terça-feira, 19 de janeiro de 2021

DO CAOS OU DA MENTIRA

Alguém me explique como, em Outubro, o Governo garantiu, via comunicado do SNS, que havia “17.700 para assistência à pandemia”, mas depois há um outro documento do SNS que refere que afinal são só 2.120 camas para doentes-covid (ver imagens), e entretanto o sistema entra em ruptura a partir das 3.500 camas. Estamos agora com 5.165 internados, e está tudo caótico e em cenário de guerra.
O Governo mentiu em relação às camas? Pensou que bastava fazer compras no IKEA e não era necessário pessoal médico? Ou andamos aqui a brincar com a vida das pessoas e num passa-culpas?
E como é possível ter gastado em testes infindáveis milhões em vez de reforçar as UCI ao longo do ano, onde parece estar o maior défice? 
[cada cama UCI custa entre 50 mil e 150 mil euros a ser implementada, equivalente ao que se gasta a fazer entre 1.000 e 3.000 testes PCR por dias, mas com mais trabalho)
Pasmo com a airosa forma como o Governo, com a ajuda da Imprensa, arranjou uma estratégia para nos tornar bodes expiatórios e perante a sua incapacidade de gestão da pandemia. E vamos todos pagar: os que morrem por esta incúria, e os que ficam.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

DA SUÉCIA, ONDE (AFINAL) OS VELHOS MORREM MENOS, APESAR DA PANDEMIA

Eu sei que vai haver muita gente a estrebuchar, mas eu não posso fazer nada: os números insistem em contrariar as "teses" apocalípticas.

O SCB (o INE sueco) divulgou finalmente os dados totais de 2020, e portanto, já podemos comparar Portugal com o famigerado país nórdico, que tanta "urticária" causa a muita gente.

A Suécia, aquele país que não quis usar máscara nem fechou o país nem teve derivas totalitaristas, mas que é acusado de matar velhos, a dando-lhes morfina, e que, portanto, teve 9.804 óbitos por covid... afinal viu a sua taxa de mortalidade (por todas as causas, obviamente) dos maiores de 65 anos baixar em 2020 comparativamente à média (2015-2019). 

No período 2015-2019, a média situa-se nos 39,1 óbitos por 1.000 habitantes deste grupo etária, e desceu no ano passado para 38,7. 

Ou seja, sem prejuízo de se ter verificado um aumento da mortalidade em termos absolutos no grupo dos mais idosos (+13,2%), o incremento da população na mesma faixa etária foi superior (+14,5%), logo proporcionalmente morreram menos. A maior mortalidade incidiu, além disso, nas faixas etárias onde, infelizmente, já se morria muito [por muito que se ignore], sendo aqui evidente um efeito directo da covid. Por exemplo, da população sueca com mais de 90 anos em 2019, cerca de 22,1% morreram. No ano da pandemia (2020), esse valor foi maior: subiu para 24,3%. Uma subida mas nem sequer catastrófica numa faixa etária já naturalmente muito débil.

Ao invés, em Portugal - o país da histeria colectiva, do tudo para a covid, e nada para o resto, e que deixou assim a população idosa que não morreu do tempo um pouco mais quente no Verão, chegar ao Inverno presa por arames, até ser "presa fácil" da vaga de frio e de infecções por SARS-CoV-2 em lares -; em Portugal, dizia, a taxa de mortalidade nos maiores de 65 anos cresceu de 43,8 óbitos por 1.000 habitantes para 49,4. Uma subida de meter medo. E isto tendo morrido com covid 6.972 pessoas, menos 2.872 do que na Suécia.

Ou seja, como já se sabia, nem só de covid se morre. E a Suécia mostra aqui que, perante uma pandemia, que sempre provocará mortes, conta mais a estratégia e a racionalidade do que a histeria e a irracionalidade.

Quanto à taxa bruta de mortalidade (para toda a população), Portugal cresceu de 10,8 para 12,0, uma subida que mesmo assim não é catastrófica, enquanto que a Suécia subiu de 9,1 para 9,5, um aumento pouco significativo.

