sábado, 19 de setembro de 2020

DA LAVANDARIA DO DOUTOR NUNES

O Doutor Baltazar Nunes, actual responsável pela divisão de epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Pública (INSA), que não conheço, será certamente homem grato. Em 25 de Abril, o Público referia que ele apenas recomendava ser preciso "evitar que haja 'uma disrupção do Serviço Nacional de Saúde', mas também defend[ia] que se ganhe alguma imunidade da população". 

Parece ter mudado de opinião a partir do momento em que começou a fazer a modelação da pandemia para a DGS. E assim, esta semana veio lesto mostrar serviço de "modelação", ou de simples lavagem, garantindo que o «INSA afasta que a quebra de cuidados [de saúde pelo SNS] possa ter sido o motivo ou a 'principal causa' para o aumento de mortalidade". 

Para sustentar a sua "tese" diz que "calcular o valor de óbitos num período e subtrai-lo à média dos últimos cinco anos é um indicador mas é um indicador frágil na perspetiva de perceber quais os fatores que estão associados a esse aumento”.

Ora, até aqui tudo bem. A simples estatística descritiva não identifica factores, mas, contudo, tal não significa que seja impeditiva de encontrar evidências. E a evidência, mais que evidente (desculpem o pleonasmo), é a existência de um grande excesso, persistente, e que não se explica nem pelas (supostas) ondas de calor nem pela covid. 

E devendo saber o Doutor Nunes isto, e muitíssimo mais da "cepa" do que eu, não pode, não deveria eticamente poder, minimizar um excesso consistente, persistente e inalterável ao longo de meses a fio, e que ele sabe não estar associado à covid.

Ademais, tem a DGS, através da base de dados do SICO - e portanto o Doutor Nunes, como consultor -, acesso imediato aos certificados de óbito diários, podendo assim muito, muito rapidamente apurar quais foram as verdadeiras causas de mortes no presente ano, e identificar muito, muito rapidamente as causas do excesso de mortes. Num dia de trabalho, garanto, teriam uma conclusão.

Poderia isto fazer a DGS e o Doutor Nunes. Mas a DGS, já se sabia, não está interessada. Quanto ao Doutor Nunes, constato que também, mostrando porém disponibilidade para servir de lavandaria da DGS. 

Enfim, é muito triste quando chegamos à conclusão que, neste desgraçado país, até em questões de Saúde Pública estamos longe de ver independência no pensamento e na acção.

Nota: A notícia do Público de Abril está aqui (em acesso livre): A posição recente está, por exemplo, aqui

DA MÁQUINA DE FAZER TESTES

Se há número da pandemia da covid-19 que me começa a impressionar é o número de testes PCR. Contabilizo os valores do Worldometers (que não tem para todos os países) e chego já à cifra de 596.280.150 testes. Aproxima-se da média de um teste por cada 10 viventes do Planeta. Vamos ser "meigos" na análise e façamos as contas por 40 euros cada teste. Estamos a falar de um negócio de cerca de 24.000.000.000 euros, isto é, 24 mil milhões de euros, o equivalente a um pouquito mais de 10% do PIB português.

No caso de Portugal, onde se realizaram 2.345.680 testes, se cada um tiver custado ao Estado 40 euros, andamos com a factura a aproximar-se dos 100 milhões de euros...

Parece coisa pouca? Mas enfim, seria dinheiro bem empregue se estivesse a ser útil, porque, na verdade, outra coisa que me surpreende é andar-se sistematicamente, e cada vez mais, à caça de "casos positivos", massificando a testagem mesmo em assintomáticos ou fora dos grupos vulneráveis (idosos e pessoas vulneráveis). 

Com efeito, estive a analisar os dados com algum detalhe e constatei que Portugal é, de entre os países do Mundo com mais de 10 milhões de habitantes, o 6º que mais testa, sendo apenas ultrapassado pela Austrália, Rússia, Estados Unidos, Reino Unido e Bélgica.

