) durante a Primavera. Os valores para todos os países foram padronizados para a população de Portugal para permitir comparações válidas. vale a pena repetir que 100 na Espanha não são 100 em Portugal; são apenas 22.

Assim, pelo menos na Europa (UE-27), a pandemia da covid mostra aspectos muito interessantes: 

1 - Não existe um padrão de infecção-efeito na mortalidade comum no espaço europeu. Tal como na Primavera, existem países em que a covid é irrelevante; outros em que constitui um problema grave. Pensar que se resolve a questão repetindo soluções em todos os países (que é o que está a suceder) vai dar problema. 

2 - Dos 10 países da UE-27 que apresentam agora maior mortalidade por covid (padronizada à população portuguesa), 7 não tiveram primeira onda durante a Primavera.

3 - Dos 13 países que apresentaram uma primeira onda (subjectivamente, aqueles que tiveram um pico com mais de 25 mortes por dia), apenas Portugal e a Áustria apresentam, por agora, valores de mortalidade superiores à primeira onda.

4 - Os países com menores restrições (e que nem sequer impõe uso obrigatório de máscara), como a Suécia, Finlândia e Estónia, apresenta agora um nível de mortalidade irrelevante ou mesmo nulo.

5 - Apesar do pânico europeu aparentemente geral, de entre os países da UE-27, existem 8 países com mortalidade por covid que não me parece descontrolada (menos de 15 óbitos por dia face á prevalência de infecções respiratórias nesta época do ano), a saber: Irlanda (10), Suécia (4), Dinamarca (4), Alemanha (12), Finlândia (2), Estónia (0) e Grécia.

E pronto, isto é o que me apraz dizer-vos por agora. 

Fonte: Worldometers.


DOS VELHOS, DOS LARES E DAS FÁBRICAS DE CADÁVERES

A DGS, Governo e presidente da República, e uma " legião" de pessoas (aquelas que apoiam lockdowns, estados de emergência, restriçõesa torto e a direito, máscaras na rua, recolheres obrigatórios), nunca devem ter perdido muito tempo a analisar onde está o calcanhar de Aquiles na luta contra a covid. 

Nem tão-pouco eles querem entender que não se ganha nada se não se conseguir atenuar a mortandade que tem atingido, independentemente do mês, os maiores de 85 anos, mesmo em períodos em que a covid estava a matar pouco.

O gráfico que apresento mostra bem como tem sido a variação da mortalidade TOTAL nos maiores de 85 anos (média móvel de 5 dias para alisar variações diárias bruscas) desde o início da pandemia. 

Com a excepção de dois dias em Junho, houve sempre excesso de mortalidade, tanto nos meses com maior incidência de mortalidade por covid (Março, Abril, Maio e Outubro), quer nos outros meses. particularmente em Julho (um desastre inimaginável), mas também em Setembro. Novembro ameaça ser terrível. E aviso já: Janeiro costuma ser o pior mês, de longe. 

Causa-me raiva (é esse mesmo o termo) ver o Governo e a DGS a não terem querido sequer compreender (e, pelo contrário, arranjaram tipos como um Baltazar Nunes, do INSA, para branquear os efeitos de um SNS em estado comatoso) quais os motivos para o sistemático excesso de mortalidade nos mais idosos ao longo dos últomos meses. E sobretudo as mortes nos lares, onde estão 100 mil pessoas, com médias de idade acima dos 80 anos, com muitas comorbidades e, por isso, bastante vulneráveis. Entra ali a covid (e quem diz covid diz infecções respiratórias) e a mortalidade dispara como fogo em palheiro.

Na verdade, embora faltem explicações (e nesta altura deveriam existir), desde Março a mortalidade nos lares terá sido sempre muito elevada quer por causa da covid quer também por causa de outras doenças que deixaram de ter acompanhamento. A pandemia é apenas um problema. E não é o menor. E pouco ou nada se tem feito, tal como nada se tem inquirido e estudado. Não se compreende como não existem dados da DGS para se conhecer, cronologicamente, a situação dos lares. Acho incrível, sobretudo porque existem normas emanada pela DGS desde Março relativas ao controlo e contabilização dos casos nos lares. Não haverá ninguém para tratar essa informação? Será necessário, como sucede com um simples relatório diário geral, contratar uma empresa externa por ajuste directo?