Obviamente que todas as mortes são lamentáveis, e se lamentam,. mas uma sociedade tem de saber enfrentar as leis naturais da Vida. E a estratégia sueca salvou mais vidas a prazo do que a estupidez portuguesa que agora tem uma população débil, tanto em termos de saúde (colectiva e individual) como a nível socioeconómico.

Fonte: SCB (Suécia); SICO-eVM e INE (Portugal).


DO ZERO EM PORTUGAL OU DOS EPIDEMIOLOGISTAS DESENCARTADOS

Dez meses depois do início da pandemia deu-me para consultar a base de dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), com informação vinda da Ordem dos Médicos, para saber a evolução do número de profissionais de saúde em Portugal. 

Existem dados discriminados, desde 2011 até 2019, contendo o número de médicos pelas 91 diferentes especialidades, subespecialidades ou competências.

Informo o País que não há sequer UM ÚNICO médico na especialidade de electrofisiologia clínica e... de EPIDEMIOLOGIA.

Fui consultar directamente o registo da Ordem dos Médicos, que lista a nome de todos os médicos, de acordo com a especialidade. E nada. Nenhum (vd. imagem em baixo). No caso da Ordem dos Médicos, o registo é o actual.

Aquelas sumidades que se apresentam como tal,  na verdade não têm a especialidade. São epidemiologistas "desencartados". E isso talvez explique muita coisa desde o início da pandemia.

O mais trágico-cómico é existir um Departamento de Epidemiologia no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), mas sem qualquer médico com especialidade em Epidemiologia. E temos até uma Associação Portuguesa de Epidemiologia, embora presidida por uma investigadora doutorada em Saúde Publicas mas com formação inicial em Ciências da Nutrição. Um epidemiologista na Direcção-Geral de Saúde? Nada, claro.

Em 2009 tivemos uma pandemia (H1N1), felizmente sem consequências relevantes.

Em mais de 10 anos acharam os Governos que não havia necessidade de termos UM, pelo menos UM, vá lá, DOIS ou TRÊS epidemiologistas a sério (e não de brincar)...

Eis Portugal em todo o seu esplendor.

Nota: As imagens mostram o output da base de dados do INE. Para seguir directamente para os resultados pode usar este link e fazer a selecção pretendida e descarregar dados.






DA ÚNICA VANTAGEM DO ACTUAL CONFINAMENTO: COMPRAR CHÁ ÀS 9 E MEIA DA NOITE DE UM DOMINGO

Antes deste confinamento, as sumidades epidemiológicas achavam muito bem encerrar supermercados à 1:30 da tarde nos fins-de-semana, o que proporcionava temerárias enchentes matutinas sabáticas e dominicais.

Agora, pode visitar-se em plena noite um supermercado, vazio e seguro. Por exemplo, para comprar chá, que é coisa que bem falta faz ao Doutor Scimerdas que, durante a manhã, veio aqui, nos comentários do meu mural, vociferar uma asquerosa diarreia figadal com origem em neurónios desarranjados. Falta-lhe chá. Mesmo.





DO PONTO DA SITUAÇÃO - ANALISE E PREVISÃO PARA 17/1/2021

Como tenho dito, nos últimos dias tenho estado a fazer previsões sobre a mortalidade por covid com base na taxa de mortalidade e no número dos internados-covid, não para me armar em Zandinga (embora tenha acertado uma vez na mouche), mas sobretudo para acompanhar o estado do SNS. 

Tentarei agora apresentar diariamente dois gráficos actualizados aos dia: um com a previsão com base na linha de tendência (polinomial) e outra com base na taxa de mortalidade do dia anterior, confrontando também com a mortalidade expectável se o SNS estivesse com desempenhos similares a Dezembro (TM 2,5%) e a Outubro (1,5%).