Sendo a média a nível mundial de 5,3% de casos positivos contra 94,7% de casos negativos, os Estados Unidos são, neste grupo do top 6, os únicos que estão acima deta fasquia. Portugal está com um índice de 29 casos positivos por cada 1.000 testes (2,9%), enquanto o prémio do "apanha lá um positivo" vai para a Austrália que tem de fazer, em média, 250 testes para encontrar um caso positivo (0,4%)

Bem sei que os testes, tal como qualquer exame, tem um papel crucial para o diagníostico e a definição de uma estrategia adequada de prevenção e combate a uma doença. Porém, nesta pandemia, em que tudo parece já funcionar sem uma base de racionalidade, não há um critério assente na lógica, e está a cair-se rapidamente em exageros, testando apenas já com o fito do negócio e para alimentar o pânico. 

E temo ainda mais que, quando estiver disponível a vacina, se ande a vacinar grupos etários (como, por exemplo, os jovens) não por necessidade de os proteger, mas apenas para facturar.



DOS TESTES E DO CONTROLO DE QUALIDADE

Não sou muito apologista das teorias da conspiração, mas gostava de saber se existe um sistema de inspecção pela DGS (ou de uma entidade reguladora) ao funcionamento dos Laboratórios Referenciados (existe uma longa lista) que realizam os testes PCR para detectar o SARS-Cov-2.

Sei apenas que até ao início de Junho (três meses do início da pandemia, sabendo-se que os picos de casos positivos e de mortalidade foram atingidos em Abril) se tinham realizado menos de 900 mil teses PCR, o que dá uma média de cerca de 300 mil por mês. Entretanto, sabe-se que, actualmente, já se realizaram em Portugal quase 2,4 milhões de testes PCR em Portugal, ou seja, nos últimos três e meio realizaram-se 1,5 milhões de testes, o que dá mais de 400 mil testes por mês, e que "apanharam" o período de Verão que teve poucos casos positivos e ainda menos mortes. Prevejo que se vá intensificar os testes, e sei mesmo que há já contratos para testes em lares cada vez mais frequentes.

Neste momento, não haja dúvidas sobre a existência de uma "indústria de testes", que não nos sairá barato. Haver mais casos positivos, e aumentar o pânico, alimentará a procura desejada por essa nova "indústria". Haver menos casos, significa menos procura. E os laboratórios não são ingénuos. E não sejamos nós também ingénuos. Os milhões (sim, são mesmo milhões de euros) usados para se pagarem testes são desviados de outras necessidades, prementes, de Saúde Pública. Não nos saem de borla, mas serão úteis apenas na medida em que forem rigorosos.

Nessa medida, será legítimo saber como tem sido feito o controlo de qualidade dos testes PCR feitos em laboratórios privados, que sabem de antemão que quanto mais casos positivos houver, mais solicitações lhe serão feitas. E saber quais os protocolos de comunicação e de garantia no rigor nos números, quer em relação ao número de testes efectivamente realizados, quer ao nível do controlo à posteriori dos resultados obtidos.

Isto não é estar a desconfiar dos laboratórios. É sim defender o óbvio dever de o Estado garantir rigor e credibilidade. E defender os interesses dos cidadão, ainda mais numa matéria sensível como é a Saúde Pública.



17 DE SETEMBRO - DO BOLETIM DA DESGRAÇA /

No dia 17 de Setembro de 2020 houve 6 mortes por covid. A mortalidade total neste dia (303) foi anormalmente elevada para esta época do ano, registando-se um excesso de 60 óbitos. 

