sábado, 17 de outubro de 2020

DO ESTADO DE SÍTIO E DO RECOLHER OBRIGATÓRIO

A loucura apossou-se da Europa e ameaça Portugal. Fala-se agora já em recolher obrigatório no nosso país, vá-se lá saber o efeito de não andar na rua para os níveis de infecção.

Tudo bem: é sempre giro para um político democrata ostentar na lapela um decreto típico das ditaduras.

Porém, olhando para este gráfico, apenas tenho uma dúvida: o recolher obrigatório em Portugal justificar-se-à pelas 172 mortes da covid na primeira quizena de Outubro, ou antes pelas 446 mortes em excesso por causas não-covid, muito devido ao estado de sítio em que se transformou o nosso Serviço Nacional de Saúde?



DA EVIDÊNCIA DA ESTUPIDEZ DOS TRAPOS NAS RUAS OU DA ITÁLIA COMO EXEMPLO

Portugal prepara-se para impor a obrigatoriedade do uso de máscaras nas ruas. DevÍamos olhar para o caso da Itália antes de nos abalançarmos para estas aventuras face à fraquíssima evidência de efeitos positivos de se andar horas sucessivas com "trapos nas fuças", que são, aliás, propiciadoras de usos inadequados que podem, outrossim, auxiliar as infecções. Aliás, esse risco constitui uma das razões para a Agência Sueca de Saúde sempre ter optado por não colocar o uso das máscaras sociais na sua estratégia.

A Itália, como se sabe, impôs no dia 7 de Outubro (e antes disso, no dia 3 em Roma, como assisti in loco) o uso obrigatório de máscaras nas ruas. Entre 5 e 7 deste mês, este país tinha registado uma média diária de 59,7 casos positivos por milhão de habitantes, um valor relativo então inferior à Suécia (79,9 por milhão), onde a máscara não é obrigatória em qualquer circunstância. A dimensão dos casos positivos na Suécia não parece estar a incomodar em demasia as autoridades suecas, até porque a mortalidade por covid está baixa e controlada. Mas a Itália e seus políticos entraram em pânico com uma subida de casos positivos (ai os falsos positivos, o que fazem), mesmo se a mortalidade por covid está abaixo dos 10% dos níveis de Março e Abril.

Ora, mas admitamos que seja legítimo e prudente que sejam tomadas medidas. Contudo, a serem tomadas medidas, talvez, digo eu, sejam no pior dos casos um placebo. E que jamais façam a situação ficar pior do que não mexer. 

Com efeito, se as máscaras sociais nas ruas fossem eficazes, seria suposto que na Itália as infecções registassem uma fortíssima diminuição a partir do dia 13 de Outubro (contabilizando  5-6 dias de período médio de incubação). 

Porém, surpresa (ou talvez não), vejam o que está a acontecer em Itália. Enquanto a Suécia manteve, no período 14-16 de Outubro), sensivelmente o mesmo número de casos positivos (média diária de 80,9 por milhão), a Itália, em vez de ter um decréscimo (era esse o objectivo, não?), acabou tendo um acréscimo de 142%! Ou seja, passou de 59,7 casos diários nos três dias anteriores à imposição das nas máscaras na rua para 144,4 casos diários já no período de plena eficácia da média. 

Se isto não é um tiro nos pés, não sei já o que diga... E Portugal apresta-se para seguir esta linha, não é? Boa sorte!



DO MAL DOS LARES

Vou fazer umas contas muito simples para se ter uma melhor percepção sobre o maior impacte da covid nos lares, não apenas por agregar população muito idosa em final de vida como por causa dos problemas de infecção descontrolada ocorridos em alguns. Nesta simples análise evidencia-se ainda mais ser a covid um mal dos lares, que agrega 100 mil utentes. 

De acordo com a DGS, até ontem tinham morrido por covid 860 utentes em lares, pelo que fora dos lares terão  morrido 1.289 pessoas. Destes 1.190 tinham mais de 60 anos.

Ora, face à capacidade dos lares em Portugal, temos então até agora uma taxa de mortalidade próxima de 0,86%. Daqui se infere que havendo então 2 milhões de pessoas com mais de 65 anos vivendo fora de lares (por simplificação exclua-se a população em idade activa e considere-se para este grupo etário os 1.190 óbitos acima referidos), temos então uma taxa de mortalidade de apenas 0,06% para este grupo.