O segundo gráfico é de dispersão dos internamentos com os óbitos, actualizado ao dia), servindo também para aferir se o SNS se encontra em colapso, algo que, de forma clara se começa a observar a partir dos 3.000 internamentos e se exacerba acima dos 3.500. Faço notar acima desse número de internamentos, a amplitude de valores (óbitos) pode ser bastante grande, revelador também de um completo descontrolo.

Obviamente que existe um factor que me parece determinante nos próximos dias: o aumento da temperatura ambiente, que pode condicionar, positivamente, o desempenho do SNS. Aliás, tudo indica que o dia 17 poderá ser baixar a fasquia dos 600 óbitos. Mesmo assim, será o 13º dia consecutivo com mais de 500 óbitos por todas as causas, um valor bastante elevado mesmo deduzindo os óbitos-covid. 

Mais uma vez chamo a atenção que o Governo indicava que existiriam mais de 17 mil camas para fazer face à pandemia. Como se vê, o sistema entra facilmente em ruptura a partir dos 3.500 internamentos.



domingo, 17 de janeiro de 2021

DOS BODES EXPIATÓRIOS OU DA CULPA DE BOLSONARO NO BRASIL E DOS PORTUGUESES EM PORTUGAL

Disclaimer: Não aprecio absolutamente nada Jair Bolsonarp, do ponto de vista ideológico e das suas intervenções (irresponsáveis, quase sempre), quer em geral quer em particular na gestão política da covid. Posto isto, vamos a factos

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Durante a pandemia, o Brasil atingiu um pico de óbitos por covid em 28 de Julho, durante o seu “Inverno” (hemisfério sul): 1.554 mortes. Entre Maio e finais de Agosto, a média móvel (7 dias) esteve sempre a rondar os 900 mortos por dia, tendo depois decrescido e aumentou de novo a partir de Novembro. Actualmente, os óbitos diários estão próximos de 1.000.

Ora, como se sabe, disto tudo, a responsabilidade e a culpa é de Bolsonaro. Nenhuma responsabilidade ou culpa existe para os Governos Estaduais. Muito menos é culpa ou responsabilidade da população.

Mas, vamos lá fazer um exercício simples. Olhemos para o Brasil e para Portugal com olhos decentes e sem estrabismo ideológico e sem miopias emotivas. O Brasil tem 211.755.692 habitantes (segundo o IBGE); Portugal apenas 10.286.263 habitantes. Portanto, o Brasil tem 20,59 mais pessoas do que Portugal.

Sigam então o meu raciocínio (alguns jornalistas já se vão perder): o pico de 1.553 brasileiros mortos naquele pico de Julho corresponde, proporcionalmente, à morte de 75 portugueses. Eh pá! Já tivemos dias acima de 75 mortes? Resposta: já. Tivemos 42 dias acima de 75 mortes. A sério? Claro que sim! E 32 desses dias foram desde 1 de dezembro último.

Pois é, isto de contar sem ter a noção das proporções dá erros destes. Notem: desde 1 de Dezembro, o Brasil (que vive o seu “Verão”) contabilizou 35.488 óbitos por covid, enquanto Portugal conta 4.132. Um jornalista dirá: morreram por covid, neste período, quase 9 vezes mais brasileiros do que portugueses. E assim é, se tivermos a inteligência de um cangalheiro a contar caixões.

Porém, se tivermos neurónios, também nos podemos aperceber que, afinal, os 35.488 óbitos no Brasil correspondem a 1.724 portugueses. Ou seja, afinal a mortalidade por covid desde 1 de Dezembro é 2,4 vezes superior em Portugal. E o nosso pico de mortes (166 no dia 15 de Janeiro) corresponderia a 3.417 mortes no Brasil. Alem disso, na última semana, os óbito diários em Portugal estão, por norma, mais de três vezes superior aos do Brasil.