Principais dados a reter: 

a) 6 óbitos em excesso são devido à covid;

b) 54 óbitos em excesso não associados à covid;

c) o grupo dos maiores de 85 anos apresenta um excesso de 21 óbitos;

d) o grupo dos 75-84 anos apresenta um excesso de 25 óbitos;

e) o grupo dos 65-74 anos apresenta um excesso de 14 óbitos;

f) por dedução, o grupo de menores de 65 anos registou uma mortalidade igual à média.




sexta-feira, 18 de setembro de 2020

DO BOLETIM DA DESGRAÇA (16 de Setembro) OU DO QUE NÃO SE REVELA NOS NÚMEROS DA COVID

Porque o Governo e a imprensa nos vai inundar com números da covid, auxiliada por uma zelosa Propaganda Mediática (leia-se,imprensa), vou começar a apresentar, espero que diariamente, um boletim próprio que apresentará os dados mais relevantes da mortalidade total referente sempre ao dia N-2 (ou seja, anteontem em relação ao dia em que se publica, para haver maior estabilidade dos números de óbitos totais no SICO-eVM). 

Destacarei apenas, em dois gráficos distintos:

1) mortalidade total do dia em causa, a média de 2009-2019, o número de óbitos registados por covid e o excesso de mortalidade não-covid.

2) mortalidade média e excesso de mortalidade, em função da média (2009-2019) para os grupos etários menos jovens (65-74 anos; 75-84 anos e maiores de 85 anos).

A análise estatística é simples e tem como mero objectivo alertar, de uma forma rápida, sempre que ocorrem excesso de mortalidade não explicada pela covid. Julgo ser necessário tendo em conta a urgência de repor o SNS em condições normais. O excesso de mortalidade não-covid é, neste momento, é a nossa pandemia principal.

Em todo o caso, quando publicar estes boletins diários não farei, em princípio, grandes comentários. Cada um que retire as suas conclusões.




quinta-feira, 17 de setembro de 2020

DO REGRESSO DO PÂNICO

10 mortos por covid num só dia. Pânico, não é? Sim, mas ninguém se incomoda por num dia de Setembro (mês geralmente pouco mortífero) terem morrido 332 pessoas? Ninguém se incomoda por se registar 66 óbitos em excesso (acima da média), que não é explicado pelo SARS-CoV-2? Ou será que, afinal,66 é um número inferior a 10?



DAS CORES E DO MEDO

Para aumentar o pânico está já a imprensa a anunciar a TWIN PANDEMIC, o encontro do vírus influenza com o SARS-CoV-2. 

Estou aqui a imaginar uma conversa de bar entre os dois virus. Primeiro, discutem a razão para um ser retratado pelos humanos como azul, cor mais pacífica, e o outro com um tenebroso encarnado, cor de sangue, quando na verdade nem um nem outro têm cor porque não interagem com o espectro visível. 

Depois, seguem para a magna decisão sobre a quantidade de mortais que cada um vai ceifar, e muito ordeiramente determinam uma estratégia em que nenhum deles vai matar alguém que o outro já matou. 

Chegam, porém, à lamentável conclusão que, assim, não matarão muito mais do que um só deles mataria, mas ficam satisfeitos porque mesmo assim matarão muito mais que o habitual. É que muitas mortes serão por pânico.

Nota: Convém referir que, habitualmente, numa época gripal se misturam já diversos vírus que causam gripe. Nunca há só um.




quarta-feira, 16 de setembro de 2020

DA SUÉCIA, AQUELE MALDITO PAÍS DO MATA-VELHOS (E PORTUGAL, NÃO É, CLARO QUE NÃO!)

Durante meses, a nossa (e não só) imprensa fustigou a estratégia da Suécia, e os "covideiros" devem ter torcido para que a coisa ainda desse mais para o torto.

Efectivamente, a mortalidade em 2020 na Suécia continua, globalmente acima da média (cerca de 5,7% até Setembro), e a situação é pior do que a dos seus vizinhos escandinavos. Ainda há dias vi as estatísticas da Noruega que indicavam que 2020 estava com mortalidade total abaixo da média, fruto das medidas draconianas que seguiram. 

Porém, durante o pico da pandemia, e quando em Maio a Suécia ainda apresentava muitas mortes por covid, crucificava-se a sua estratégia, considerando-a desumana: o Governo e as autoridades de saúde da Suécia andavam, dizia-se por cá, a deixar morrer os velhos.