A taxa de mortalidade para a população em idade activa é estatisticamente irrelevante.

Note-se que não há informação sobre a taxa de mortalidade nos lares. Porém, a taxa de mortalidade anual para os maiores de 85 anos ronda os 15% e para o grupo dos 80-84 anos de 5%. Daqui resulta duas coisas: a covid tem um impacte muitíssimo maior nos lares, mas não parece indiciar ser uma doença que globalmente esteja a mostrar-se catastrófica (por representar uma taxa de mortalidade inferior a 1%). Aliás, nos lares, cada vez mais relevante parece ser uma avaliação rigorosa do impacte dos efeitos colaterais da estratégia anti-covid, em especial da mortalidade no Verão e dos efeitos da suspensão de muitos cuidados médicos essenciais em idades mais avançadas.



DA IRONIA COM UM TRAPO NAS FUÇAS

Nas orientações programáticas 2017-2020 do Programa Nacional para as Doenças Respiratórias, surge como Visão, «vivermos num mundo em que todas as pessoas respirem livremente"...



sexta-feira, 16 de outubro de 2020

DO LOBO MAU

Morreram 21 pessoas ontem por covid. Este mês já vamos em 172 mortes. Marcelo Rebelo de Sousa ameaça com recolher obrigatório, António Costa com "trapos nas fuças" nas ruas... Entretanto, tudo muito bem, com o SNS, como já se torna habitual : excluindo as tais 172 mortes por covid, o excesso de mortalidade total (em função da média) na primeira quinzena de Outubro atingiu os 446 óbitos, cerca de 2,5 vezes superior à covid... Entretanto, Cristiano Ronaldo sobrevive com esforço à infecção. 



DO PAÍS QUE NÃO SABIA QUE SE MORRIA E QUE IGNORAVA HAVER INTERNAMENTOS

 Antes da pandemia da covid, tinha consciência de haver muita gente que ignorava a realidade. Agora, com a pandemia, pasmo em saber que a ignorãncia atinge até muitas das nossas elites pensantes, mesmo aquelas com talento. A pandemia da covid parece ter surpreendido muita gente como se o SARS-CoV-2 tivesse tido o condão de nos ter retirado, pela primeira vez, a imortalidade. 

Entretanto, agora, o "horror" às mortes por covid foram "substituídas" pelo "horror" dos internamentos, contabilizando-se os casos positivos à unidade (ainda agora no café ao lado ouvia um "debate" sobre a gravidade de se ultrapassarem os 2.000 casos positivos) e o crescimento dos internamentos. Ontem aumentaram em mais 22 os internamentos, dos quais mais cinco em UCI, tendo morrido 21 pessoas. A situação, embora lamentável, não parece fugir muito do padrão das doenças respiratórias, que em anos anteriores se mostram até de maior perigosidade, causando muitas mais mortes e internamentos.

De acordo com dados oficiais, coligidos pelo Eurostat, as doenças respiratórias (excluindo cancros e tuberculose) mataram em Portugal, no ano de 2015, cerca de 126 pessoas por 100 mil habitantes, ou seja, um total de 12.852 óbitos nesse ano, o que dá 32 mortos por dia. Destes, cerca de 16 mortes diárias (imaginem no pico do Inverno) foram de pneumonias, em grande medida provenientes de gripes. Lembram-se de algum político ter imposto estado de emergência ou calamidade e o diabo a quatro?

No caso dos internamentos por doenças respiratórias, por regra, constituem cerca de 10% do total ao longo do ano. Os internamentos por pneuonias (sobretudo bacterianas, que até tem vacina) atingem os 117 por dias, sem grande variação entre 2009 e 2016, de acordo com o relatório do Programa Nacional para as Doenças Respiratórias 2017 do Ministério da Saúde. Ou seja, antes da covid (que, aliás, indirectamente fez decair as infecções respiratórias em 60%, o que significa menos hospitalizações por pneumonias este ano e muito menos mortes), não só havia internamentos por doenças respiratórias como mais mortes por doenças respiratórias. 