Claro que se a situação no Brasil fosse agora similar à de Portugal, a culpa era do Bolsonaro. Aqui é dos portugueses. Quando as coisas correm mal no Brasil (e muito menos mal nos últimos tempos em comparação com Portugal), a nossa Imprensa pede a cabeça de Bolsonaro; quando começam a correr mal em Portugal, a nossa Imprensa pede a cabeça dos portugueses. 

E António Costa é um santo homem. A ministra da Saúde idem. E mesmo os quatro ministros que já se infectaram, são umas vítimas do desleixo do Povo.

Deixo-vos, por fim, para se entreterem a ver as diferenças, uma análise diária, desde 1 de Dezembro até 15 de Janeiro, sendo que os óbitos padronizados estão com uma média móvel de 7 dias, tendo em consideração a metodologia brasileira do registo.

E lembrem-se: a situação portuguesa é da culpa dos portugueses.  Repitam isso mil vezes. 

Fonte: Worldometers, INE e IBGE.


DA MORTE E DO PÂNICO

Na última semana tem ocorrido uma situação deveras estranha num país dito desenvolvido: um pico de mortes em meio hospitalar não é acompanhado por um crescimento no afluxo às urgências hospitalares. Julgo que apenas num cenário de terramoto é que seria suposto isto suceder: as pessoas que seguiriam para o hospital estavam já em tão mau estado que uma parte significativa acabaria por morrer; e as outras tão apavoradas ficam pelas réplicas que, mesmo sentindo problemas, não arredam pé dos escombros.

Reparem: nas duas primeiras semanas de Janeiro deste ano, apesar da existência simultânea de uma pandemia (que veio substituir, nesta época, os habituais surtos gripais) e de uma intensa vaga de frio, o afluxo de urgência reduziu-se 32,5% em comparação com o período homólogo dos últimos quatro anos (165.464 vs. 245.290).

Ao invés, a ocorrência de óbitos em meio hospitalar pelas mais variadas causas foi, para o mesmo período deste ano, de 4.922. Houve dias com mais de 400 óbitos, coisa inédita deste que existem registos. O pior ano anterior, para este período, era 2017 com 3952 óbitos em meio hospitalar. 

Temos obviamente que contabilizar, em 2021, o contributo dos óbitos por covid, mas deveríamos também deduzir os óbitos que previsivelmente ocorreriam de pneumonias decorrentes da gripe (que praticamente desapareceram), bem como as mortes que deveriam ser atribuídas a outras causas mas que pela metodologia covid acabam por ser culpa do SARS-CioV-2.

Mas a questão é essencialmente esta: em anos anteriores, as variações da intensidade dos surtos gripais e as vagas de frio tinham uma relação directa com o afluxo às urgência. Significa que se usarmos uma métrica (atenção: uma métrica é um indicador que fornece informação sobre variáveis não necessariamente correlacionadas) que cruze os óbitos em meio hospitalar com a afluência às urgência, essa métrica deve ser constante. 

Porém, vejam o que sucede nos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020. Esta métrica sofre ténues variações quer entre anos, quer entre dias do mesmo ano: Comparando estes anos, está relativamente estável entre os 13 e os 17 (óbitos diários nos hospitais por 1.000 utentes atendidos nas urgências). Normal, portanto.

Que sucede em 2021?  Dispara 30 óbitos por 1.000 utentes, tanto por causa do aumento significativo de mortes como pela redução do afluxo às urgência. Mais que duplica em comparação com quase todos os anos. Na segunda semana chega a ter dias com o índice em 37.

Estes valores mostram uma significativa anormalidade do SNS que reflecte o estado do país: perdeu o controlo da pandemia e das outras doenças, ganhou em pãnico da população. O resultado está num lamentável aumento das receitas dos cangalheiros. 

Fonte: SNS e SICO-eVM


DA BOLA DE CRISTAL DE UM ALDRABÃO

O Doutor Scimerdas ( Scimed - Ciência Baseada na Evidência) diz que apenas se equivocou porque viu “o relatório relativo a 4 semanas e não o relatório completo sobre o excesso de mortalidade associado à covid”. E diz ainda que citou na entrevista esse estudo, colocando mesmo o link para uma notícia. Sucede que essa notícia refere-se a um relatório do INE de 11 de Dezembro de 2020 (vd. aqui). A notícia também é de 11 de Dezembro de 2020 (vd. aqui).