Achar, com tudo isto, que se consegue controlar a entrada das infecções e as mortes nos lares fechando um país inteiro é achar que se consegue tapar o sol com uma peneira. Insistir em medidas que comprovadamente poucos efeitos produzem é apenas "comprar" mais peneiras para tapar o Sol, sabendo que a luz semre passará , porque o problema não é o Sol, mas sim a necessidade a ineficácia das peneiras por muitas que se usem. O problema está na peneira; portanto, mude-sea peneira como estratégia de vã tentativa de tapar o Sol.

Se se quer evitar a proliferação da covid nos lares (que resultam numa incidência da mortalidade que estimo ser oito vezes superior à dos idosos que não vivemo nos lares (vd. meu post de ontem) não se pode continuar no actual modelo de voluntarismo, a que acresceu apenas a realização de (muitos) testes e as restrições às visitas. 

Mais do que controlar se as pessoas saem de um concelho para o outro, ou se se juntam mais de 5 pessoas, é saber se os lares (os mais de 2.500 lares) cumprem objectivamente as regras de protecção, se os funcionários usam convenientemente máscaras e procedimentos de desinfecção, eem suma garantir um reforço de profissionais de saúde qualificado em cada lar para, entre outras coisas, garantir que há um cumprimento de regras e acompanharem os idosos do pontode vista clínico (quer para covid quer para outras situações). Mobilize-se meio para os lares e garanto que a mortalidade por covid e por outras doenças decairá. 

Se isso não se fizer, nos próximos tempos, mais do que nunca os lares serão "fábricas de cadáveres".

Fonte: SICO-eVM




quarta-feira, 4 de novembro de 2020

DO VERDADEIRO DESASTRE QUE AÍ VEM, OU DAS MEDIDAS QUE FALHARAM NOS LARES, OU DO COMO VAMOS CHEGAR AOS 100, OU DO COMO ME MANTENHO FIEL AO QUE SEMPRE DEFENDI

No dia 19 de Maio (vd. aqui) tive necessidade de escrever um Statement (já então era bastante atacado), cujos dois primeiros pontos eram os seguintes:

"1 - A covid-19 é uma doença perigosa sobretudo para os idosos, e especialmente para os maiores de 85 anos.

2 - A covid-19 não representa qualquer perigo relevante para a população com idade inferior a 55 anos, exceptuando-se, porém, os casos individuais de pessoas com alguma vulnerabilidade. 

Contudo, essas pessoas são vulneráveis a outras mais doenças."

Não alterei a minha postura, apesar de já ter sido catalogado de negacionista. Posto isto aqui, e apesar de, por imensas vezes, ter alertado para o problema dos lares, na verdade nunca se olhou para eles como se fosse o "cerne" da pandemia. São o cerne. E ainda há dias alertava para a preocupante tendência da incidência de casos positivos nos maiores de 80 anos, que indiciavam (mesmo ignorando-se dados oficiais) que os lares estavam a ter novamente problemas. E graves.

Como se via isso sem dados? Por via indirecta, Se à medida que se avança nos grupos etários (dos maiores de 20 em diante) a incidência diária diminui até aos 70-79, mas depois sobe significativamente, é porque algo se estranho se passa com a "protecção" dos maiores de 80 anos, E o que se está a passar é, sem tirar nem pôr, e por muito que se queira esconder, um descontrolo nos lares, que se vai pagar muito caro nas próximas semanas.

Vou apresentar aqui uns cálculos rápidos para demonstrar a verdadeira e terrível dimensão do problema dos lares.

1 - Estima-se que viviam em Portugal em 2019 (dados do INE) cerca de 675 mil pessoas com mais de 80 anos.