Mas que interessa isso? Vale a pena escrever alguma coisa mais sobre isto quando 0o pânico está reinstalado, e nessa "guerra", onde a DGS claramente esconde informação? Sabe-se ao dia quantas mortes por (ou com) covid, mas nunca se sabe (nem a DGS quer que se saiba) quantas mortes estão, simultaneamente, a ocorrer por pneumonias. Isto é, inadmissível, mas que interessa que eu e uns quantos esbracejem? 

As pessoas estão já "amestradas" pelo pânico; as elites e imprensa, ignaras em matemática e em contextualizar a realidade, ajudam a "formatar" um estranho consenso. Temo, muito em breve, um colapso social, económico e anímico. O vírus não é inteligente, mas conseguiu tornar-nos, como sociedade, em autênticos burros sem capacidade de racionalizar. Os Governos, esses, os dois países que acham que trapos nas fuças é que resolvem os problemas, estão a viver momentos de glória: mandam como déspotas perante um povo encarneirado e agradecido. Vai ser difícil reerguermo-nos como sociedade, e recuperar direitos.




DA MATEMÁTICA PARA JORNALISTAS TOTÓS

Títula o CM: “Maioria das camas ocupadas em Lisboa”, justificando no lead que das 97 camas de UCI destinadas a covid estão ocupadas 64. No caso de camas de Enfermaria diz-se que estão ocupadas 420 em 517 camas. 

Até aqui tudo bem: dá 66% e 81%, respectivamente; portanto é maioria. Sucede, porém, que isto pode mudar de imediato porque existe capacidade para subir rapidamente para até 917 camas de Enfermaria e 185 camas de UCI. Ou seja, basicamente, estamos com uma taxa de ocupação de 46% e 35%. Isto não é maioria. E até podemos estar em maioria, com 50,1%, e estarmos com muita folga.

O mais absurdo é o próprio CM auto-desmentir o título com um destaque em que escreve: “Ocupado um terço do máximo de camas em cuidados intensivos”. Se o nível da matemática dos jornais anda neste nível, como se pode alguma vez  ter a esperança que compreendam o teorema de Bayes que explica como os falsos positivos campeiam por aí só para criar negócio e pânico.




quinta-feira, 15 de outubro de 2020

DO VÍRUS BONZINHO E MONÓTONO

Peço desculpa por vos apresentar um gráfico monótono. Calculei, através dos boletins da DGS, a evolução da percentagem diária desde 1 de Setembro dos casos activos de covid que não mereceram sequer "honras" de internamento. Ou seja, a razão entre não internados e casos activos em casa dia.

Apesar de os casos activos terem aumentado quase 150% no último mês e meio (passaram de 14.573 em 1 de Setembro para 36.085 em 14 de Outubro), a percentagem de casos sem internamento manteve-se monotonamente estável, sempre na casa dos 97%. Se este vírus não é previsível, não sei o que é previsível. Aliás, meti uma casa decimal nas baras do gráfico quase apenas como prova de ter feito mesmo os cálculos 🙂 .

E o SNS anda suspenso por causa disto. E as restrições vão aumentar por causa disto.




DOS CÃES DE FILA, DAS MÉTRICAS E DO BULIÇO HOSPITALAR

A nossa inqualificável imprensa, depois de pegar caninamente no tema "casos positivos", segue agora abutremente para o tema "ocupação hospitalar". Tudo vale para alarmar; tudo vale para impor trapos nas fuças; tudo vale para o controlo por smartphone com direito a multa para os incautos; tudo vale para a contínua "prostituição jornaleira" a troco de uns vinténs por cliques e visualizações. A nossa imprensa, perante a covid, tornou-se o "cão de fila" de António Costa.

Como antigo jornalista começo a sentir asco de muitos jornalistas, e lamento por outros que (re)conheço bons mas que se calam.

Vem isto a propósito, portanto, da alegada iminência do esgotamento das camas hospitalares por causa do crescimento de casos positivos, quase todos assintomáticos, porque obviamente quase todos falsos positivos.

Como continuo a fazer para mim o trabalho que a imprensa não faz, tirei um bocadinho desta tarde para fazer nova análise. Demorou-me, talvez, uma hora. Aqui a exponho.

Existem diversas métricas para medir a actividade hospitalar, mas vou aqui apresentar-vos uma que me parece duplamente aceitável, porque não apenas detecta situações de anormalidade (picos de actividade anormal) como a compara de forma diacrónica (evolução ao longo do ano).