A entrevista do Doutor Scimerdas é do dia 1 de Dezembro, ou seja, 10 dia antes.

Começo a ter medo do Doutor Scimerdas. Ele vê o futuro. Ele lê o futuro. Ele vê e lê relatórios hoje que serão escritos e publicados no futuro. Por isso, já viu que todos vamos morrer...

Lá diz o povo: mais fácil apanhar um mentiroso do que um coxo.



DO ESPUMAR DE RAIVA

O Doutor Scimerdas (vd. post anterior aqui) ficou danado por lhe ter posto o rigor com tanta pilosidade como a envolvente da caixa que lhe transporta o vácuo entre as orelhas. Prometeu-me guerra, mas para primeiro tiro foi fraquinho... Diz ainda que circula por aí que tenho a alcunha de Professor Pardal. Um elogio, neste caso. Escolho assim um dos meus heróis de infância como foto de perfil.

DA PATETICE TRAVESTIDA DE RIGOR

Há um médico que, nos últimos meses, zurze com termos pouco meigos em todas as posições e opiniões não-apocalípticas sobre a covid. É "dono" de uma página chamada  Scimed - Ciência Baseada na Evidência, e ainda há dias deu forte e feio na Joana Amaral Dias por ter dito na televisão que, no passado, houve um dia em que morreram 500 pessoas de gripe.

Teve toda a razão o Senhor Doutor Scimed, chamemos-lhe assim, em dar cacetada na psicóloga: efectivamente, nunca houve um dia com tantas mortes por gripe; houve sim alguns dias (p. ex., 2017), em pleno surto gripal, que ultrapassaram os 500 óbitos no total de todas as causas (a média em Setembro, o mês menos mortífero é de 270 óbitos totais por dia). E já houve também anos (Outubro-Maio) com cerca de 8.500 óbitos atribuídos a um surto gripal.  

Eu gosto muito de pessoas rigorosas e não suporto alguns erros. E outras coisas que também não suporto é ver ferreiros com espeto de pau; ou trolhas com telhados de vidro. 

Ora, deu-se o feliz caso de ter esbarrado entretanto com uma extraordinária entrevista, a todos os títulos, do dito médico (acompanhado pelo impagável doutor Gustavo 'vão tudo morrer' Carona), feita em 1 de Dezembro. Regressarei a ela, talvez, porque é um manancial. 

A páginas tantas, o Doutor Scimed responde a uma pergunta (ao minuto 10:10, vd. aqui) sobre o excesso de mortalidade então anunciada pelo Instituto Nacional de Estatística em finais de Outubro, da seguinte forma (sic, mas podem e devem confirmar no link).

"É assim. Segundo as contas do INEM (sic), o (sic) covid ficou com mais de 80% das mortes em excesso. OK, isto são contas do INEM (sic). Eu não olhei para as contas ainda. Percebo que as contas, olhando de uma forma simplista, aponta para esses valores que estão aqui a ser falados, mas de facto o INEM (sic) fez o estudo que diz que 80% são atribuídos ao (sic) covid".

Eu já desculpo que o senhor Doutor Scimed se refira à doença causada pelo SARS-CoV-2 colocando-lhe substantivo masculino. Ele não é obrigado a perceber de gramática. 

Já torço um bocadinho o nariz - mentira: acho divertidíssimo, digno de risota - quando o Doutor Scimed se refere por três-3-três vezes ao INEM (acrónimo de Instituto Nacional de Emergência Médica) como entidade responsável pelo estudo, quando os estudos demográficos são, em geral, e neste em concreto, feitos pelo INE (acrónimo de Instituto Nacional de Estatística). Portanto, estou muito interessado em saber se, mês e meio depois, o Doutor Scimed já olhou as tais "contas do INEM".