Enquanto isso, Portugal auto-elogiava-se. Governo e o impagável Presidente da República garantiam-nos que estávamos perante um "milagre", invejado por todos.

Tretas! Tretas, mil. Mil vezes tretas.

Eu bem sei que isto começa a tornar-se cansativo, talvez para vós que me acompanham, mas não resisto a vos colocar aqui um pequeno gráfico que mostra a evolução da mortalidade acumulada para os maiores de 65 anos desde Janeiro até 7 de Setembro de 2020 para Portugal e para a Suécia, sendo que os dados estão padronizados em função da população desta faixa etária.

E, como podem observar, nunca - repito, NUNCA - em qualquer altura do ano a Suécia esteve com uma taxa de mortalidade acumulada no grupo dos mais idosos acima da de Portugal. Nunca! 

Primeiro, porque a gripe foi lá menos letal até Fevereiro (deixou-se morrer velho de gripe em Portugal, será?!!).

Segundo, porque, embora tenha havido muita mortandade da covid na Suécia até Maio, muita gente se esquece que em Portugal começou desde cedo a registar-se um excesso de mortalidade não-covid em Portugal.

Terceiro, a partir sobretudo de Julho, a situação na Suécia normalizou (a mortalidade tem estado abaixo da média), enquanto em Portugal temos assistido a um Verão de completo mortícinio da população que nada tem a ver com a covid. Vejam, aliás, a divergência nas curvas da mortalidade acumulada que abaixo vos apresento.

Portanto, se a Suécia é um país de mata-velhos; que será então Poortugal?

Nota: Os dados de Portugal são obtidos, como habitualmente, no SICO-eVM. Os dados da Suécia podem ser consultados aqui: https://www.scb.se/en/finding-statistics/statistics-by-subject-area/population/population-composition/population-statistics/?fbclid=IwAR3Ash_sTy5oagP-7ES8lghWjgR92ZEDrsFpwuqtHUZgEe5y9mDLSwjHeEM#_Statisticalnews . 



DO DAR DOZE VIVAS AO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE

Morreram 54 pessoas por covid na primeira quinzena de Setembro, o que significa 3,6 óbitos por dia. Entretanto, como não só se morre de covid (ao contrário do muitos devem pensar), na primeira quinzena morreram, por dia, uma média de 309 pessoas. Destes, contas feitas, e arredondando, cerca de 305 morreram livres de covid, ou seja, "cheios de saúde", porquanto livres do mal que aflige obcecadamente o país, a DGS e o Governo. No período 2009-2019, a média diária na primeira quinzena de Setembro foi de 257 (Setembro é o mês menos mortífero do ano)....

Digam-me lá então qual a parte do gráfico que não entendem. Ainda acham que o SNS está bem? E que a DGS e o Governo estão a fazer tudo para que fique "tudo bem"?



DA INSANIDADE SOBRE A SEGUNDA VAGA (UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DA PANDEMIA NA UNIÃO EUROPEIA)

Para este exercício, posso dizer-vos que demorei menos de duas horas a recolher os dados dos óbitos covid-19 por mês para cada país da UE-27, a fazer os cálculos para determinar a média diária por milhão de habitantes, e a fazer os gráficos. Humildemente, acho que isto é mais útil do que andar (como fez o Público) a "desvendar" no Google Maps os cafés que estão a menos de 300 metros das escolas. 

Porventura, a tabela e o gráfico não precisarão muito de interpretações, pela evidências, mas sempre vos digo cinco "coisas": 

1) achar que já estamos numa segunda vaga é acreditar, por exemplo, que 19,2 = 0,2 [vejam o caso da Bélgica, por exemplo, em Abril e Setembro];

2) achar que já estamos numa segunda vaga é acreditar que 2.550 = 185 [sendo que o primeiro valor se refere à média dos óbitos (valor absoluto) por dia em Abril e o segundo refere-se à média dos óbitos diários (valor absoluto) na primeira quinzena de Setembro];