Essa métrica é a mortalidade diária em unidades de saúde. Julgo que se pode usar esta métrica como um indicador (atenção, é um indicador, o que não significa que exista uma correlação de 1 com a actividade hospitalar), porque os valores da mortalidade em unidades de saúde mostram, por um lado, a variação na ocorrência de doenças agudas e/ou de internamentos, e por outro detectam rapidamente situações anómalas num determinado período. Além disso, grandes subidas na mortalidade em meio hospitalar (em comparação com a média) pode indiciar (atenção, digo indiciar) algum grau de colapso.

Ora, usando os dados do SICO-eVM, e confrontando com a média (2014-2019), pode-se concluir que a actividade hospitalar, usando a métrica da mortalidade nas unidades de saúde, está actualmente um pouco acima da média, mas muito abaixo de outros períodos.

Com efeito, mesmo antes da covid ter cá chegado (e sendo uma situação "normal"), a mortalidade diária em meio hospitalar costuma estar entre os 230 e 250 óbitos em Janeiro e Fevereiro. No presente mês de Outubro ronda os 190 óbitos por dia, sendo que apenas cerca de uma dezena são por covid. A variação de Outubro deste ano, em relação à média, tem sido inferior a 20 óbitos.

No entanto, aquilo que chama até mais a atenção, não é a métrica da mortalidade em meio hospitalar ser ainda bastante inferior a Abril (no pico da covid). Na verdade, o mais absurdo é a nossa imprensa não ter sequer questionado o Governo para a situação de Julho e de Setembro, quando a mortalidade diária em meio hospitalar, numa altura em que a covid matava três pessoas por dia, disparou para níveis absurdos. Em cerca de duas semanas de Julho, a mortalidade nas unidades de saúde ultrapassou continuamente os 200 óbitos por dia, chegando mesmo a ultrapassar os 230 durante alguns dias, quando seria expectável (média) menos de 170 óbitos por dia. Em Julho deste ano morreram em meio hospitalar 6.270 pessoas, sendo a média de 5.142. Ou seja, morreram a mais 1.128 pessoas (36 a mais por dia).

A anormalidade de mortes em meio hospitalar durante o mês de Julho teve uma magnitude bem superior à registada em Abril e Março (diferença entre mortalidade em 2020 e a média). Em Setembro a situação repetiu-se, embora em menor dimensão, mas mesmo assim foi pior do que está a suceder em Outubro. A isto a nossa malograda imprensa, népias, nicles. Andou a dormir. Acordou agora, feroz.



DA INDIGÊNCIA JORNALÍSTICA OU DA NECESSIDADE DE JÁ NÃO DEIXAR PASSAR CERTAS COISAS EM CLARO

Uma jornalista do Público, Alexandra Campos, que se apresenta com 25 anos de jornalismo e "várias acções de formação em Jornalismo de Saúde", publicou, agora mesmo, uma peça que titula "Hospitais de LVT: esgotada mais de 80% da capacidade de internamentos e dois terços dos cuidados intensivos". Isto merecia quase um despedimento, por dois motivos:

1) Esgotamento provém de esgotar, isto é, consumir, gastar ou secar até á última gota, espécime, artigo, unidade, ou cama, neste caso (vem nos dicionários). Não há um esgotamento a 80%, a 70% ou a qualquer outro número. Esgotar é a 100% (e usar aqui a percentagem é redundante). Não é admissível que alguém, e muito menos um jornalista de um periódico que se quer credível, possa usar o verbo esgotar neste caso, e muito menos acoplar uma percentagem que não seja de 100%. Excepto se for mau jornalista ou queira intencionalmente fazer mau jornalismo para alarmar as pessoas.

2) Para quem se arroga de ter, no currículo, "acções de formação em Jornalismo de Saúde", convenhamos que a jornalista Alexandra Campos deveria saber enquadrar a actual procura com aquilo que habitualmente sucedia sem covid. Por exemplo, no ano de 2019, em Outubro tinhamos, nos hospitais de LVT (Lisboa e Vale do Tejo), uma taxa (anual) de ocupação que variava entre 79,1% nos hospitais de Lisboa Ocidental e 101,3% no hospital de Vila Franca de Xira (significando que já houvera, ao longo do ano, situações de efectivo esgotamento). Ou seja, estar próximo do esgotamento (e estar próximo do esgotamento não é estar esgotado) é a situação normal dos nossos hospitais com ou sem covid. E não há, na peça da jornalista do Público, qualquer enquadramento. Eu chamo a isso mau jornalismo.