Por fim, e isto é objectivamente pior, o Doutor Scimed, assumindo-se que nem passou os olhos pela análise do INE (porque nem o acrónimo conhece), não mostrou o rigor que exige ao outros, e disse mais do que um disparate. Com efeito, a análise do INE referia - e bastava ler o primeiro parágrafo (vd. aqui) - que até 18 de Outubro a covid apenas explicava 27,5% do excesso de óbitos. No final do ano acabaria por rondar os 50%. Em todo o caso, muitíssimo longe dos "mais de 80%" atirados vergonhosamente ao ar pelo Doutor Scimerda.



sábado, 16 de janeiro de 2021

DO CAOS AO DESERTO EM 24 HORAS

Depois de terem perdido a fila de ambulâncias de ontem, os jornalistas não deviam perder a oportunidade de entrevistar em directo a ÚNICA pessoa que está, neste preciso momento, nas sala de Urgências (para atendimento) do Hospital de Santa Maria. 

Mas têm de correr mesmo, não vá ele ir-se embora entretanto, até porque só está com a pulseira amarela....


DA GRANDE FARSA

Depois de ontem um "oportuno" vídeo ter mostrado uma fila de ambulâncias nas urgências do Hospital de Santa Maria, estou à espera de ver o mesmo esta noite. Por agora, consultando o site do SNS estão apenas 4 pessoas a ser atendidas. No entanto, sabe Deus (ou se calhar nem Ele) se não estão, agora mesmo, a caminho umas 20 ou 30 ambulâncias para as fotografias.

Nem de propósito, hoje um administrador do Hospital de Santa Maria veio dizer que em "15 dias, a procura [hospitalar] cresceu 70%", traçando um cenário apocalíptico se as pessoas não se portassem  bem.

Eu, que já me devia chamar Tomé (embora não seja Santo), fui ver como estiveram as urgências, bem como os internamentos resultantes dessas urgências no Santa Maria, ou melhor, no Centro Hospitalar de Lisboa Norte, onde ele se integra (e é o principal hospital). Fui ver dados oficiais.

Pois bem, vejam os gráficos com dados do SNS. Oficiais, portanto. 

Entre 1 e 14 de Janeiro de 2021 houve 6.157 episódios de urgência neste centro hospitalar que contrasta com 10.196 episódios no mesmo período de 2020 (queda de 40%). Nos internamentos (vindos das urgências, que inclui entrada de doentes covid), entre 1 e 14 de Janeiro de 2021 houve 719 casos, o que contrasta com 1.055 em igual período de 2020 (queda de 32%). Notem também que os valores dos últimos dias disponíveis (13 e 14) nem são sequer os mais elevados de Janeiro de 2021.

Se compararmos estas duas semanas de Janeiro (1-14) com as duas últimas semanas de 2020 (18-31 de Dezembro) verificamos que houve apenas um acréscimo de 5% nos episódios de urgência (e não 70%), passando de 5.878 para 6.157 episódios. No caso dos internamentos, as duas primeiras semanas de Janeiro de 2021 tiveram apenas mais três casos do que as duas últimas semanas de Dezembro de 2020. Note-se que as afluências às urgências, mesmo com a vaga de frio, continuam abaixo dos valores mais baixos pré-covid em qualquer mês do ano.

É certo que os protocolos para a admissão de doentes-covid são mais complexos, mas basta de mentiras sobre mentiras sobre mentiras. Esta farsa não pode continuar. É pornográfica, porque estamos a falar em vidas humanas. Assustar, implicita e explicitamente, as pessoas para que não irem aos hospitais porque se cruzam com doentes-covid ou porque as urgências estão (falsamente) cheias é eticamente reprovável. E chega a ser criminoso.