2 - Em todos os lares portugueses, que albergam cerca de 100 mil utentes, a idade média está acima dos 80 anos, podendo-se assim admitir que vivam fora dos lares 575 mil idosos desta faixa etária.

3 - Segundo informações do Governo, divulgadas a meio de Outubro, as mortes em lares representavam então 40% do total. Significa assim que, face aos números de hoje, terão assim já morrido 1.077 idosos em lares por covid (0,4 x 2.694 óbitos)

4 - Deste modo, tendo em conta que morreu um total de 1810 pessoas por covid com mais de 80 anos, então neste grupo etário terá falecido 733 idosos que não viviam em lares,

5 - Significa isso que a taxa de mortalidade por covid dos utentes dos lares (com mais de 80 anos) é de cerca de 10,8 óbitos por mil pessoas, enquanto que fora dos lares, para a mesma faixa erária, é

de apenas 1,3 óbitos por mil pessoas. Vejam bem; a taxa de mortalidade por covid nos lares é cerca de 8 vezes superior!

Isto para dizer que o Governo e a DGS têm de arrepiar caminho quanto antes nos lares, até porque sei de fonte segura que as infecções continuam a fluir livremente, e aumentou nas últimas semanas, de fora para dentro, por parte de funcionários

Tenho alertado, e quem me acompanha com isenção sabe bem disso, para dois aspectos fundamentais nesta pandemia:

1) não se pode deixar o SNS entrar (como já entrou) em estado comatoso, porque isso contribui para o aumento da mortalidade total, que acaba por ser pior do que a covid;

2) colocar uma ênfase especial (diria que quase todos) na protecção dos lares, com uma gestão profissional e "científica", caso contrário a mortalidade por covid atinge valores elevadíssimos, porque entrando nos lares a covid atinge uma rápida disseminação junto de uma população não só idosa como geralmente com muitas vulnerabilidades. O calcanhar de Aquiles inicial da Suécia foi esse (e pagou caro com muitas mortes), e quando conseguiu corrigir pode estabelecer uma estratégia racional sem restrições relevantes e sem máscaras.

Os tempos mais próximos, infelizmente, vão ser dramáticos, e vão impor-se restrições mais fortes e o recolher obrigatório vai ser uma inevitabilidade por razões políticas e psicológicas. Mas não pensem que as máscaras na rua e o recolher obrigatório resolvem os problemas se não se fizer uma mudança radical na abordagem aos lares, com imposição de regras muito rígidas de protecção contra as infecções, mas sobretudo intensificando o acompanhamento médicos desses idosos (ou seja, fazer o contrário do que até aqui, já que muitos viram consultas adiadas).

Os tempos mais próximos, dizia eu, vão ser muito maus, infelizmente, pelos erros que se estarão a cometer nos lares. Olhando para a evolução da última semana (28out-3nov) na incidência da covid nos mais idosos, em comparação com a semana anterior (21out-27 out), é de esperar que nos próximos sete dias a mortalidade pro covid se situe entre os 49 e os 64 óbitos, mas irá subir para valores entre os 82 e os 106 óbitos (estimativas feitas com base em intervalos de taxas de letalidade para os grupos maiores de 60 anos).

Muitos dirão que se está afinal a confirmar que a covid é mesmo uma terrível pandemia. Eu, porém, continuarei a dizer que é uma doença perigosa para os idosos e que se está a falhar, e rotundamente, nos lares. Não admitir isso é contribuir para um infindável tormento de mortes nos lares, e tormento para quem ficar cá fora, sofrendo restrições que acabam por ser infrutíferas. Porque o mal está sobretudo nos lares.