DO NEGÓCIO DAS MÁSCARAS: UM SONHO ATÉ PARA A COLUNEX

Quando se vê que até a Colunex já facturou, em ajustes directos, durante a pandemia, mais de um milhão de euros na venda de... camas, perdão, de máscaras faciais, apercebemo-nos das razões para muita gente fazer figas para que a obrigatoriedade dos "trapos prás fuças" nas ruas seja aprovada pela Assembleia da República. É todo um novo mercado que se abre!

Nota: informação disponível na BASE - Contratos Públicos Online (imagem mostra um dos ajustes directos).




DOS TRAPOS NAS FUÇAS NO "REINO DO COSTA" E NA REPÚBLICA DA FINLÂNDIA

Enquanto em Portugal se continua a achar que pôr um trapo na cara, até nas ruas, e obrigar ao uso de uma app (StayAwayCovid), são soluções racionais e científicas para controlar a covid (querendo-se assim instalar um verdadeiro controlo censuratório e pidesco), na Finlândia - o pais da UE-27 com menor mortalidade relativa por covid (apenas 30 pessoas nos últimos 135 dias, i.e., uma morte por covid a cada cinco dias) - a máscara continua a ser apenas uma recomendação. E uma recomendação mesmo nos transportes públicos.

De facto, existem outras estratégias mais eficazes, e sobretudo assente numa "política" de responsabilidade e de bom senso, mas assente num pilar fundamental: a correcta gestão dos equipamentos de transportes públicos (que constitui, não duvidem, o maior risco de infecção, apesar daquilos que os Froes desta república digam). 

Enquanto se achar que em Portugal o problema está em encerrar cafés às 8 da noite, e não no caos dos transportes públicos, não vamos a lado nenhum. 

Enquanto se achar que a protecção dos idosos se consegue mantendo o SNS a meio-gás para as outras enfermidades, não vamos a lado nenhum. 

Enquanto se achar que o problema são os casamentos e baptizados, e não o descontrolo das infecções nos lares (o caso em Beja, com 83 infecções entre 90 utentes idosos, é mais um exemplo), não vamos a lado nenhum. 

Enquanto se achar que conta mais o número de casos positivos (grande parte, falsos positivos) do que as mortes por todas as doenças (incluindo-se a covid), então não vamos a lado nenhum... 

Ou melhor, vamos todos, independentemente da idade e vulnerabilidades: vamos todos para a loucura, ou até para a morte, mas por outras enfermidades; e não tanto por covid.

Em todo o caso, uma esperança para a Humanidade: observar a racionalidade nas orientações dos transportes públicos na Finlândia chega para acreditarmos que nem tudo está perdido. A racionalidade continua a existir na raça humana, apesar de ter feito férias em muitos hemisférios. Por exemplo, no site do Helsinki Region Transport, salienta-se que o uso de máscara no interior dos veículos não é obrigatório, embora recomendável, e que se alguém "estiver usando uma máscara e perceber que outra pessoa não está usando", se espera que essa pessoa"não comente nada sobre o assunto".

Além disso, "os motoristas estão isentos da obrigação [de usar máscara] porque nos serviços da HSL a maioria trabalha em cabines de segurança, ou seja, eles estão separados dos passageiros por uma barreira de plexiglass", até porque o uso continuado da máscara não parece contribuir melhorar, pelo contrário, uma tarefa essencial: "prestar atenção à segurança no trânsito durante todo o turno".

Um outro aspecto essencial: apesar da redução no uso de transportes públicos, a Finlândia não reduziu a oferta como em Portugal. 

Nota 1: Algumas informações sobre a política de transportes em Helsínquia podem ser vistas aqui, em inglês.




DO RIDÍCULO

Escreve o Correio da Manhã que Cristiano Ronaldo viajou numa ambulância aérea até Turim com “um médico, capaz de proceder a uma reanimação, no caso de um cenário grave”.... O homem está assintomático, apenas com teste positivo à covid. E já agora, havia pára-quedas?