Fonte: SNS




DO FUGIR POR ENTRE OS PINGOS DA CHUVA OU DA NECESSIDADE DE ACORDAR ANTES DE SE MORRER

Antes de 2021, contabilizavam-se apenas três dias com mais de 500 óbitos diários (desde que se iniciaram estes registos, em 2009). Neste nosso Janeiro, o nosso Inverno do Descontentamento, que conta por agora 16 dias, teremos em princípio com a contabilização de hoje, 12 dias consecutivos com mais de 500 óbitos e sete dias consecutivos com mais de 600 óbitos. O dia mais morífero é 11 de Janeiro com 661 óbitos.

Isto não é tudo por causa da covid, embora com a "narrativa" criada em redor do Natal e do Ano Novo, e dos abraços e beijos, e das máscaras supostamente que não se usavam, e dos ministros que afinal também ficaram infectados, tudo se centra agora na covid, e nada no resto. A Imprensa fala de covid. O Governo fala de covid. O Presidente da República fala de covid. Os candidatos a Presidente da República falam de covid. O Povo fala de covid. Os Intelectuais falam de covid. Ah, e também de livrarias. 

E quase ninguém fala do resto. E o resto é tudo. O resto é o caos que é, não sendo dito, culpa do Governo. É,.E deveria ser um ponto inicial para uma discussão. Para acção. 

O resto é um população, sobretudo débil, sobretudo idosa, ainda mais débil agora por desacompanhamento médico ao longo dos últimos 10 meses; que chega ao Inverno e apanha uma vaga de frio sem que haja um plano de contingência, 

Que chega ao Inverno e apanha uma vaga de frio com campanhas da DGS a apelarem para não correr para as urgências se se sentir doente. 

Que chega ao Invermo e apanha uma vaga de frio, e tem medo de ir às urgências se se sente doente, porque também vê agora na TV umas filas de ambulâncias plantadas em certos hospitais, apesar do número de atendimentos nas urgências estarem actualmente muito mais baixo do que em Janeiro de 2020 (p. ex., anteontem houve 11.224 episódios de urgência hospitalar; no mesmo dia em 2020 houve 19.679). 

O desastre em termos de Saúde Pública anda aí a ceifar vidas sem que ninguém questione o Governo. É tudo por causa da covid, não é? É só a covid que justifica que nos primeiros 3-4 dias de Janeiro a mortalidade estivesse na casa dos 400 óbitos diários, e agora estarmos bem acima dos 600, não é? 

É só por causa da covid que nas duas primeiras semanas de Janeiro tenham morrido 1.696 pessoas em Lisboa quando a média é de 1.080? É só por causa da covid que a mortalidade no distrito de Évora aumentou 78%., não é? E que o Alentejo inteiro (pouco habituado ao frio) está a ter uma enome mortandade neste Janeiro, sendo que o acréscimo não é tão grande no Norte (onde o frio é mais suportável pela população), não é? 

Morre-se só por causa da covid, não é? O Governo anda interessadíssima que se fale só de covid, assim se furtando de responsabilidades pela covid e tudo o resto, que é tudo. É toda uma arte de se fugir da chuva por entre os pingos da chuva. Não é para todos. António Costa está, neste aspecto, de parabéns como líder de um Governo que quer manter o poder. Porém, como primeiro-ministro de um país que deveria ser decente, não.

Apetece-me dizer-vos ao gritos: ACORDEM, ANTES DE MORREREM!

DO COLAPSO

Errei por 6 a previsão do número de óbitos de ontem, mas esse erro deve-se a um problema muito mais grave: a taxa de mortalidade nos internados aumentou um bocadinho mais (basta umas centésimas para tal acontecer). Faço nova previsão: 169 para o dia de hoje (16/1). Existe obviamente uma margem de erro, sendo que se o valor for mais elevado significa que houve ainda mais degradação do colapso no SNS; se for menor, uma melhoria.