P.S. Faço notar que Portugal é o único país da Europa Ocidental que está actuamente com mais mortes (medida pela média de 7 dias) do que a que registada durante a “onda” da Primavera. Tem, ao dia de hoje uma média de 38 óbitos, quando o máximo de Abril foi 32. Ou seja, a situação portuguesa mostra uma evolução preocupante, mas, até agora, única nesta parte da Europa. Os países de Leste que estão com elevada mortalidade não tiveram praticamente óbitos por covid na Primevara. Já agora, a mortalidade média diária na Suécia nos últimos sete dias é de 4. Sem máscaras e sem recolher obrigatório. Talvez fosse boa ideia alguém do Governo deixar de ser rezingão, e ir ver o que eles fizeram nos lares. Perdurar nos erros é que é grave..

Fonte: DGS e INE.



DOS ESPECIALISTAS DA ESTRATÉGIA ANTI-COVID

Desde muito cedo, em Julho, alertei para o mortícinio, sem precdentes num mês de Verão, que se estava a registar. Ninguém ligou, porque os alertas foram feitos num blog e no FB. E eu sou quem sou, e não sou um reconhecido epidemiologista, nem virologista nem sequer médico. Sou, segundo consta, um não-especialista, um curioso, um tipo que está comodamente no sofá.

Entretanto, mesmo sendo um suposto não-especialista, analisei em Agosto o relatório do IPMA, o índice ÍCARO e a mortalidade do mês de Julho, tendo concluído que o excesso de mortalidade não podia ter sido provocada por qualquer suposta onda de calor, e que o tempo quente iria servir sim como bode expiatório. Escrevi, por exemplo, aqui e aqui

Dito e feito. Em meados de Setembro, veio o Doutor Baltazar Nunes, responsável pela divisão de epidemiologia do Instituto Ricardo Jorge (INSA) e consultor da DGS (este sim um verdadeiro "especialista"), garantir que a "culpa" das mortes em excesso em Julho tinha sido do tempo quente. Dizia ele então: “Se o excesso de mortalidade estivesse relacionado com, ou se a principal causa da mortalidade fosse a ausência ou diminuição do acesso aos cuidados, o aumento de mortalidade não teria um comportamento de subida e descida. É essa a principal razão pela qual acreditamos que o aumento da mortalidade tem a ver com estes três fatores.”

Um tipo comum ouve um especialista e fica convencido que o dito sabe mais do que um não-especialista... E, pronto, vaticina que o especialista tem razão, e que o suposto não-especialista (eu, neste caso) tem má-vontade contra o Governo, contra a DGS, contra a Ciência e contra tudo e contra todos, é um negacionista e um histérico.

Sucede, porém, que há outros investigadores que, enfim, não sendo consultores da DGS, fazem Ciência. Alguns estão na Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa. Esta semana, um desses grupos - constituídos por André Vieira, Vasco Ricoca Peixoto, Pedro Aguiar, Giorgio Zampaglione, paulo Sousa e Alexandre Abrantes - veio confirmar o que eu (um suposto não-especialista) havia já escrito em Agosto, explicitando que as temperaturas alcançadas em Julho "dificilmente podem explicar alterações fisiológicas que causem excesso de mortalidade desta magnitude", assentando baterais na redução dos cuidados médicos como explicação. Pronto, desmentiram o especialista Doutor Baltazar Nunes.

Mas o mais curioso disto tudo - ou mesmo bizarro e trágico - é saber que o Doutor Baltazar Nunes - o tal especialista, o tal que é responsável pela divisão de epidemiologia do Instituto Ricardo Jorge (INSA), o tal que é consultor da DGS, o tal que para safar o Governo culpou o Sol - também acumula funções de professor auxiliar convidado da dita Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa e membro integrado do Centro de Investigação em Saúde Pública (CISP). Tantos pergaminhos para depois vir ele, travestido de cientista, culpar o Sol apenas para desculpar o Governo... É por estas e por outras que adoro o modelo sueco. Lá não há destas torpes promiscuidades.

Nota: Relatório da Escola Nacional de Saúde Pública (vd. aqui).

Página do Doutor Baltazar Nunes na Escola Nacional de Saúde Pública (vd. aqui). 

Notícia do jornal i de 18/8/2020 em que o Doutor Baltazar Nunes culpa o Sol pelo excesso de mortes e desculpabiliza o SNS (vd. aqui).