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

DO ADEUS À RACIONALIDADE

Vivemos tempos absurdos nesta Europa que foi de Luzes. O Governo de Portugal está prestes, enfim, a obrigar ao uso de máscaras na rua (nenhum dos maiores partidos se oporá), só porque outros o fazem e o Cristiano Ronaldo recebeu um telefonema de melhoras de Marcelo Rebelo de Sousa mesmo não estando doente, mas só com teste positivo.

No meio disto, as nossas sumidades epidemiológicas (Filipe Froes à cabeça, seguido a alguma distância de Pedro Simas e de Ricardo Mexia) dizem amen às loucuras da DGS e do Governo. Parece que ninguém com responsabilidades na nossa Saúde Pública quer ver que a nossa "maior pandemia" é sim o estado de sítio do SNS, e que a covid não se ataca simplesmente com imposição de trapos nas fuças, restrições absurdas e testes à maluca,

Mas onde mais se destaca o absurdo destes tempos é na constatação de serem os dois países da UE-27 com as actuais menores taxas de mortalidade por covid (padronizada à população portuguesa) que nem sequer tornam a máscara de uso obrigatório em nenhuma circunstância (vd. quadro). A Finlândia faz apenas recomendações (mas não obrigatórias, i. e., not mandatory) em muito específicas circunstânicas, em função de três níveis de risco (vd. link em baixo). No caso da Suécia, que já foi o patinho feio da UE-27, a sua Agência de Saúde Pública nunca quis máscaras, e chega mesmo a considerar a existência de um maior risco de infecção se estas forem usadas de forma inadequada (vd. link em baixo). Nestes países privilegia-se, sim, o distanciamento social (evitando-se ajuntamentos sobretudo em transportes públicos), a desinfecção das mãos e o confinamento quando houver sintomas compatíveis com covid.

Uma outra questão que me parece absurda é o histerismo reinante em gande parte da Europa, onde fica patente a manifesta ignorância sobre a real situação dos diversis países, muito fruto de uma "pandemia de testes"que "fabrica casos positivos" mas não causa muitos mortos. Com efeito, países que entraram em pânico recente (impondo novas e mais duras restrições), como a Espanha e sobretudo a Itália e a França, encontram-se agora numa fase mais favorável , em termos de mortalidade, em comparação aMarço, Abril ou Maio. A Itália, que na semana passada impôs máscaras na rua (os casos, porém, aumentaram), tem o equivalente a metade (5) dos mortos diários por covid de Portugal (10). Portugal, por sua vez, apresenta níveis de mortalidade muito compatíveis com infecções respiratórias nesta época do ano (e as pneumonias quase desapareceram).

Os dois únicos países que considero estarem em situação mais preocupante são a Roménia e a República Checa (e sobretudo este país pela repentina subida da mortalidade), embora tenham sido poupados à vaga que atingiu a Europa Ocidental na Primavera. Mas esses países estão até fora do espectro histérico da impresa ocidental.

Enfim, termino por aqui: acho que já só ando a escrever para manter alguma da minha lucidez neste mundo desvairado. O Governo, entretanto, vai fazendo render os testes (que nos custam 3 milhões de euros por dia) para manter a destruição do país e o colapso do SNS. Destruir para reinar parecer ser o lema actual,

Link do Finnish Institute for Health and Welfare, aqui

Link do Public Health Agency of Sweden, aqui.




DAS T-SHIRTS QUE ENCOLHEM ATÉ AOS GORDOS AJUSTES DIRECTOS DE 22 MILHÕES DE EUROS À CONTA DA COVID (UMA HISTÓRIA LUSITANA)

Há 10 meses, se alguém andasse buscando por empresas de brindes que fizessem estampagens de t-shirts, porventura depararia com a ENERRE, uma empresa conhecida sobretudo por comercializar brindes e outros artefactos de merchandising. 