3) achar que estamos numa segunda vaga é acreditar que os valores das manchas destacadas a vermelho, laranja e amarelo (Abril) são semelhantes aos valores de Setembro (vd. quadro);

4) achar que estamos numa segunda vaga é acreditar que as barras do gráfico em Abril ocupam a mesma área das barras dos meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro;

5) achar que estamos numa segunda vaga é, enfim, estar à beira da insanidade, embora sem sanção, porque o mundo anda louco.




terça-feira, 15 de setembro de 2020

DAS CONSEQUÊNCIAS DO MEDO E DAS MÁS ESTRATÉGIAS

Decidi fazer um simples exercício: comparar a mortalidade total dos últimos 365 dias (14 de Setembro de 2019 a 13 de Setembro de 2020) com um período homólogo que tivesse tido um surto gripal relevante e também uma onda de calor no Verão. Escolhi assim o períod homólogo de 2016-2017.

Vejam como foi o surto gripal de 2016-2017 e comparem-no com o surto gripal de 2019-2020 e com o pico da covid de 2020. Mas depois comparem sobretudo os dois Verões.

Na verdade, apesar daquele terrífico pico da gripe de 2016-2017 (sobre o qual nem um ai se ouviu da DGS e do então Governo, já então liderado por António Costa), a mortalidade no período em análise (365 dias) acabou por ser inferior ao de 2019-2020.

Com efeito, para o mesmo número de dias registaram-se 111.150 óbitos em 2016-2017, enquanto em 2019-2020 foram 117.152. Ou seja, mais 6.002 óbitos para 2019-2020 (e ninguém diria, vendo aquele pico de gripe em 2016-2017). Grande parte desta diferença surge a partir de Julho. A diferença de mortalidade entre 1 de Julho e 13 de Setembro nos dois períodos em análise é de 4.066 óbitos.

Ou seja, este Verão, quase sem mortes por covid, está a ser devastador, donde continuo a insistir que a gestão da covid está a ser catastrófica, não por causa da gestão da covid propriamente dita, mas sim pela forma como se está continuadamente a descurar os serviços de saúde. Não estamos a morrer pelas balas do inimgo (leia-se, covid), mas de fome e sede (leia-se, falta de serviços de saúde para as outras afecções e doenças)

Nota: Análise feita com base nos dados do SICO-eVM. O período em análise para ambos os anos teve em consideração o ano bissexto de 2020, pelo que houve um acerto no calendário para 2016-2017, de modo a se compararem 365 dias.



DA REALIDADE, DA COVID, DA OUTRA PANDEMIA E DA NECESSIDADE DE SE ABRIR A PESTANA

Se considerarmos a taxa de mortalidade nos maiores de 85 anos (óbitos no grupo etário pela população no grupo etário), em 10 de Abril de 2020, no auge da pandemia, a taxa de mortalidade acumulada era de 5,0 óbitos por 100 habitantes, e estava muito abaixo da média (para o período 2014-2019). Aliás, estava abaixo mesmo do limite inferior do intervalo de confiança (a 95%), o que significava que, em proporção (note-se), estava a morrer muito menos pessoas deste grupo etário do que seria suposto, muito em parte pela gripe de Inverno não ter sido muito agressiva.

Entretanto, apesar de nos últimos meses a covid estar a matar muito menos, houve um agravamento na mortalidade nos mais idosos. E em 10 de Setembro a mortalidade acumulada estava já nos 11,37 óbitos por 100 habitantes, já um pouco acima da média. Para esta inversão contribuiu sobretudo o mês de Julho (que foi uma hecatombe para os idosos, muitíssimo pior do que a covid) e também os primeiros dias de Setembro.

Pergunta: a culpa desta inversão foi da covid? Ou antes foi de um sistema de saúde obcecado com a covid-19 mas que passou a borrifar-se olimpicamente no tratamento de todas as outras afecções? Ainda acreditam que está tudo bem com o SNS, e que a DGS e Ministério da Saúde andam a fazer um bom trabalho?