Porém, nas minhas análises, apurei um aspecto mais relevante e preocupante: estes valores estarão sempre nesta ordem de grandeza enquanto, efectivamente, não se conseguir descer o número de internados para baixo dos 3.500. O Governo tem agora uma estratégia: como se fiou na sorte e não apostou num reforço de meios humanos e técnicos (anunciou apenas camas, que nem sequer parecem existir), exige agora que não fiquemos doentes. Se se morrer, a culpa é do doente. Imaginem no futuro alguém ter um acidente de trabalho, ser levado ao hospital e o encontrar fechado: morre mas a culpa é sua, porque foi descuidado e sofreu o acidente.

Notem que em 23 de Outubro existe um comunicado do SNS do onde se refere taxativamente que existe "um total de 17.700 camas para assistência à pandemia". (vd. aqui).

Como chego ao número de internamentos a partir dos quais o sistema entra em colapso. De uma forma muito simples: sendo os óbitos uma função dos internamentos, fui verificar se se verifica uma tendência linear à medida que os internamento aumentam. Até aos 2.500 intrernados é quase: por cada mil internados ocorrem cerca de 20 óbitos. Porém, a partir dos 2.500 internados, os óbitos já apresentam uma grande amplitude, e sobretudo a partir dos 3.500 internamentos (a situação actual), o desastre evidencia-se. Notem que em todos os cinco dias com mais de 4.000 internados, o número de óbitos diários suplantou os 140.

Se não houvesse colapso, e estivessemos perante um SNS bem oleado, a mortalidade de ontem (166 óbitos) seria alcançável apenas quando se registassem cerca de 6.500 internamentos. E, na verdade, com o actual número de internamentos deveríamos ter entre 100 e 110 óbitos.

Tendência para os próximos dias: os níveis de mortalidade vão manter-se nesta escala de grandeza. 





sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

DO CONTO DE NATAL COMO PARTE DA ANTOLOGIA "A GRANDE NARRATIVA"

Há toda uma narrativa, já enraizada no Povo, pela Imprensa e Governo, de ter sido o Natal e o Ano Novo que fizeram disparar em Janeiro os casos positivos, os internamentos e as mortes. 

Ou seja, a culpa foi exclusivamente das pessoas e dos seus encontros familiares e com amigos, e não é culpa da natureza de um vírus sazonal, nem é culpa dos contactos nos transportes ou no emprego, nem é culpa do Governo que não soube equipar o SNS com meios necessários para uma doença que, pelos protocolos impostos, necessitava de um reforço de meios para este Inverno.

Bem se sabe que a transmissão do SARS-CoV-2 é maior do que as de outros agentes infeciosos. Porém, também é certo que, nos outros Invernos e nos outros Natais e festividades do Ano Novo, as pessoas tiveram incomensuravelmente uma muitíssimo maior proximidade, o que deveria, se assim fosse líquido, ter desencadeado nas semanas seguintes muiíssimas mais infecções, e portanto muito mais gripes e outras infecções respiratórias.

Será sempre assim? Fui ver. E a resposta é. não!

Peguei nos registos do SNS das gripes e outras infecções respiratórias do dia 23 de Dezembro dos anos de 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020, comparando-os com o dia 14 de Janeiro do ano seguinte.

No período 2020-2021, embora com níveis muito mais baixos, é certo que as infecções respiratórias aumentaram. Porém, nos anos 2016-2017, 2017-2018 e 2019-2020, os casos de infecção respiratória em 14 de Janeiro eram inferiores aos registados na antevéspera do Natal anterior. Em 2018-2019 aumentaram, mas não me parece que tenha existido comportamentos diferentes das pessoas durante as festividades, Sucedeu assim porque, enfim, não se controla tudo, mesmo sabendo que existe uma sazonalidade nas infecções respiratórias, não se podendo determinar uma causa directa entre Natal/Ano Novo e aumento de infecções respiratórias.

Em suma, a ideia enraizada do Natal e Ano Novo terem feito disparar as infecções respiratórias, e, por dedução, os casos positivos de covid, carece de evidência. Mas faz já parte da Grande Narrativa de culpabilização dos portugueses.

Fonte: Monitorização da Gripe e Outras Infecções Respiratórias (SNS, aqui).