Não ficaria, contudo, bem impressionado com as avaliações de clientes: no Google, em 38 comentários, 15 são de 1 estrela (em 5). Um dos clientes afiança que «a qualidade dos produtos é baixa, os atrasos são constantes. O atendimento ao cliente do péssimo”. Outro, assegura que eles, a ENERRE, “pensam em tudo, menos no cliente», dando uma dica: “se quiserem estampados em preto, peçam em branco”. As queixas não são apenas de índole cromática. Um outro cliente lamenta que «sempre que a roupa é lavada, a roupa encolhe cada vez mais”, acrescentando que “só com 5 ou 6 lavagens, uma sweat tamanho L já está mais pequena do que roupa de 14 anos”. E, para terminar, mais um decepcionado cliente acusa a Enerre de vender gato por lebre: “Tshirts? Parecem tops…”.

Enfim, tudo isto se passou, de acordo com a data destes comentários, antes do início da pandemia, mas serão, porventura, frutos de más-línguas. Na verdade, os qualificativos da ENERRE só podem ser muito melhores. Excelentes, até. Talvez até fantásticos, tanto assim que diversas autarquias, alguns hospitais e até o Estado-Maior-General das Forças Armadas não duvidaram ser esta empresa, com estabelecimento ali para os lados da Matinha (Lisboa, vd. foto), a adjudicante ideal para, sem concurso público, e portanto por ajuste directo, lhes venderem uma parafernália de materiais e produtos de protecção contra a covid. 

Foi coisa pouca: desde Abril até 8 de Outubro de 2020, a ENERRE já encaixou, por via de 89 contratos por ajuste directo relacionados com a pandemia, a exacta maquia de 22.578.166,94 euros. Vamos aqui pôr em extenso, como se fosse um cheque passado pelos contribuintes: vinte e dois milhões, quinhentos e setenta e oito mil, cento e sessenta e seis euros e noventa e quatro cêntimos. 

Acresce ainda a esta pecúlio, o único contrato ganho por concurso público (ou seja, a ENERRE terá tido concorrência) no valor de uns “trocados”: 13.500 euros.

Para se ter uma ideia do Euromilhões que saiu aos gerentes da ENERRE – e, ironicamente, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) também lhes fez ajustes directos para material relacionado com a covid –, durante o período homólogo do ano passado (Abril-14 deOutubro) esta empresa apenas conseguiu arrecadar 122.914 euros a partir de entidades públicas. Ou seja, comparando com 2019, estes sete meses e meio do ano de 2020 registou um crescimento da facturação, apenas considerando os contratos públicos associados à covid, de cerca de 184 vezes mais! 

Excluindo os contratos da covid, este ano seria um ano “corriqueiro” para a ENERRE: no âmbito da sua habitual actividade, obteve apenas sete contratos públicos (quatro dos quais por ajuste directo), totalizando 177.388 euros. Ou seja, sem pandemia, nunca a Enerre sonharia com milhões.

A ENERRE teve direito a pequenas notícias em Março e Abril, quando alguns jornais (Público, Eco, Sábado, i, Visão, etc.) começaram a divulgar alguns ajustes directos com a autarquia de Cascais. Mas na espuma da pandemia, o caso ficou esquecido, e o negócio continuou a florescer, e muito, em outras paragens. Com efeito, sendo certo que a edilidade de Cascais (e uma sua empresa municipal) lidera o montante de ajustes directos (já vai em 11,55 milhões de euros), outras entidades fizeram entretanto a empresa (que faz t-shirts encolher tanto que parecem top) afzer engordar o mealheiro:  a autarquia de Lisboa “contribuiu” já com 1,57 milhões (em dois ajustes directos); as Forças Armadas com 1,30 milhões (em três ajustes directos) e o Hospital Fernando da Fonseca com 1,42 milhões (em 11 ajustes directos). 

Em valores mais reduzidos (mas em alguns casos de centenas de milhares de euros) estão ajustes directos adjudicados pela SCML, por mais 12 entidades hospitalares, por mais 9 autarquias (Albergaria-a-Velha, Albufeira, Aveiro, Ílhavo, Oliveira do Bairro, Santiago do Cacém, Sever do Vouga, Sines e Sintra) e por diversos institutos públicos, wentres outros. 

Tudo isto está no portal BASE – contratos públicos online. Tudo isto é legal. Tudo com o nosso dinheiro. Tudo isto é imoral. Tudo isto a continuar nos próximos meses. O regabofe vai ainda no adro. E máscaras e fatiotas de protecção são peanuts. Manter tudo isto vai dar muito dinheiro a uma pouca gente. Nada de novo. Já se viu o filme no passado.