Nota: A taxa de mortalidade foi calculada em função da mortalidade em cada ano (para os períodos de referência, o dia 10 de cada mês) e da população estimada, segundo o INE. Isto significa que a taxa de mortalidade pode ser menor num determinado ano, mesmo havendo mais óbitos, se o grupo etário tiver entretanto aumentado. Num ano normal, no final de Dezembro, a taxa de mortalidades nos maiores de 85 anos ronda os 15 por 100 pessoas.







segunda-feira, 14 de setembro de 2020

DA ADIVINHA

Duas em cada três vítimas da covid em Portugal morreram nos meses de Abril e Maio. Pois bem, quem olhar para este quadro, que preparei (através do SICO-eVM) com os 20 dias mais mortíferos (óbitos por todas as causas) no total e por grupo etário, consegue adivinhar quais foram os piores meses em 2020? 

Foi Abril? Nã! Maio? Ainda menos! Vejam, vejam, é fácil de ver. Será que afinal se morreu mais nos meses em que a pandemia não existia ainda ou nos meses em que quase não matou? Vejam! Vejam por vós! As máscaras, que até o Marques Mendes quer que usemos na rua, ainda não nos tapam os olhos, mesmo se o medo irracional anda por aí a tapar muitos cérebros. 

Nota. As cores não têm nenhum significado qualitativo ou quantitativo; apenas servem para destacar (e agrupar) meses. 



domingo, 13 de setembro de 2020

DO HORROR DA IGNORÂNCIA

A Índia é agora apontada como o país que prova e justifica a manutenção (ou aumento) do pânico em redor da pandemia da COVID-19. Impressionam os números absolutos: só ontem houve 86.194 casos positivos e 1.076 mortes por covid; no total já se contabilizam 79.690 mortes por esta doença, que é quase tanto quantas as pessoas que morreram este ano em Portugal por TODAS as causas até finais de Agosto. Horroroso, não é? Não tanto.

A Índia tem cerca de 1,383 mil milhões de habitantes. Ou seja, 138 vezes mais população que Portugal, donde afinal os casos da Índia são equivalentes, à escala portuguesa, a 576 mortes no total (nós temos quase 1.900) e ontem morreu o equivalente a oito portugueses (em Portugal morreram 7), e os casos positivos de ontem são equivalentes a 623 casos (ontem tivemos 673).

Mas a Matemática tem sido a principal vítima da pandemia.



sábado, 12 de setembro de 2020

DA ANÁLISE ESSENCIAL PARA BEM COMPREENDER OS (FRACOS) EFEITOS DA COVID E OS (ELEVADOS) CUSTOS DA OBESSÃO PELA PANDEMIA NOS MAIS IDOSOS

Nas últimas semanas, também por razões profissionais, tenho olhado com mais detalhe para o efectivo impacte da covid, tendo em consideração o envelhecimento da população portuguesa, sobretudo após ter constatado que o grupo dos mais idosos (acima dos 85 anos) estava a crescer a um ritmo mais galopante do que pensava. Segundo as estimativas do INE, em 2013 viveriam 248.811 pessoas neste grupo etário, e em 2019 já eram 316.442. Um espantoso crescimento de 27% em apenas seis anos. 

Este crescimento tem um lado positivo - vive-se mais! -, mas um lado negativo: neste grupo é expectável que se morra  assim mais, muito mais, em cada ano, mesmo que não haja situações "anormais". É a simples, e lamentável, "lei da vida". Para se ter uma ideia, por norma, a taxa de mortalidade dos maiores de 85 anos é de 15% por ano (ou seja, morrem 15 pessoas em cada 100 em apenas um ano), cerca de três vezes superior à do grupo dos 80-84 anos (5,7%), quase cinco vezes superior à do grupo dos 75-79 anos (3,1) e aproximadamente oito vezes superior à do grupo dos 70-74 anos (1,8%).

Posto isto, quando olhamos para o impacte de uma epidemia (ou mesmo de surtos, como a gripe), na verdade, para sermos mais rigorosos, devemos olhar sempre para os números absolutos (porque cada número representa efectivamente uma vida), mas convém também saber o verdadeiro impacte através de uma taxa de mortalidade (ou seja, uma taxa relativa que considere as mortes absolutas em função da população desse grupo etário), se for possível aceder a esses dados.

Ora, embora não vos possa revelar todas as análises, e abrangendo outras faixas etárias (até por não ser este o espaço mais adequado), mostro-vos um simples gráfico que, apesar da aparente confusão de linhas, é extremamente elucidativo do (fraco) impacte da covid no grupo dos mais idosos. O gráfico revela, para cada ano com informação (2014-2020) a taxa de mortalidade diária (óbitos por 100 mil habitantes), tendo em conta as mortes no ano correspondente em função da respectiva população dos maiores de 85 anos.

Colocando a mortalidade neste perspectiva, chamo a atenção para quatro aspectos, alguns retirados deste gráfico, outros das análises que entretanto realizei, relacionados com o grupo dos maiores de 85 anos:

1) até Março, a taxa de mortalidade em 2020 era muitíssimo mais baixa do que na generalidade dos anos anteriores. Em final de Fevereiro, a taxa de mortalidade em 2020 era mesmo a mais baixa desde 2014. 

2) a covid, que teve o seu pico de mortalidade em Abril, implicou que em 2020 a taxa de mortalidade neste mês (e também em Maio)  foi a maior desde 2014, mas não de forma muito significativa,. Aliás, a taxa de mortalidade teve um pico nos 55 óbitos por 100.000 habitantes, que compara com picos que rondam os 80 óbitos por 100.000 habitantes nos surtos gripais de 2015 e 2017.

3) Embora já se observasse um excedente de mortalidade (em relação à média) não associada à covid, tanto em Março como em Abril, a taxa de mortalidade acumulada no dia 10 de Maio de 2020 (referência na minha análise para efeitos de comparação com os anos anteriores) era apenas a 5ª maior (em sete anos), em parte pela gripe em Janeiro e Fevereiro ter sido pouco mortífera. O ano de 2020 estava então, naquele dia, atrás dos anos de 2015, 2018, 2017 e 2019.

4) Porém, e esta é uma situação preocupante, os meses de Verão - que coincidiram com um abrandamente muito significativo das mortes por covid - foram trágicos para os idosos. No grupo dos maiores de 85 anos, o mês de Julho de 2020 foi de longe o pior, o de Agosto foi o terceiro pior e os primeiros 10 dias de Setembro foram também os mais mortíferos em termos relativos. Assim, a taxa de mortalidade acumulada em 10 de Setembro deste ano era já a terceira desde 2014, estando já apenas atrás de 2015 e 2018. Ou seja, este indicador (taxa de mortalidade acumulada) piorou exactamente nos períodos de menor abrandamento da pandemia.

Conclusão: Na minha opinião, esta análise mostra, por um lado, que o impacte da covid, mesmo sendo doença muito perigosa para os mais idosos, não atingiu proporções catastróficas mesmo no período Março-Maio no grupo etário mais vulnerável, tendo mesmo ficado aquém do impacte habitual das gripes (em 2015 e 2017 foram muitíssimo agressivas, pelo que não estou a minimizar nada). No cômputo geral, o impacte da covid no grupo etário mais vulnerável, vista na perspectiva da taxa de mortaldiade, foi episódico e somente com algum relevo por, em parte, a gripe em Janeiro e Fevereiro ter sido menos agressiva do que o habitual. Mais preocupante parece-me a mortalidade que se observou durante o Verão de 2020 que, de forma persistente, tem causado um número anormal de mortes de idosos. Esta situação, que se deverá em grande medida à inusitada concentração de meios do SNS na pandemia, em detrimento das funções habituais (e imprescindíveis), tem contribuído para um aumento da taxa de mortalidade acumulada em 2020, já bem acima da média, embora, saliente-se, não seja este o pior ano (repita-se, se olhado na perspectiva da taxa de mortalidade).